O combate à pandemia do novo coronavírus deveria ser coordenado entre municípios conurbados, mas isso ainda não ocorre. Os decretos coincidentes acontecem apenas por decisões isoladas de cada chefe do executivo, o que preocupa, já que algumas ações de restrição de funcionamento podem gerar a migração dos clientes para outros municípios da região que não adotaram as mesmas práticas.

O combate à pandemia do novo coronavírus deveria ser coordenado entre municípios conurbados.
O combate à pandemia do novo coronavírus deveria ser coordenado entre municípios conurbados. | Foto: Divulgação

Depois de Londrina publicar novo decreto determinando o fechamento de todos os bares da cidade e áreas de lazer como aterro, praças e parques a partir de sexta-feira (11), Cambé e Ibiporã (ambos da Região Metropolitana de Londrina) também decidiram seguir a decisão e decretaram medidas restritivas visando a diminuição das aglomerações para evitar a disseminação do novo coronavírus.

Segundo a assessoria de comunicação da Sesa/PR (Secretaria de Estado de Saúde do Paraná), as recomendações estaduais seguem as mesmas, e os municípios têm autonomia para tomada de decisão. “A Sesa e Governo do Estado analisam a situação da doença diariamente e as ações são discutidas e avaliadas constantemente”, diz o comunicado da Sesa.

O Governo Estadual já chegou a determinar um lockdown anteriormente, que atingiu sete das 22 regionais de saúde do Estado em julho deste ano. Na região, todos os municípios da 17ª Regional de Saúde e da 18ª Regional de Saúde de Cornélio Procópio foram atingidos na época.

Em Cambé o decreto municipal 225/2020 estabelece que o horário de funcionamento do comércio em geral é das 10 às 16 horas. Os bares, restaurantes, conveniências e lanchonetes podem atender até as 22 horas, ou seja, tiveram diminuída uma hora de funcionamento com o novo decreto, mas esse atendimento deve ser sem música ao vivo ou DJs.

Há a proibição de práticas de dança em geral. As festas e confraternizações com mais de dez pessoas também ficam proibidas. A multa para quem desobedecer as medidas é de R$ 8 mil até R$ 16 mil e, em casos de reincidência, pode ocorrer a interdição do local.

O prefeito de Cambé, José do Carmo Garcia, ressaltou que não houve essa coordenação de planejamento entre os municípios conurbados. "Mas se você me perguntar se eu tive um olhar para o que Londrina definiu eu respondo que isso pesou na minha decisão. Se eu deixo a aberto aqui os bares a partir das 22 horas é um estímulo para que o pessoal de Londrina venha para cá também. Eu tenho que me precaver, senão acabo perdendo controle do trabalho que tenho realizado em Cambé", destacou.

Questionado se isso não poderia ensejar um planejamento coordenado entre os municípios, ele disse que acredita nisso. "Seria uma questão muito importante, porém há municípios de nossa região metropolitana que são pequenos. Nos municípios maiores esse planejamento conjunto poderia ser feito", destacou. Mas ele reforçou que a decisão de criar um decreto semelhante ao de Londrina teve mais relação com o número de casos confirmados no município. "Em média temos a confirmação de 35 a 40 casos por dia. Como o número de leitos se tornou exíguo é uma preocupação também. Vimos que tem muita gente contaminada na faixa etária jovem e isso acendeu um sinal de alerta", observou.

A reportagem também perguntou se o horário do comércio poderia seguir o de Londrina. Ele afirmou que em Cambé o horário adotado foi elaborado tendo em mente a questão do transporte coletivo, para ficar diferenciado do horário da indústria. O presidente da Acic (Associação Comercial e Empresarial de Cambé), Pedro Mazei, ressaltou que desde o início sempre foi a favor que houvesse um planejamento macro. “As decisões têm que ser tomadas com planejamento macro, porque a região é conurbada. Facilitaria para todo mundo, pois temos municípios pequenos que não têm estrutura para criar um decreto pensando nesse planejamento para a economia e saúde juntos, porque não dá para trabalhar os dois separadamente. Acabou resultando no que está acontecendo agora, em que as pessoas não sabem para onde correr”, esclareceu.

