A pouco mais de quatro meses para as eleições de 2020, as urnas eletrônicas voltaram a ser alvos de informações falsas nas redes sociais que, como de costume, tentavam “alertar” a população para uma suposta conspiração internacional que estaria em curso para fraudar as eleições brasileiras. O novo boato passou a circular no final de julho e dizia que a empresa que vai fornecer as urnas eletrônicas ao TSE (Tribunal Superior Eleitoral) para as eleições de 2022, a Positivo Tecnologia, teria sido adquirida pela multinacional Lenovo, sediada na China. Em tom alarmista, o texto chegou a ser compartilhado por mais de duas mil pessoas no Facebook até o dia 28 de julho.

Imagem ilustrativa da imagem Multinacional chinesa comprou fabricante das urnas eletrônicas? FALSO!
| Foto: Roberto Jayme/TSE

Sediada em Curitiba, a Positivo Tecnologia foi a vencedora da licitação lançada pelo TSE no valor de R$ 799 milhões para a compra de 180 mil urnas e negou ter sido adquirida pela Lenovo. Procurada pela FOLHA, a assessoria de comunicação da companhia confirmou que “não existe qualquer negociação neste sentido”, disse em nota. Além da empresa vencedora, participou também o Consórcio SMTT, formado pelas empresas Diebold e Smartmatic, que também já foi alvo de uma campanha de difamação virtual, lembrou o Secretário de Tecnologia da Informação do TRE-PR (Tribunal Regional Eleitoral), Gilmar José Fernandes de Deus. “Há um ‘monte’ de fake news no processo eleitoral todo, mas essa – sobre a Smartmatic - acredito que já é um ponto superado”, alivia-se.

Entretanto, parafraseando o jornalista consultor de mídias sociais Sérgio Lüdtke, para que uma “parede” de mentiras seja erguida, sempre são necessários “tijolos” de verdades. Lüdtke também é editor do projeto Comprova, uma iniciativa pioneira de fack-cheking (checagem de fatos) no Brasil.

No caso da suposta venda da Positivo Tecnologia, a fake news de 2020 descontextualizou informações antigas, prática muito comum por parte de quem cria este tipo de conteúdo. Foram tratativas que nunca se concretizaram, divulgadas em reportagens de 2008 e 2010, que podem ter abastecido a “máquina” de conteúdo falso.

Para o Secretário de Tecnologia do TRE-PR, um ponto positivo é que as falsas narrativas encontram “aceitação” e produzem “ecos” apenas em determinados “nichos” existentes nas redes sociais formados por indivíduos que encaram determinados temas até mesmo como uma “religião”, define. “Por exemplo, fizemos uma live falando sobre segurança do voto, como é a arquitetura de tecnologia das urnas eletrônicas, certificados digitais, assinaturas digitais e você vê pessoas dizendo que as urnas são inseguras. Vira quase uma religião falar mal de alguma coisa por mais que você apresente informações. Estes são radicais”, lamentou.

Para 2022, as urnas eletrônicas que serão fornecidas pela Positivo deverão substituir parte do parque tecnológico do TSE, que atualmente é de 470 mil urnas eletrônicas. O Paraná possui 25 mil unidades, sendo 21 mil nas sessões de votação e quatro mil “reservas”.

Transparência

Enquanto as atuais urnas eletrônicas foram fabricadas entre 2009 e 2015, ou seja, podem apresentar lentidão ao rodarem sistemas mais “pesados”, os modelos que vão ser fabricados pela Positivo Tecnologia prometem entregar maior capacidade de processamento. Com isso, além de evitar que um fenômeno registrado nas últimas eleições, quando eleitores afirmaram terem escolhido o candidato e sua foto ter demorado para aparecer na tela, os novos modelos serão capazes de rodar sistemas com algoritmos de criptografia mais pesados, “o que reforça a segurança do processo”, explicou o servidor.

Entretanto, todo o “ritual” de segurança das eleições brasileiras, público e amplamente conhecido, é validado por agentes externos à Justiça Eleitoral, dentre eles a Polícia Federal, os partidos políticos e a comunidade acadêmica, responsáveis pela primeira “etapa” de verificação. Os especialistas em Tecnologia da Informação são convidados a identificar possíveis falhas a partir da posse dos “códigos abertos”, o “DNA” do sistema utilizado, e podem sugerir melhorias. Neste ano, esta etapa ocorreu em abril.

“O segundo processo vai acontecer perto da eleição. É o processo da lacração dos sistemas feito em Brasília (DF) também. É quando fechamos a versão do sistema que vai para a eleição. São convidados o Ministério Público, Polícia Federal e partidos e cada participante é convidado a trazer seu certificado digital, seu token, assina os códigos-fontes da urna eletrônica e publica o resumo digital – hash - de todos os sistemas”, explicou antes de relembrar que novamente os códigos-fontes ficam disponíveis para a verificação de qualquer cidadão.

A última etapa de segurança é colocada em prática cerca de duas semanas antes das eleições, quando a ocorre a carga, ou instalação dos sistemas, e a lacração das urnas. Com lacres emitidos pela Casa da Moeda e assinados pelos juízes eleitorais das respectivas zonas eleitorais, as urnas são preparadas para serem instaladas nas salas de votação e algumas ainda são sorteadas a serem testadas em uma votação simulada.

“Este procedimento é totalmente filmado por questões de auditoria. Participam membros da OEA (Organização dos Estados Americanos), na última eleição o TSE contratou uma empresa externa para fazer a auditoria do processo”, lembrou.

Todas estas características fazem das eleições brasileiras as mais seguras e avançadas do mundo, avalia. Para combater a desinformação, o Tribunal Regional Eleitoral do Paraná criou sua própria plataforma de checagem de dados relacionadas às eleições, o Gralha Confere.