Dois mil quilômetros e muitos graus no termômetro separam Palmas, no Sul do Paraná, da cidade homônima no Tocantins
Dois mil quilômetros e muitos graus no termômetro separam Palmas, no Sul do Paraná, da cidade homônima no Tocantins | Foto: Anderson Coelho



A pouco mais de um mês da chegada do inverno, as temperaturas chegam a atingir 35º C em Palmas e em General Carneiro. A previsão do tempo que poderia soar como piada para a maioria dos moradores do Sul do Estado, acostumados com o termômetro batendo abaixo dos dois dígitos, faz parte da rotina de outros palmenses e carneirenses: os do Tocantins e de Mato Grosso. Além de Palmas, que tem o mesmo nome da mais nova capital do País, e General Carneiro, que tem uma "xará" no sudeste mato-grossense, outros 49 municípios paranaenses possuem um ou mais homônimos em outros Estados, uma incidência de um para cada oito municípios.

O maior número de homônimos está em São Paulo e Minas Gerais: oito cada. A seguir aparecem Santa Catarina (6), Rio Grande do Sul (6), Bahia (5), Paraíba (4), Pernambuco (4). A lista tem ainda outros 16 Estados com pelo menos uma cidade com o mesmo nome de uma paranaense (veja infografia). As campeãs de nomes repetidos, com outros três homônimos, são: Planalto, cuja grafia aparece também na Bahia, São Paulo e Rio Grande do Sul; Santa Inês (Bahia, Maranhão e Paraíba) e Santa Helena (Maranhão, Paraíba e Santa Catarina).

Em todo o País, um em cada 11 municípios tem um homônimo. Dos 5.570, 505 encontram correspondentes em outros Estados. Bom Jesus é o campeão de registros, aparece no Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Piauí, Rio Grande do Norte e Paraíba. Já o Paraná tem Bom Jesus do Sul (Sudoeste). Se considerado algum sufixo, como neste caso, o número de municípios com nomes semelhantes passa para quase cem no Estado. Não há registro de municípios com o mesmo nome dentro de um mesmo estado. Desde 1984, uma lei determina a consulta ao IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) na criação ou na alteração para que um nome já existente em todo o Brasil não seja adotado.

A Palmas localizada na Região Norte do País foi fundada 110 anos após a "irmã" paranaense; lei não conseguiu impedir nomes iguais
A Palmas localizada na Região Norte do País foi fundada 110 anos após a "irmã" paranaense; lei não conseguiu impedir nomes iguais | Foto: Sergio Ranalli



O historiador João Carlos Vicente Ferreira, autor do livro Municípios Paranaenses: origens e significados de seus nomes (2006), apresenta algumas explicações para a nomenclatura idêntica ou semelhante dos municípios. "Temos alguns padrões nos nomes dos municípios e o primeiro deles são os aspectos geográficos, mas muitos têm origem nas línguas indígenas, principalmente tupi e guarani. A tradição lusitana de nomear suas localidades com nomes de santos também é um fator que ajuda a explicar essa relação", comenta.

Ferreira lembra que, mesmo após a lei de 1984, os nomes duplicados continuaram a ser adotados. Palmas (TO) foi fundada em 1989, depois de 110 anos da "irmã" paranaense. "Se já existia a lei isso não poderia ocorrer. São razões que fogem à compreensão", diz. Santa Helena e Palmeira, em Santa Catarina, são exemplos de municípios homônimos criados após a lei (1992 e 1995, respectivamente). Os dois municípios ficam a apenas cerca de 250 quilômetros (linha reta) de seus respectivos homônimos paranaenses, as menores distâncias. O homônimo mais distante é Japurá (AM), a quase 3 mil quilômetros do Noroeste Paranaense. A do Norte, em referência ao rio amazônico, a do Sul em homenagem ao Barão de Japurá.

Entre os homônimos paranaenses, destacam-se os nomes de santos (São Tomé, São João), geográficos (Planalto, Floresta, Terra Roxa); flora e fauna (Cascavel, Palmital, Cafelândia, Pinhão) e presidentes (Wenceslau Braz, Presidente Castelo Branco). Alguns, no entanto, têm referências diferentes. Enquanto Pinhão paranaense tem origem na semente da Araucária - árvore símbolo do Estado - Pinhão, no Sergipe, foi batizado assim por conta do pinhão-de-purga, planta medicinal que produz sementes parecidas com o amendoim.

