Com ambição de cumprir o mandato até 2018, Michel Temer defende a separação da chapa encabeçada por Dilma Rousseff que saiu vencedora das eleições de 2014
Com ambição de cumprir o mandato até 2018, Michel Temer defende a separação da chapa encabeçada por Dilma Rousseff que saiu vencedora das eleições de 2014 | Foto: Marcos Corrêa/PR


Além de iniciar um dos julgamentos mais importantes da sua história, na Ação de Investigação Judicial Eleitoral (Aije) 194358, que pode resultar na cassação do presidente Michel Temer (PMDB), o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) deve consolidar o entendimento da chapa única e indivisível na campanha. Não há prazo para a conclusão do julgamento, que foi suspenso na última terça-feira (4) para que o TSE ouvir mais testemunhas e também coletar novos provas. Além dos marqueteiros do PT João Santana e Mônica Moura, será ouvido também o ex-ministro da Fazenda Guido Mantega.

A maioria dos especialistas em direito eleitoral ouvidos pela reportagem descarta a possibilidade da separação da chapa que venceu as eleições presidenciais de 2014, encabeçada pela ex-presidente Dilma Rousseff (PT), cassada no ano passado pelo Congresso Nacional. Esse debate ganhou força com a tese defendida pelos advogados de Temer, que herdou o mandato da petista e planeja cumpri-lo até 2018, quando serão realizadas novas eleições gerais. Até o PSDB, autor das quatro principais ações que pedem a cassação da chapa, apoia a divisão.

Derrotado na última campanha presidencial, o PSDB e a Coligação Muda Brasil alegaram, logo após o pleito, que houve por parte de PT e PMDB veiculação de ampla propaganda institucional em período vedado, a ocultação de dados econômico-sociais negativos por parte do Ipea, do IBGE e do Ministério do Meio Ambiente, e o uso do Palácio do Planalto para atividades de campanha, além de "corrupção e fraude no financiamento da campanha eleitoral". No entanto, com o impeachment de Dima, os tucanos chegaram ao governo, na base de apoio ao presidente Temer.

No caso de Dilma, a maior consequência do julgamento no TSE é a inelegibilidade por oito anos, acabando com os planos da ex-presidente de disputar as eleições estaduais, algo que está nos planos dela. Se a chapa for anulada, Dilma poderia ficar inelegível até 2022, contados da data da última eleição. Segundo o advogado Maurício Carneiro, "havendo condenação por abuso de poder econômico, a cassação da chapa independe da prova da participação do vice, que também sofrerá a penalização". "Há votos em julgados do início da década 2000 no TSE sustentando que o vice poderia assumir pelo princípio da pessoalidade da pena, que pode ultrapassar a pessoa responsável pelo ato ou conduta, mas foram vencidos sob o argumento de ser impossível individualizar a repercussão no resultado da eleição, e ser inquestionável que o vice obteve vantagem, mesmo sem sua participação", afirmou Carneiro.

Para o vice-presidente da comissão de direito eleitoral da OAB/PR, Leandro Rosa, "não temos precedentes para essa possibilidade de separar a chapa, pois o tratamento deve ser dado em conjunto". Ele porém, alerta para o contexto do processo, onde o meio político está alinhado com o peemedebista, diferente do que acontecia com Dilma. "Neste caso, da maneira como as coisas foram se desenvolvendo, algo novo pode acontecer." Segundo Rosa, mesmo que o julgamento no TSE seja rápido, "ainda haverá fase recursal, pois quando a matéria tem a ver com a Constituição, é possível entrar com recurso extraordinário para discussão no STF (Supremo Tribunal Federal)". "De qualquer forma, está sendo uma boa oportunidade para esclarecermos procedimentos eleitorais, com grau de profundidade muito grande. Vemos um Tribunal investindo em um processo que pode resultar na cassação da chapa eleita para a presidência do País. Mostra amadurecimento."

NOVAS ELEIÇÕES

Prevalecendo a cassação da chapa única, a Presidência da República deverá ser ocupada pelo presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (PSB/RJ), com a obrigação de convocar novas eleições. Neste ponto, surge outra divergência: eleições diretas, com a participação de todo o eleitorado, ou indiretas, onde votam apenas os congressistas.

Conforme o artigo 81 da Constituição Federal, a disputa seria indireta. "Ocorrendo a vacância nos últimos dois anos do período presidencial, a eleição para ambos os cargos (presidente e vice) será feita trinta dias depois da última vaga, pelo Congresso Nacional", diz o texto. Contudo, segundo a professora de Direito Constitucional e Eleitoral do Unibrasil, Ana Carolina Clève, "a regra constitucional prevista no artigo 81 da Constituição Federal incide apenas para os casos de vacância decorrente de morte, renúncia ou impeachment; isto é, nos casos em que se pressupõe que a investidura no mandato foi válida e legítima".

No caso da Aije 194358, a vacância pode ocorrer pelo reconhecimento de vício no processo eleitoral, implicando na nulidade do mandato desde o início. "À luz da normativa eleitoral, as eleições somente serão indiretas se a vacância do cargo ocorrer a menos de seis meses do final do mandato. Assim, se a perda do mandato ocorrer durante os 3 anos e 6 meses do mandato, sempre haverá eleição direta, ou seja, serão convocadas novas eleições", explicou a professora.

O advogado Guilherme Gonçalves, concorda com a tese de eleições diretas, se Temer for cassado. "Acho difícil a separação da chapa. Considerando que se analisa algo anterior à eleição, cabe a aplicação do artigo 224 do Código Eleitoral, onde devem ser feitas novas eleições quando a vacância do cargo ocorrer a menos de seis meses do final do mandato." Para ele, a Procuradoria Geral Eleitoral (PGE) acertou ao indicar a manutenção dos direitos políticos de Temer. A PGE pede a cassação da chapa, mas inelegibilidade apenas para Dilma. Se esse entendimento for mantido no TSE, Temer poderá disputar as novas eleições, mesmo cassado.