A perda da visão em outubro de 2022 foi o primeiro indicativo de que algo estava errado com a saúde de Pedro Guilherme de Lima Inácio Gomes, de seis anos. Contudo, com o passar do tempo, os pais da criança, que vivem em Maceió (AL), perceberam outros sintomas, como agitação e dificuldade para andar. Após uma série de consultas, o diagnóstico veio em janeiro deste ano: adrenoleucodistrofia, uma condição genética rara que, durante a infância, afeta as glândulas adrenais e causa leucodistrofia, que é caracterizada como lesões na mielina, a "substância branca" do cérebro humano.

"O neurologista pediu uma ressonância magnética e descobrimos que a doença já tinha avançado", conta Myllenna Rosy, mãe de Pedro Guilherme. O rápido avanço da condição impossibilitou o transplante de medula óssea, que iria permitir a interrupção da progressão da adrenoleucodistrofia.

Devido ao diagnóstico tardio, Pedro Guilherme enfrentou uma série de sintomas e complicações. De acordo com a mãe, a criança, com o passar dos meses, passou a apresentar crises de contração muscular, que lhe causavam muitas dores. "O Pedro também teve uma parada respiratória e enfrentou uma pneumonia. Depois de um tempo, passou a ficar sedado o tempo todo e, mesmo assim, as crises de contração muscular não paravam. E isso não tinha hora, era dia e noite", relata Myllenna.

Com a progressão da doença e a intensificação dos sintomas, Myllenna e Gustavo Ramos, pai de Pedro Guilherme, tiveram de mudar sua rotina para acompanhar o filho na UTI (Unidade de Terapia Intensiva) do Hospital Maceió, onde a criança passou quatro meses internada.

TRATAMENTO NA ITÁLIA

Em busca de melhorar a qualidade de vida do filho, que havia perdido a visão, a fala e parte dos movimentos, Myllenna e Gustavo buscaram um tratamento na Itália, que foi custeado com recursos arrecadados pela família em campanhas e vaquinhas. "As pessoas do nosso bairro nos ajudaram demais desde o começo", conta Myllenna.

O tratamento na Itália, que era realizado com o auxílio de eletrodos, trouxe bons resultados em um primeiro momento. Contudo, os procedimentos são realizados por ciclos e, como ele realizou apenas um ciclo, perdeu todos os sentidos. "Os movimentos do Pedro voltaram depois do tratamento. Ele chegou a mexer a perninha de novo e voltou a sorrir. Foi muito satisfatório, porque sofremos muito para ir até lá", relata a mãe.

Imagem ilustrativa da imagem Cirurgia em Londrina pode dar qualidade de vida a menino com doença rara
| Foto: Arquivo Pessoal

CIRURGIA EM LONDRINA

Em busca de uma alternativa que pudesse conceder mais qualidade de vida ao filho, Myllenna e Gustavo conheceram a cirurgia de rizotomia dorsal seletiva por meio da história de Davi, um menino de Manaus, que, após ser espancado, perdeu os movimentos. A criança passou pela operação em Londrina, no Hospital Evangélico, e passou a ter condições para se reabilitar.

Após pesquisar sobre o procedimento cirúrgico e as possibilidades oferecidas ao paciente, os pais de Pedro Guilherme decidiram que a opção poderia ser uma forma viável de o filho continuar a tratar a adrenoleucodistrofia sem as crises de contração muscular.

Com isso, Myllenna e Gustavo realizaram campanhas para arrecadar recursos e recorreram à Defensoria Pública de Alagoas. "Todos estavam muito engajados na campanha, mas o valor era muito alto, então não iríamos conseguir em pouco tempo. Com o processo junto à Defensoria, ganhamos judicialmente, mas não cumpriram o prazo de pagamento. O que era para levar dez dias levou um mês e meio e, assim, precisamos até remarcar a cirurgia", conta a mãe de Pedro Guilherme.

A cirurgia de rizotomia dorsal seletiva foi, finalmente, realizada nesta segunda-feira (13), no Hospital Evangélico, pelo neurocirurgião pediátrico Alexandre Canheu, médico especialista e referência para essa operação no Paraná e no Brasil.

De acordo com Canheu, o procedimento de Pedro Guilherme durou três horas e tudo ocorreu conforme o esperado. O médico pontua que, no caso da criança, a cirurgia tem o objetivo de melhorar as crises de contração muscular.

"Com o procedimento, queremos melhorar as crises de hipertonia, que é o aumento anormal do tônus muscular, o que faz com que o músculo perca a capacidade de relaxar e, assim, provoque a rigidez por conta da contração muscular constante. Essa é uma situação que leva à dor e necessidade de sedação", explica.

Conforme pontua Canheu, a melhora da condição motora de Pedro Guilherme irá permitir que a criança tenha mais qualidade de vida ao longo do tratamento que está previsto para acontecer em Curitiba, no Hospital Pequeno Príncipe. "Essa cirurgia é voltada para a parte motora, então, infelizmente, não vai devolver a visão e a fala. Porém, sem dúvidas, vai possibilitar que ele não tenha mais tantas dores - que podem se assemelhar às dores causadas pelas câimbras - e que não fique sedado", conta Canheu.

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PRÓXIMOS PASSOS

Segundo neurocirurgião pediátrico Alexandre Canheu, Pedro Guilherme irá ficar na UTI por um dia - ao longo desta terça-feira (14) - e deve ir para o quarto na quarta-feira (15). O médico pontua que, inicialmente, a equipe do hospital está realizando o desmame dos sedativos, uma vez que a interrupção total da aplicação dos medicamentos pode causar abstinência.

Após passar pela recuperação do procedimento cirúrgico no Hospital Evangélico, Pedro Guilherme e sua família têm outro destino: a capital paranaense, onde um novo tratamento será iniciado. "O Hospital Pequeno Príncipe é um hospital de referência para esse tratamento que o Pedro precisa. Depois que tratarmos tudo direitinho, queremos voltar para a Itália para que o Pedro faça os outros ciclos do tratamento que iniciamos", explica a mãe.

Para custear a estadia em Londrina e, na sequência, em Curitiba, a família tem arrecadado recursos por meio de campanhas on-line, realizadas, inclusive, pelo Instagram de Pedro Guilherme.

Além disso, o dinheiro arrecadado será utilizado, posteriormente, para a realização do tratamento com eletrodos na Itália, que precisa ser feito de três em três meses e tem um custo médio de R$ 120 mil.

As doações de qualquer valor podem ser feitas por meio do Pix, na chave do CPF 116.723.104-07 e no nome de José Gustavo Ramos Gomes.

A ADRENOLEUCODISTROFIA

A adrenoleucodistrofia, em linhas gerais, causa a perda da “bainha da mielina”, que consiste na membrana protetora das células do sistema nervoso central e da medula espinhal.

A patologia afeta uma a cada 20 mil pessoas e não tem cura, mas, atualmente, existem alternativas de tratamento que podem conferir mais qualidade de vida ao paciente. O tratamento é multidisciplinar e, por isso, envolve fisioterapeutas, médicos, cirurgiões, enfermeiros e fonoaudiólogos.

Nesta condição, que é considerada degenerativa, o cromossomo X é afetado. O corpo não produz ou tem deficiência na produção da proteína ALDP. Como consequência, os ácidos graxos de cadeia muito longa não entram no interior da estrutura chamada “peroxissomo”, que são organelas responsáveis por degradar subprodutos tóxicos no metabolismo.