2022! Grave este número! Sei que o estimado leitor patriota não olvidará que o país é independente há exatos duzentos anos! Isso, não é pouca coisa! No Ipiranga de 1822 um grito teria dado início ao controle das rédeas da nação, que já nasceu império! Afastados os portugueses, o Brasil garantiria que as suas riquezas somente a ele pertencessem e que o seu destino seria verde e amarelo. O verde das florestas como um dos seus principais patrimônios e a miscigenação como talvez o seu maior portfólio! Dois séculos se passaram e no próximo ano haverá sobejamente motivos para a legítima comemoração.

Acreditem os mesmos leitores, 2022 será, outrossim, uma data a ser colocada nas nobres galerias, por motivos semelhantes ao famoso acontecimento de 1822. Passados trinta e quatro anos da redemocratização, o maior período da história brasileira neste regime, os livres e cônscios cidadãos irão às urnas para reafirmar peremptoriamente, em forma de grito emoldurado em teclas digitais, as suas convicções. Os acontecimentos recentes, nos apontam que 2022 não se revestirá da normalidade dos últimos anos e décadas deste jovem país tropical. Há um tremendo e profundo simbolismo escondido nesse número, mesmo que passemos ao largo da numerologia!

A eleição do atual presidente da República se deu num contexto de total estabilidade democrática e funcionamento das instituições num pleno Estado de Direito. Malgrado critiquemos, com razão, a ineficiência do Estado e seus flancos perversos, geradores de uma desigualdade galopante, que mata diariamente seus filhos mais vulneráveis, não podemos, contudo, deixar de reconhecer que duzentos anos depois, o Brasil se sentava (até ontem) ao lado dos grandes estados modernos; por infelicidade, a fumaça dos tanques militares em frente ao Planalto, gerando charges internacionais depreciativas, tende a nos desalojar dos salões onde a civilização dança a valsa da estabilidade democrática.

Bolsonaro galgou o poder em todos os seus mandatos, no atual regime, que embora Churchill o tenha considerado limitado, é de longe o melhor que temos! No entanto, desgraçadamente, o mandatário do Planalto tem usado e abusado de todas as prerrogativas que a Constituição lhe proporciona e, em não poucos casos, saído de suas “quatro linhas”para implodir a democracia e golpear de morte o sistema que lhe proporcionou 27 anos de mordomias tupiniquins.

O Brasil que caminha inexoravelmente para 2022 surpreendeu até os mais confiantes na solidez de suas instituições e revelou o quanto as democracias são frágeis ao não possuírem dispositivos eficazes de proteção. Nisso, não estamos sozinhos! Turquia, Rússia, Hungria, Polônia e, por incrível, até os EUA mostram que o jogo democrático de equilíbrio de poderes e sólidas balizas não é perfeito nem inexpugnável.

Não é por acaso que Biden acaba de convocar uma cúpula sobre a democracia, em dezembro. Mas não só. O povo na democracia não é um mero detalhe! A própria raiz grega já o diz! É o “seu” poder! Se, porém, na Grécia antiga já existia a mentira, a perversidade da calúnia ou os boatos nefastos para a estabilidade e consolidação da governabilidade representativa, estavam longínquos do atual poder da mídia social associada aos mecanismos da inteligência artificial e da robótica! A democracia não é invicta e é, sim, vulnerável! Quando perguntaram ao construtor do Titanic (a bordo, no desastre) se o navio afundaria, não titubeou: “afunda sim. Ele é de ferro”! O naufrágio da democracia alemã nos anos trinta constitui-se num alerta perene para os países atrás mencionados.

2022 será uma data tão ou mais importante do que 2020 para a América. Lá como aqui, um presidente conspirava contra o país e a sua história. Foi desalojado por estreita margem e saiu da Casa Branca vomitando mentiras e desconfianças no sistema. Será um longo e tenso inverno até que a democracia se consolide de novo, no berço da sua edição moderna! No Brasil, as eleições de 2022 mostrarão ou não se o país tem imunidade suficiente para resistir ao canto da sereia. Leia-se, ao golpe como opção! Os números até agora são preocupantes. Cerca de 30% dos sondados, concordariam com o fechamento do Legislativo e do Judiciário! 2022 não será um ano qualquer!

Padre Manuel Joaquim R. dos Santos

Arquidiocese de Londrina