O Secretário de Saúde de Ibiporã, Paulo Roberto Zapparoli, destacou a importância de se tomar decisões independentes. "Nós acompanhamos uma decisão de Londrina porque assim que a prefeitura de Londrina decidiu pelo fechamento de bares e restaurantes começaram a aparecer nas redes sociais mensagens escritas #boraIbiporã. Essas pessoas podem trazer a doença para nossa cidade. Eu disse ao prefeito que se não tomássemos medidas, teríamos problemas. Eu não posso perder esse controle", explicou.

"São situações diferentes. Em Ibiporã estamos com 11 óbitos. Para mim foi duro, porque são 11 vidas. Hoje estamos com 5% do que tem Londrina. É difícil fazer essa interlocução entre os municípios. Londrina representa 70% do eixo populacional da região e toma decisões independentes. Eu, como Secretário de Saúde, participo do Coesp (Centro de Operações de Emergências em Saúde Pública), mas são realidades diferentes. Acho complicado", avaliou.

Ibiporã decretou que a partir do dia 14 até o dia 23 fica proibida a abertura e funcionamento de bares, lanchonetes e similares; e a venda ou fornecimento de bebidas alcoólicas para consumo no local e em suas imediações por qualquer estabelecimento no município.A multa prevista é de R$ 3 mil; e as penalidades preveem a interdição do estabelecimento; cassação do alvará de localização e funcionamento. O decreto permitiu o funcionamento por meio do sistema de entrega em domicílio ou de retirada no local.

O presidente da Aceibi (Associação Comercial e Empresarial de Ibiporã), Marcelo Juliano Machado, ressaltou que é fundamental ter análise separada, mesmo estando na mesma regional. “Se Londrina está tendo aumento exponencial e Ibiporã tiver número baixo de casos é importante agir de forma autônoma. No entanto Ibiporã se encontra em patamar semelhante ao de Londrina. A curva está crescendo demais. Hoje de manhã teve reunião na associação comercial com o Secretário de Saúde de Ibiporã e ele falou que no dia dois de agosto tinha pouco mais de 300 casos na cidade e no dia nove de setembro, ou seja um mês e sete dias depois, triplicou esse número”, pontuou.

“É importante cada empresário se conscientizar disso. Está muito complicado. O que prevalece é a vida, e nesse momento a gente sacrifica a atividade por um bem maior”, afirmou. “Mas achei válido por parte da administração pública convidar os empresários e a associação para explicar a situação”, acrescentou.

O presidente da Acil (Associação Comercial e Industrial de Londrina), Fernando Moraes, ressaltou que pelo que está sentindo não houve essa coordenação para tomar a decisão conjunta. Ele afirmou que o alinhamento com os outros prefeitos nessas ações é necessário para que aconteça a mesma coisa.

“Senão a gente sabe que tem municípios muito próximos que podem demandar as pessoas a irem para lá. É o que ocorre nos bares. Mas vale ressaltar que não são todos os bares que descumprem a legislação. Poucos estão estragando o coletivo. Não é o momento de fazer festas e aglomerações. Recentemente publicamos um vídeo em que a gente fala da importância de seguir o protocolo de distanciamento, usar máscaras e fazer higiene das mãos”, apresentou.

“Houve aumento dos casos e a gente está preocupado, porque pode fechar o comércio novamente”, disse. “A região toda está fazendo festas clandestinas. Naquela semana que passou o Brasil inteiro estava tendo aglomerações. Infelizmente isso vai ocorrer nas cidades ao redor e vai cair nos hospitais de Londrina”, afirmou.

Em Londrina a assessoria de comunicação e o Secretário Municipal de Saúde não retornaram até o fechamento da reportagem.