SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - O ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) afirmou à Record que não tinha participação em suposto monitoramento de campanha pela Abin (Agência Brasileira de Inteligência) e atribuiu ao general Augusto Heleno, então ministro do Gabinete de Segurança Institucional, decisões referentes ao trabalho de inteligência.

"Em dado momento [de reunião ministerial de 2022], Heleno falou que ia seguir os dois lados, se inteirar dos dois lados. É o trabalho da inteligência dele, que eu não tinha participação nenhuma", afirmou o ex-presidente em entrevista veiculada na sexta-feira (9).

"Eu raramente usava as inteligências que nós temos, das Forças Armadas, a própria Abin, a Polícia Federal. Não vejo nada demais naquilo. O Heleno queria se estender sobre o assunto, eu falei que não era o caso de ficar entrando em detalhes. Vai fazer uma operação, faça. A Abin tem esse poder de fazer operações e preservar as pessoas até", continuou.

O vídeo de reunião de 2022 foi usado como base para a operação da PF (Polícia Federal) na semana passada e tornado público pelo ministro Alexandre de Moraes, do STF (Supremo Tribunal Federal).

No final da reunião, Heleno cita a Abin e o "problema da inteligência".

Na sua decisão que autorizou a operação, Moraes destaca que a fala do general demonstra um núcleo de inteligência paralela, uma vez que o general afirma ter discutido na agência a infiltração de agentes nas campanhas políticas.

"Eu já conversei ontem com o Victor [Carneiro], novo diretor[-adjunto] da Abin, e nós vamos montar um esquema para acompanhar o que os dois lados estão fazendo. O problema todo disso é que se vazar qualquer coisa [..], a gente se conhece nesse meio, se houver qualquer acusação de infiltração desses elementos da Abin [...]".

Bolsonaro então interrompe Heleno e pede que ele pare de falar. "Ô general, eu peço que o senhor não fale, por favor. Não prossiga mais na tua observação aqui. Eu peço que não prossiga na tua observação", afirma, dizendo que eles conversariam no particular sobre "o que porventura a Abin está fazendo".

Em outra fala, Heleno diz que medidas precisam ser adotadas antes das eleições. Para a Polícia Federal, a declaração mostra o militar defendendo que órgãos de Estado atuem para assegurar a vitória de Bolsonaro.

"Não vai ter revisão do VAR. Então, o que tiver que ser feito tem que ser feito antes das eleições. Se tiver que dar soco na mesa é antes das eleições. Se tiver que virar a mesa é antes das eleições", disse Heleno.

O então chefe do GSI conclui: "E vai chegar a um ponto que nós não vamos poder mais falar. Nós vamos ter que agir. Agir contra determinadas instituições e contra determinadas pessoas. Isso para mim é muito claro".

A PF deflagrou na quinta (8) a Operação Tempus Veritatis para apurar organização criminosa que teria atuado na tentativa de golpe de Estado e abolição do Estado democrático de Direito.

Ocorrida em um contexto de forte ofensiva de Bolsonaro contra a lisura das urnas eletrônicas, a reunião da cúpula do governo contou com a presença, entre outros, de Augusto Heleno, do então ministro da Justiça, Anderson Torres, e do então ministro da Defesa, Paulo Sergio Nogueira.

VALDEMAR DA COSTA NETO

O ministro Alexandre de Moraes concedeu no sábado (10) liberdade provisória ao presidente nacional do PL, Valdemar Costa Neto, preso durante operação deflagrada pela Polícia Federal na última quinta (8). Ele deixou a superintendência da PF em Brasília à noite.

Valdemar havia sido preso em flagrante por posse ilegal de arma de fogo. A arma foi localizada pela PF durante ação de busca e apreensão contra ele em Brasília, ocasião em que também foi encontrada uma pepita de ouro.

Moraes levou em conta argumentos da PGR (Procuradoria-Geral da República) pela liberdade provisória do investigado. O magistrado considerou ainda o fato de que o político tem idade avançada, 74 anos, e afirmou que o caso não envolveu violência ou grave ameaça.

"O custodiado [Valdemar] já se encontra submetido a medidas cautelares, adequadas e suficientes, que o impedem de interferir na atividade investigatória", afirmou a PGR.

"Não se reconhece, por outro lado, a sua periculosidade, a que se vincula o risco da reiteração delitiva, tampouco a presença de circunstâncias supervenientes capazes de alterar o quadro que justificou as medidas anteriormente decretadas", acrescentou.

O ministro afirmou que, apesar de continuarem "presentes os requisitos ensejadores da prisão preventiva, algumas circunstâncias específicas devem ser analisadas, uma vez que o investigado é idoso, tendo 74 anos, e não teria cometido os crimes com violência ou grave ameaça".

Nas redes sociais, após a informação sobre a decisão de Moraes de sábado, o PL agradeceu "por todas as palavras de apoio, carinho e orações" direcionadas ao presidente da sigla. "As demonstrações que recebemos de solidariedade são verdadeiramente reconfortantes e fortalecem nosso compromisso com o bem-estar e o progresso de nossa nação."

A PF afirma que o político participou da suposta trama para aplicar um golpe de Estado no país e manter Jair Bolsonaro (PL) no poder.