Desde a ocupação do território brasileiro no ano de 1500 até os dias de hoje, o Brasil já teve 13 estandartes que marcaram períodos diferentes na história da nação. A doutoranda em história política pela UEM, Daniela Reis de Moraes, explica que esta influência vai muito além da história das grandes navegações. Ela diz que para entender a importância das bandeiras temos que entender o fundamento de nação cujo debate é insuflado pela assertiva do historiador inglês Eric Hobsbawm em seu artigo “Etnia e nacionalidade na Europa de hoje”. No conceito de Hobsbawm, a criação de uma nacionalidade passa pela formação de uma identidade, de um carácter nacional. As nações europeias, como exemplo, tiveram um início no final do feudalismo, um período bem recortado da história no qual se fundaram os reinos, organizados sob o domínio de um monarca absolutista. Para se legitimarem, os reis criaram aportes simbólicos, elementos que corroboram para a fixação da narrativa histórica, tais como, os hinos nacionais e as bandeiras. “O que faz um inglês ser inglês e diferente de um francês? O território que os unem pelo espaço físico, a língua vulgar que caracteriza uma comunicação em comum, a construção de uma narrativa histórica e uma memória para um passado coletivo que inclui o apagamento de outras memórias.”

Imagem ilustrativa da imagem O território de 13 bandeiras
| Foto: C.B. Feitosa /FAB

A historiadora chama atenção para um conceito sobre o fundamento da bandeira do historiador e cientista político estadunidense, Benedict Anderson, em sua obra chamada “Comunidades Imaginadas”, para quem a construção de comunidade precisa ser fabricada, imaginada para amalgamar um grupo em torno de uma narrativa comum e a bandeira exerce essa função, ela é o estandarte de uma identidade. “As bandeiras são muito antigas, eram como se identificavam grupos numa guerra. Como se diferenciavam os aliados e os inimigos. Então, partindo desse princípio, a gente entende que as bandeiras foram passando como símbolo de uma identidade, ao longo da história, por tradição.”

TEMPORALIDADE DOS SÍMBOLOS BRASILEIROS

Para Moraes é importante não esquecer que o território que hoje chamamos de Brasil, foi um território ocupado por portugueses e como cita Hobsbawm “o nacionalismo é a prática de uma nação” e nesse período histórico do país se praticava aqui a nação portuguesa. A terra e seus habitantes obedeciam regras e culturas lusitanas. E as bandeiras, estandartes e brasões usados aqui, por centenas de anos, eram os portugueses. “Havia uma extensão identitária de Portugal no Brasil assim como em outras colônias do reino”.

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Os estandartes e bandeiras aqui fincadas

1500 - Usava-se a Cruz da Ordem Militar de Cristo com o escudo real.

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1521 - O estandarte de Dom João III elimina a cruz e mantém o escudo.

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1616 - O escudo ganha outra coroa e mistura símbolos da Espanha com os de Portugal. “Nessa época ocorreu a União Ibérica. Portugal perde seu rei e o parente mais próximo era o rei da Espanha, Felipe II.”

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1640 - Portugal tem sua independência da Espanha e então refaz sua bandeira de restauração.

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1645 - “A bandeira do principado do Brasil tinha uma esfera armilar (um globo vasado) que simbolizava as grandes navegações uma vez que Portugal era uma potência nesse campo. Acima do globo armilar tinha a cruz símbolo de Portugal. A mesma que hoje podemos ver na identificação do time de futebol Vasco da Gama”, explica Moraes.

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1816 - É criado outro brasão para a bandeira do Reino Unido de Portugal, Brasil e Algarves. “A família real tinha vindo ao Brasil em 1808, fugindo de Napolão Bonaparte, e instauraram a coroa aqui. No ano de 1815, Napoleão perde a Batalha de Waterloo e é exilado, vindo a morrer em exílio anos depois. Porém logo após sua derrota, Dom João VI volta à Portugal como Regente, e deixa nobres em território brasileiro. Na ocasião uma corte não podia manter seus nobres em espaços não monárquicos, então, o Brasil é elevado à principado.”

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1821 - O Brasil adota a bandeira do Regime Constitucional de Portugal, com símbolo retangular azul, coroa, a cruz e os símbolos das casas reais.