"Saber a origem do nome dos lugares, ou sobre como determinada localidade surgiu é uma motivação inerente ao ser humano. O estudo da antropologia e toponímia nos leva a compreender melhor o espaço onde vivemos", incentiva Ferreira.

Imagem ilustrativa da imagem Uma em cada oito cidades do PR tem homônimas



Duas vezes Palmas
Muito antes das redes sociais dominarem as trocas de mensagens pela internet, Heloise Leão, 33, já dedicava boa parte do tempo às conversas pelo antigo ICQ. Quando tinha 18 anos, resolveu procurar novos amigos pelo computador. A ideia era conhecer gente em Palmas. Um contato lhe chamou a atenção: o de Flávio Leão, com quem se casaria três anos depois, em 2005. Após alguns minutos de conversa, eles notaram algo estranho. Um sentia frio, outro calor. Os nomes dos bairros não batiam. Só depois foram perceber que estavam a cerca de 2 mil quilômetros de distância: ela no Paraná e ele em Tocantins.

"Depois que fui ver que esqueci de colocar o detalhe do estado. A confusão foi grande, mas no fim deu tudo certo", comemora. O namoro avançou e, após ele se mudar para Santa Catarina, para ficar mais próximo de Heloise, eles então decidiram que se mudariam para Palmas (TO). A temperatura foi o maior choque. "No dia em que me mudei, saí de Palmas (PR) com -3º C e cheguei lá com 29º C", conta. Aos poucos, tomou conta de que trocou a cidade mais fria do Paraná pela capital mais quente do Brasil. "Logo montei minha estratégia: seguir em frente e não pensar no calor. Andava com aqueles pacotinhos de sal na bolsa para por embaixo da língua para quando a pressão baixasse."

Hoje, ela se diz adaptada e não se vê em outro lugar. "A cidade foi muito receptiva e boa comigo. Num período de menos de dois anos me formei, consegui meu primeiro emprego de carteira assinada, construí minha casa e me casei. Hoje tenho dificuldade em pensar numa vida longe daqui", disse. A professora universitária sabe reconhecer os encantos das duas cidades. "Ambas são receptivas, cada uma de seu jeito. Enquanto no Paraná as reuniões são ao redor do fogão à lenha, aqui preferimos as chácaras, beiras de lago", compara. (C.F.).

Novas Londrinas e Nova Maringá

Assim como os ingleses resolveram homenagear suas origens ao dar o nome de Londrina à Gleba Três Bocas, localidade situada no então sertão paranaense, a própria Londrina, décadas depois, serviria de inspiração para a denominação de outro município: Nova Londrina (Noroeste). Criado em 1956, o município tem 13,4 mil habitantes e pertence à microrregião de Paranavaí.

Mais tarde, a partir da década de 1960, paranaenses que amargavam prejuízos com a agricultura por conta das geadas iniciaram uma corrente migratória rumo ao Norte do País. Vanderlei Miranda, 64, foi um deles. Deixou Toledo (Oeste) rumo à Ji-Paraná (RO) e, em janeiro de 1986, se estabeleceu no distrito de Nova Londrina. "Foi uma homenagem que os pioneiros fizeram para Londrina, gente que chegou poucos meses antes da minha família", lembra.
Apesar de ser agrônomo, Miranda se estabeleceu mesmo como comerciante. Até hoje mantém um mercado na única avenida do distrito. "Apesar de ser pequeno, o distrito mudou bastante. Antes, era uma selva que só", conta. Apesar de admitir que a vida não foi fácil, ele não se arrepende da mudança. "Eu gosto daqui. É um lugar tranquilo onde pude criar meus filhos e que agora ajudo a criar meus netos", diz.

No Mato Grosso, paranaenses fundaram Nova Maringá (1992). O historiador João Carlos Vicente Ferreira, paranaense que desde o fim da década de 1990 mora em Cuiabá, comenta a semelhança do nome. "As pessoas deixavam sua terra, mas queriam um jeito de homenageá-la. Assim surgiam às referências", detalha. Outra cidade homônima no Mato Grosso é General Carneiro. "Antes de ser chamado para o Cerco da Lapa, no Paraná, para a batalha da Revolução Federalista [1894], o militar Antônio Ernesto Gomes Carneiro participava da instalação de uma linha telegráfica no Mato Grosso e foi homenageado por esse motivo", explica. (C.F.)

Confira o infográfico interativo