Durante boa parte da minha infância, minha casa, era uma das únicas casas construídas da vizinhança, do lado rua onde morávamos. Em frente da minha casa haviam várias casas, nenhum terreno vazio sequer, enquanto o nosso lado era repleto de terrenos baldios. Na verdade, aquele lado da rua foi loteado mais tarde que o resto do bairro e meus pais começaram sua obra muito mais rápido que todos os outros vizinhos, creio eu que, na realidade, alguns daqueles terrenos nem estavam vendidos na época.
Eu cresci com aquele matagal em volta da minha casa. Brincava, me escondia e de alguma forma eu me sentia até acolhida nele. Quando voltava para casa, pegando ônibus, eu sabia que aquela era minha casa por causa da vegetação que crescia dos lados. Por muito tempo eu pensei que aquilo seria imutável e ninguém nunca iria destruir aquele espaço, pobre de mim, tão tola.
Entrava ano, saia ano e os terrenos continuavam ali e nossas brincadeiras se estendiam durante esse tempo. Quando eu cresci, acabaram com a minha farra, muros do lado direito da minha casa se levantavam. Mais alguns anos depois o outro lado também começou sua construção, eu já não brincava mais, porém estava genuinamente incomodada com a situação. Parecia que aquilo tinha destruído minha ideia do que era o meu lar. Admito que até hoje não vou com a cara dos meus vizinhos, sendo que eles realmente nunca fizeram nada para mim, que engraçado.
Hoje não moro mais lá, uma coisa engraçada que eu descobri quando sai da minha cidade é que as pessoas que não são do norte do Paraná não sabem o que é uma data. Data, além de um dia no calendário, para nós aqui do norte do Paraná é também um terreno baldio. Eu sozinha nunca teria percebido, recebi a dica de um amigo do meu namorado que debochava dele (que é do sul do Paraná) por não entender o termo, confesso que eu também dei muita risada porque era uma coisa natural para mim. Esse amigo explicou para mim que o termo provavelmente deriva de alguma palavra europeia/ucraniana, da qual eu não me recordo para poder escrever. O que faz bastante sentido por nossa cultura aqui ser bastante influenciada por esses imigrantes.
Por fim, eu lembro do meu pai me falando: "Quando eu cheguei aqui era tudo 'data', só tinha mato", e eu ria muito e pensava que isso era coisa de gente velha, ao mesmo tempo que eu nem me toquei que quando cheguei na minha casa, tudo o que tinha lá, também, era só mato. Inclusive atrás da nossa casa, abriram várias "datas" e novas ruas, e realmente quando eu cheguei aqui, "isso aqui era tudo mato".

Gabriela Bessa é estudante de jornalismo em Londrina