O Conselho de Ética da Câmara Municipal de Curitiba aprovou na noite de terça-feira (10) o parecer que recomenda a cassação do mandato do vereador Renato Freitas (PT), acusado de ter invadido uma igreja durante um protesto contra o racismo em fevereiro deste ano. O caso será analisado pelo plenário, onde há maioria pela cassação entre os 38 vereadores. Antes, a defesa do parlamentar tem cinco dias úteis para recorrer da decisão à CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) da Casa, e se o colegiado mantiver o parecer a Câmara tem prazo de três sessões para marcar a votação em plenário.

Imagem ilustrativa da imagem Parecer que recomenda cassação de vereador é "mentiroso", diz defesa
| Foto: Rodrigo Fonseca/CMC

Freitas, que é negro, participava de um protesto contra o racismo no dia de 7 fevereiro, no Centro Histórico de Curitiba, e entrou com um grupo de manifestantes na Igreja de Nossa Senhora do Rosário dos Pretos, construída no século 18 por negros escravizados. Eles fizeram alguns discursos e se retiraram. A ação foi filmada e compartilhada nas redes sociais. Em março, a Arquidiocese de Curitiba se manifestou contrariamente à cassação.

Na sessão de terça-feira, cinco vereadores votaram pela cassação: Denian Couto (Podemos), Indiara Barbosa (Novo), Noemia Rocha (MDB), Toninho da Farmácia (União) e Sidnei Toaldo (Patriota), relator do parecer. A vereadora Maria Leticia (PV) pediu o arquivamento e o presidente da Comissão, Dalton Borba (PDT), votou pela suspensão do mandato.

DEFESA

O advogado de Renato Freitas, Guilherme Gonçalves, disse que vai recorrer à Justiça contra a possível cassação. "O relatório é faticamente equivocado, para não dizer uma palavra mais dura, mentiroso. Os vídeos falam por si", afirmou. Ele destaca que Freitas não estava entre os primeiros manifestantes a entrarem na igreja, que o protesto não foi convocado pelo vereador e que ele não ofendeu ninguém, diferentemente do que afirmou Toaldo.

Para Gonçalves, o processo foi movido por motivos políticos, já que os manifestantes teriam gritado palavras de ordem contra o presidente Jair Bolsonaro (PL). "Quando igrejas evangélicas fazem atos para apoiar o presidente Bolsonaro isso não é ilícito? Aí o público com outra concepção política gritar 'fora Bolsonaro' em uma igreja passa a ser considerado motivação para sustentar uma cassação?", questionou.

Presidente do Conselho de Ética, Dalton Borba classificou o processo como persecutório. Ele lembrou que a Câmara absolveu as ex-vereadoras Kátia dos Animais e Fabiane Rosa, posteriormente condenadas na Justiça por peculato. “E agora quer condenar alguém que vai na igreja pedir misericórdia? Em um discurso de intolerância, promoveram nesta Casa cinco representações pedindo cassação. Houve um discurso de ódio, aproveitaram uma manifestação para tentar extirpar quem conquistou o poder pelo voto popular”.

Pressão

A vereadora Noemia Rocha, que é ligada a igrejas evangélicas, admitiu ter sido pressionada a votar pela cassação de Freitas. No mês passado, o vereador Márcio Barros (PSD) teve um áudio vazado em que dizia que era preciso pressionar a parlamentar. Barros pediu desligamento da Comissão de Ética após a divulgação dos áudios.

No fim de semana, Noemia Rocha foi pressionada pelos pastores Silas Malafaia e Marco Feliciano (que é deputado federal pelo PL) em entrevista ao blogueiro bolsonarista Osvaldo Eustáquio (que chegou a ser preso por ordem do Supremo Tribunal Federal). Malafaia disse que ficaria "antenado" na votação e Feliciano afirmou que Freitas deve ser cassado, apesar de "os donos" da Igreja Católica, segundo ele, terem "voltado atrás" na denúncia.

Eustáquio pediu para seus seguidores divulgarem o número do celular de Noemia Rocha e incentivou as pessoas a pressionarem a parlamentar no fim de semana. Ele esteve na sessão de terça-feira. Em uma cadeira de rodas, se posicionou na frente da vereadora, o que motivou o advogado Guilherme Gonçalves a pedir que ele fosse retirado. Eustáquio reagiu, falou sem autorização e foi retirado da sessão.

Renato Freitas foi eleito para seu primeiro mandato como vereador em 2020, com 5.097 votos. Ele tem 37 anos, é advogado e professor universitário. Em junho de 2021, foi preso por policiais militares quando jogava basquete em uma praça de Curitiba. No mês seguinte, foi preso pela Guarda Municipal, em outra praça, depois de ser provocado por apoiadores de Jair Bolsonaro durante um ato. Sua suplente é Ana Júlia, também do PT, que recebeu 4.538 votos na eleição de 2020.

Câmara de Curitiba não cassou mandatos de ex-vereadoras condenadas por peculato

Perto de ter o mandato cassado, o vereador Renato Freitas (PT) acusou a Câmara Municipal de Curitiba de ter perdido o decoro ao longo de sua história. Ele lembrou os casos das ex-vereadoras Kátia Dittrich e Fabiane Rosa, poupadas no Conselho de Ética e posteriormente condenadas pela prática de peculato, e a denúncia contra o ex-vereador Professor Galdino, acusado de assediar sexualmente outra vereadora. Ele também teve o mandato poupado. Eles sempre negaram as denúncias.

"A Câmara de Curitiba em sua história foi perdendo o decoro, foi perdendo a vergonha", afirmou o vereador após a votação do Conselho de Ética, na noite de terça-feira. "Uma Câmara que já conviveu com rachadinha, com peculato, com desvio de verba pública, com funcionário fantasma, com acusações de racismo e de assédio sexual".

Eleitas em 2016 com propostas de defesa dos animais, Kátia Dittrich e Fabiane Rosa foram condenadas (a 5 anos e 6 meses e a 41 anos de prisão, respectivamente) por exigirem parte dos salários de seus assessores. Kátia teve seu julgamento no Conselho de Ética suspenso após apresentar um atestado médico. O caso foi arquivado. O arquivo também foi o destino da representação movida contra Fabiane Rosa. Ambas integravam a base de apoio ao prefeito Rafael Greca (PSD).

O caso de suposto assédio sexual envolve o ex-vererador Professor Galdino, que em 2016 teria passado a mão nos seios de outra parlamentar, Carla Pimentel. A própria vereadora fez a denúncia à Mesa Diretora, mas o Conselho de Ética entendeu que não havia provas da intenção de Galdino e aplicou a pena de suspensão do mandato.

O processo que pode levar à cassação do mandato de Renato Freitas é o segundo respondido pelo petista no Conselho de Ética. No ano passado, ele chamou de "trambiqueiros" os vereadores que defendiam o uso do chamado kit-covid. "Essa bancada conservadora dos pastores trambiqueiros não está nem aí para vida, só pensam no seu curral eleitoral bolsonarista“, escreveu o vereador nos comentários de uma transmissão da Câmara. O processo foi arquivado.

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