Entre 2017 e 2019, operações policiais causaram o assassinato de, ao menos, 2.215 crianças e adolescentes no Brasil. De 2020 a 2023, 1.110 foram baleadas. Isso não é um fato futuro, está acontecendo hoje, está acontecendo agora. Para analisar essa situação, está sendo usada como base a música Canção Infantil. Lançada em 2019, a composição aborda infâncias interrompidas pelo atual cenário bélico brasileiro. Explorar o mundo cultural relacionando-o com um tema social foi um exercício proposto em uma atividade escolar do primeiro ano do ensino médio, como incentivo à prática da redação e da criatividade.

“É cada um no seu espaço, sapatos de cristal pisam em pés descalços”. Capas de jornais têm sido ocupadas por casos como o de Kauan Alves, de 16 anos, atingido no rosto em uma manhã de Natal, ou da garotinha Agatha Félix, de 8 anos, morta no Complexo do Alemão, na zona norte do Rio de Janeiro. Mortes violentas relacionadas a ações policiais cresceram 16% de 2017 a 2019, o levantamento foi feito pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública.

“Diz por que as descobertas são letais? Os monstros se tornaram literais, eu brincava de polícia e ladrão um tempo atrás, hoje ninguém mais brinca... ficou realista demais”. Cesar Resende Lemos nasceu e vive no Morro do Quadro, em Espírito Santo: “Na escola eu ficava mais no canto. Em casa eu escrevia na parede do quarto”, conta ele ao G1. O compositor da música Canção Infantil, que tem o objetivo de poetizar o trágico ponto de vista das crianças que crescem nas periferias, também fala sobre o racismo. Aproximadamente 70% das vítimas da problemática destacada têm menos de 19 anos e são pretas ou pardas.

É preocupante que a maioria dessas mortes não sejam noticiadas e que um cenário absurdo de uma sociedade se torne banalizado. Foi o caso de Matheus, 19 anos. Ele foi assassinado enquanto estava parado de moto na zona norte carioca. Na delegacia, o sargento disse que o matou “sem querer” e quis cumprimentar o pai do jovem, que se negou, questionando-o “como vou apertar sua mão se você matou o meu filho?”.

A desigualdade social, a falta de acesso à educação e oportunidades, a presença do tráfico de drogas e a fragilidade do sistema de proteção à infância são apenas alguns dos fatores que contribuem para a vulnerabilidade desses jovens. Enquanto não abordarmos essas questões de formas eficazes, estaremos condenando gerações inteiras ao ciclo de violência e marginalização.

César também quis esquadrinhar sobre a dor, o sofrimento e tentar descobrir se somos capazes de superar ao voltar para o início, que é a infância: “tá tudo do avesso, falhamos no berço, nosso final feliz tem a ver com o começo”. Além disso, a música nos convida a pensar sobre a urgência de uma resposta coletiva a essas tragédias.

Em suma, precisamos de políticas públicas que promovam a inclusão social, a segurança nas comunidades e o respeito aos direitos humanos. É necessário investir na prevenção da violência e oferecer alternativas aos jovens em situação de risco. Também é fundamental fortalecer os mecanismos de proteção à infância e à adolescência, garantindo que cada criança e adolescente tenha seus direitos assegurados e sua própria vida protegida. Isso requer o engajamento de toda a sociedade, desde as instituições governamentais até as organizações da sociedade civil e os próprios cidadãos como fez o Cesar.

Clara Calliari Dias, aluna do primeiro ano do ensino médio do Colégio Sesi de Referência Londrina.

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