A instalação de novos radares para a fiscalização de trânsito em Londrina vem provocando questionamentos antes mesmo que os aparelhos comecem a funcionar. A complicação nada tem a ver com o funcionamento dos equipamentos nas ruas, mas sim com a forma com que a CMTU (Companhia Municipal de Trânsito e Urbanização de Londrina) decidiu fazer o processo. A licitação 053/2020, que teve os envelopes abertos no dia 13 de março, prevê a contratação de uma empresa para que sejam alugados aparatos para a fiscalização de 65 pontos do trânsito da cidade – 43 a mais dos já existentes –, além de 40 câmeras e um novo sistema. A mudança incluiu novos equipamentos para os 22 pontos já existentes no município. O valor limite que havia sido orçado para toda a operação ao longo de um ano era de R$ 8,6 milhões.

O certame foi alvo de uma ação popular e de questionamento por parte do OGPL (Observatório de Gestão Pública de Londrina), mas já há uma empresa encaminhada para executar o serviço. Na ata do pregão consta como vencedora a empresa de São Paulo Mobit Mobilidade, Iluminação e Tecnologia Ltda, num contrato com o preço final mensal de R$ 600 mil, sendo o custo total em um ano de aluguel fechado em R$ 7,2 milhões. A habilitação técnica já foi feita e a conclusão do processo segue em passos lentos devido ao ritmo moroso imposto pela pandemia da Covid-19 aos trâmites legais.

Em um relatório elaborado por uma voluntária, a advogada Fernanda Moreli, o OGPL fez quatro questionamentos para a CMTU. O primeiro diz respeito ao critério sobre o tipo de tecnologia escolhida, que oferece menor concorrência no mercado. O segundo trata do estudo técnico que resultou na decisão do número de novos pontos de fiscalização. O terceiro pergunta qual resultado de segurança o órgão espera. O último ponto coloca em xeque a capacidade da própria CMTU em fazer o trabalho ela mesma. A FOLHA questionou a empresa municipal sobre as respostas que recebeu.

Imagem ilustrativa da imagem Licitação de novos radares provoca questionamentos à CMTU
| Foto: Marcos Zanutto/16-10-2018

RESPOSTAS

Segundo a gestora do trânsito de Londrina, via assessoria, “a escolha pela tecnologia se deu por fatores técnicos de eficiência, bem como pela facilidade de instalação dos equipamentos levando em conta a preservação da integridade do pavimento asfáltico das vias públicas”. Ainda é citada uma decisão do TC (Tribunal de Contas do Estado do Paraná) que afirma que o método é o mais eficiente. Já ao que se refere ao estudo técnico, ele está disponível no sistema da CMTU na internet e, segundo o órgão, atende à resolução do Conselho Nacional de Trânsito.

Ao que diz respeito ao resultado esperado, a empresa afirma que os 105 pontos de monitoramento possibilitarão “agir rapidamente em situações de segurança e mesmo preventivamente através de ações direcionadas, visando a retirada de circulação de veículos clonados ou baixados e que são muitas vezes utilizados para o cometimento de infrações e delitos”. Sobre a capacidade de fazer por si própria a fiscalização, a CMTU ressalta que é assim que os municípios têm feito e que é a forma de manter a tecnologia atual.

O OGPL foi questionado pela FOLHA sobre as respostas, mas não se pronunciou, visto que o órgão ainda não recebeu as respostas da CMTU. O prazo para que isso ocorra ainda está valendo. Independentemente do que foi indagado pelo Observatório, a ação civil movida pelo advogado londrinense Fábio Theophilo, em 11 de março deste ano, traz questionamentos importantes sobre o processo de licitação, apesar de ter tido a liminar de suspensão do certame indeferida pela 2ª Vara de Fazenda Pública de Londrina. A ação ainda deverá ser julgada em seu mérito, num prazo indefinido pelos atrasos causados pela pandemia.

RAPIDEZ

Ex-presidente do Conselho Municipal de Trânsito de Londrina, entre 2006 a 2008, Theophilo questiona que havia uma previsão no orçamento no município para a compra de novos radares no valor de R$ 1 milhão e que, em vez disso, a CMTU resolveu fazer o processo por meio de aluguel, o que aumentou o gasto em mais de sete vezes. “Mais do que a questão jurídica, existe a questão moral, o que está sendo feito é incrementar a arrecadação de forma que o recurso não ficará para a CMTU”, questiona. Isso porque, segundo ele, a empresa contratada repassará para a empresa municipal somente o excedente do valor das multas após se chegar ao total de R$ 600 mil. “A empresa privada vai levar o dinheiro da multa”.

Outro ponto apontado pelo advogado foi o prazo que foi dado para o processo da licitação: o edital foi publicado no dia 21 de fevereiro de 2020 com a data prevista para o pregão presencial sendo no dia 13 de março de 2020, com a diferença de apenas 21 dias. Para Theophilo, a explicação para essa rapidez é que a Lei de Responsabilidade Fiscal limitaria a contratação de serviços, por causa das eleições municipais, ao prazo do dia 1º de abril. “Essa rapidez do procedimento licitatório viola o princípio de competitividade do certame e inviabiliza a competição de outros eventuais participantes interessados limitando a concorrência, podendo-se levantar, inclusive, suspeitas de direcionamento do mesmo em benefício de determinada empresa”, questiona na ação.

A FOLHA procurou a CMTU sobre o processo, mas, com a decisão relativa à liminar perdida, considerou os questionamentos respondidos pela Justiça. Theophilo, diante do prosseguimento da licitação em meio à indefinição dos danos econômicos causados pelos efeitos da Covid-19, voltou a criticar a decisão da prefeitura. “No meio da pandemia, não era hora de pensar em fazer essa licitação. A prefeitura passa por dificuldades, a arrecadação vai cair e a CMTU falando em licitar radar, num valor de milhões. Isso é um escândalo. Um absurdo”, conclui.