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IMPÉRIO

É no ano de 1822, após o dia 7 de setembro, com a independência do Brasil do domínio português que temos a primeira bandeira criada para o Brasil. "Nessa época, Dom Pedro I estava aqui e com apoio da elite local, começou a formular a ideia de nação brasileira. Quando se pensa em uma nação independente um dos aparatos simbólicos é a bandeira. A bandeira imperial é um projeto rascunhado por um artista até bem conhecido na historia do Brasil, Jean-Baptiste Debret que chegou ao Brasil nas missões francesas e ficou como contratado do corte. O primeiro desenho da bandeira data de antes da independência do Brasil, segundo Moraes, ele foi encontrado nos arquivos do Dom João VI. O retângulo verde e o losango amarelo representavam respectivamente a casa de Bragança e a casa de Habsburgo. "A forma de losango está ligada às armas das damas e era utilizado como suporte dos brasões femininos, no caso, era a casa de Maria Leopoldina da Áustria, como ela não tinha um brasão foi usado somente a cor amarela.

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Se você prestar atenção dentro do brasão tem um círculo azul e dentro dele tem estrelas, essas estrelas representavam as províncias do Brasil e foi uma ideia importada da bandeira estadunidense. Os dois ramos representam os produtos de maior exportação do Brasil na época, o fumo e o café". Completando o desenho há a cruz simbolo da coroa portuguesa, a esfera armilar das navegações e o brasão da família real. "A gente percebe que a primeira bandeira do Brasil independente apesar de pensada para a nova nação, tinha todos os elementos da memória lusa".Essa bandeira vigorou por 67 anos, até 15 de novembro de 1889, com a proclamação da República. Hoje em dia, alguns grupos defensores da volta da monarquia defendem a volta do seu uso. "As pessoas me perguntam e há essa dúvida porque o Brasil era chamado de império e outros territórios de reinos se também tinha um rei igual aos outros. A diferença é o tamanho da terra. O reino está ligado a um território menor, quando eram territórios muito grandes e diversificados eram chamados de império pela sua dimensão de poder e como o Brasil já tinha essa dimensão continental, Dom Pedro I resolveu nomeá-lo império".

REPÚBLICA

Dia 15 de novembro de 1889, os militares, com o apoio da igreja católica e dos aristocratas, fazem um golpe contra a coroa e depõe o imperador Dom Pedro II e o envia, junto da corte, de volta à Portugal. O grupo de republicanos liderados pelo Marechal Deodoro da Fonseca tinham princípios iluministas que eram contra o absolutismo monárquico e ideologia positivista embasada no filosofia de Auguste Comte, “O amor por principio e a ordem por base, o progresso por fim” .

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A partir dessa frase, no decreto 4 do Brasil República, foi criado o lema “Ordem e Progresso “ que figura até os dias de hoje na bandeira nacional. A primeira bandeira do Brasil República foi a bandeira do Clube Republicano Lopes Trovão. Responsáveis pela articulação do golpe de 1889. “Esse clube tinha uma bandeira que seguia os aspectos positivistas, muito parecidos com os Estados Unidos. Então, eles pegam essa bandeira e hasteiam de forma provisória como símbolo da mudança de regime. Para se ter uma noção da dimensão do ato, o grupo hasteou a bandeira do clube no navio que levou a família real de volta a Portugal, como forma de humilhação.” Nesse momento muitas coisas mudaram na ideologia da nação. Uma das primeiras ações dos republicanos foi tornar o Brasil um estado laico e separa a Igreja do Estado, decretam alguns feriados, como 2 de novembro 1 de janeiro e reconfiguram a bandeira. “Marechal Deodoro da Fonseca disse que era muito parecida com a bandeira dos Estados Unidos e era preciso encontrar uma identidade própria”.

A BANDEIRA ATUAL

A ideia da bandeira foi do Raimundo Teixeira Mendes com a colaboração do Dr. Miguel Lemos e do professor Manuel Pereira Reis, republicanos e catedráticos de astronomia da Escola Politécnica. “Eles resignificaram as cores, o retângulo verde da Casa de Bragança, o losango amarelo da Casa de Habsburgo passaram a ser verde de matas e amarelo de riquezas. O globo armilar foi preenchido de azul que era o céu do Rio de Janeiro, a constelação era o céu do alvorecer do dia da declaração da República, a zona branca simboliza a Linha do Equador e a estrela acima é o Pará. Tem gente que acha que a estrela é o Distrito Federal. Mas a bandeira foi criada em 1889 e Brasília só nos anos 60”.

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CURIOSIDADE

Você já notou que a praça da bandeira em Londrina, só tem um mastro?

Conforme a historiadora, a praça Marechal Floriano Peixoto foi criada na época do Estado Novo quando Getúlio Vargas estabeleceu que Estados e municípios não poderiam ter bandeiras próprias. O ato simbólico ocorreu em 1937, quando Vargas na frente do Palácio do Catete - onde hoje funciona o Museu da República - mandou hastear as bandeiras de todos os estados, cantaram o Hino Nacional, as bandeiras foram retiradas, substituídas em todos os mastros por bandeiras do Brasil e as outras foram queimadas marcando o início da ditadura presidencial de Vargas.

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| Foto: iStock