Enquanto se envolvem em polêmicas, vereadores deixam de trabalhar por Londrina
Enquanto se envolvem em polêmicas, vereadores deixam de trabalhar por Londrina | Foto: Marcos Zanutto



Em momento de crise econômica no País, cujos reflexos são visíveis em Londrina – pelo alto índice de desemprego, baixa arrecadação, falta de recursos para investimentos no setor público, retração dos aportes privados e demanda crescente por serviços públicos -, alguns vereadores da cidade, em vez de ajudarem a encontrar soluções, acabaram se tornando parte do problema. É inegável que o Legislativo está em crise. Para analistas ouvidos pela FOLHA, quatro vereadores criaram ou são responsáveis por fomentar a crise.
A volta de Jamil Janene (PP) ao Legislativo, para o professor da UEL (Universidade Estadual de Londrina) Elve Miguel Cenci, doutor em filosofia, é um dos ingredientes da crise já que o pepista não foi reeleito. "Está na Câmara graças a uma manobra do prefeito", resume, lembrando que o eleito na coligação PP/PTB foi o Fernando Madureira (PTB), convidado para assumir a presidência da Fundação de Esportes (PTB). O prefeito Marcelo Belinati (PP) convidou, então, o segundo suplente Douglas Pereira (PTB) para presidir a Acesf (Administração de Cemitérios e Serviços Funerários), vagando a cadeira para Janene.
"Mesmo que não haja ilegalidade nesta manobra, isto é um fator de crise. Muitos eleitores questionam por que o Jamil Janene está na Câmara quando votaram no Madureira. O Madureira, por sua vez, fez uma escolha mediante conveniência política; foi uma escolha do prefeito, que tem afinidade e confiança no Jamil Janene", analisa Cenci.
Já a atuação de Filipe Barros (PRB) e Emerson Petriv, o Boca Aberta (PRB), leva a crise para a Câmara. O primeiro, que se declara conservador e assume posições de extremistas, conseguiu despertar a ira dos sindicatos, um dos segmentos mais organizados da sociedade, ao praticar "bulliyng" contra grevistas na paralisação nacional em 28 de abril, chamando-os de vagabundos. Não bastasse, ainda produziu vídeo e o postou em rede social, comportamento que posteriormente admitiu como equivocado. "Ele extrapolou seu discurso retórico e levou para dentro da Câmara uma reação organizada dos sindicatos, o que denota falta de maturidade política." Por este episódio, sofreu representações na Comissão de Ética.
Boca Aberta, por sua vez, com o bordão de que está defendendo o povo, não hesita em xingar, ofender e constranger quem quer que seja. Age como se não fosse político, embora tenha investido muito tempo para se tornar justamente um político. Aliás, antes de alçar o cargo eletivo, transitou, por muitos anos, nos bastidores da política, ocupando cargos comissionados em gestões anteriores. A pretexto de fiscalizar o cumprimento de médicos em unidade de pronto atendimento – o que seria salutar – acabou criando o caos na unidade e atraindo a ira dos profissionais, que fizeram representação contra ele. Recentemente, protagonizou episódio no Plenário da Câmara, quase agredindo fisicamente Janene.
"O Boca Aberta leva a crise para o Legislativo. Quando doa parte do salário (para o Hospital do Câncer), ele constrange os demais vereadores; ele tentou agredir o Janene; fez um escândalo ao fiscalizar a UPA", enumera Cenci. Mas não é só isso. "Ele vai criando fatos políticos; apresenta projetos com vício de iniciativa, desgastando a imagem do Legislativo, já que muitos projetos não podem prosperar; assim, ele se sai bem perante o eleitorado, mas alguém fica mal."
Para o professor do departamento de Ciências Sociais da UEL, Ronaldo Baltar, doutor em sociologia, os dois são vereadores focados em si mesmos, cuja meta é atrair popularidade para suas bandeiras. "Alguns novos vereadores têm uma visão bastante pessoal da política; investem nessa nova forma midiática de fazer política, são os políticos youtubers, que procuram causar polêmica para atrair visibilidade para as propostas deles. E conseguem porque têm bastante seguidores", descreve. "Alguns vereadores vêm pecando pela falta de decoro. Como agente público, o vereador tem que exercer o papel de ser um mediador, um balizador da cidade, e não ser a pessoa que vai cometer esses atos de discriminação, de críticas que são generalizantes, e isso apenas com a finalidade de criar polêmica e aumentar a visibilidade nas redes sociais", critica.

ÉTICA?
Há, ainda, um quarto vereador que contribui para alavancar a crise: o decano da Casa, Gerson Araújo (PSDB). Ele responde a processo por improbidade administrativa e a processo penal por estelionato e falsidade ideológica por fato ocorrido no curto tempo em que ocupou o cargo de prefeito de Londrina, o último trimestre de 2012. Ele teria pressionado proprietário a vender terreno para a Iguaçu do Brasil, construtora acusada de um dos maiores golpes contra consumidores ao não entregar imóveis a centenas deles. Recentemente, a Polícia Federal instaurou inquérito para apurar crime eleitoral na campanha de 2016, quando o tucano teria omitido valores na prestação de contas.
O problema é que, com esta ficha corrida, Gerson é o presidente da Comissão de Ética da Câmara. Neste momento de instabilidade, com demandas contra vários vereadores, poderá ser o tucano – com sua vida pregressa – a selar o destino dos colegas. "Se o presidente da Comissão de Ética responde a processos por situações ligadas à função pública, isso desestabiliza a comissão de ética, justamente quando esta comissão tem sido extremamente demandada", avalia Cenci. "Independentemente de comprovação, o vereador deveria se afastar do cargo de presidente", recomenda.

Partidos políticos devem ‘enquadrar’ vereadores
O professor Ronaldo Baltar sugere uma ação efetiva dos partidos políticos a que pertencem os vereadores que estão extrapolando os limites da função legislativa. Para ele, a crise na Câmara pode ser contida com a conscientização individual de cada um, com a punição pelas esferas legais da Câmara, mas, principalmente, com a ação dos partidos. Também seria fundamental que Gerson Araújo (PSDB) deixasse a titularidade da Comissão de Ética, já que se trata de um fator de extrema instabilidade para eventuais punições, diz Baltar.
"Ainda dá tempo de a Câmara voltar os olhos para essas questões da cidade e deixar de lado sua agenda pontual. Os partidos precisam se articular junto com a sociedade e com o município neste momento de crise." O professor também acredita que o prefeito Marcelo Belinati (PP), "com sua liderança na Câmara, tem que provocar um debate mais vinculado à agenda de desenvolvimento sustentável da cidade". "O prefeito tem que ser mais protagonista em pautar a agenda da Câmara, o que forçaria os vereadores a deixarem de lado seus projetos menores e particulares."
Ao lado dos vereadores que desencadeiam focos de crise estão parlamentares com pouca experiência política, avalia o professor Elve Cenci, lamentando que nomes expressivos da legislatura passada – como Elza Correia, Lenir de Assis e Fábio Testa, o professor Fabinho – não tenham disputado o pleito ou não tenham sido reeleitos. "A maioria (dos eleitos) não está à altura das demandas da cidade, não tem este nível de preparo para discutir em profundidade os problemas", considera. (L.C.)