Câmara está distante de problemas importantes da cidade
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domingo, 21 de maio de 2017
Loriane Comeli<br>Reportagem Local
Em momento de crise econômica no País, cujos reflexos são visíveis em Londrina pelo alto índice de desemprego, baixa arrecadação, falta de recursos para investimentos no setor público, retração dos aportes privados e demanda crescente por serviços públicos -, alguns vereadores da cidade, em vez de ajudarem a encontrar soluções, acabaram se tornando parte do problema. É inegável que o Legislativo está em crise. Para analistas ouvidos pela FOLHA, quatro vereadores criaram ou são responsáveis por fomentar a crise.
A volta de Jamil Janene (PP) ao Legislativo, para o professor da UEL (Universidade Estadual de Londrina) Elve Miguel Cenci, doutor em filosofia, é um dos ingredientes da crise já que o pepista não foi reeleito. "Está na Câmara graças a uma manobra do prefeito", resume, lembrando que o eleito na coligação PP/PTB foi o Fernando Madureira (PTB), convidado para assumir a presidência da Fundação de Esportes (PTB). O prefeito Marcelo Belinati (PP) convidou, então, o segundo suplente Douglas Pereira (PTB) para presidir a Acesf (Administração de Cemitérios e Serviços Funerários), vagando a cadeira para Janene.
"Mesmo que não haja ilegalidade nesta manobra, isto é um fator de crise. Muitos eleitores questionam por que o Jamil Janene está na Câmara quando votaram no Madureira. O Madureira, por sua vez, fez uma escolha mediante conveniência política; foi uma escolha do prefeito, que tem afinidade e confiança no Jamil Janene", analisa Cenci.
Já a atuação de Filipe Barros (PRB) e Emerson Petriv, o Boca Aberta (PRB), leva a crise para a Câmara. O primeiro, que se declara conservador e assume posições de extremistas, conseguiu despertar a ira dos sindicatos, um dos segmentos mais organizados da sociedade, ao praticar "bulliyng" contra grevistas na paralisação nacional em 28 de abril, chamando-os de vagabundos. Não bastasse, ainda produziu vídeo e o postou em rede social, comportamento que posteriormente admitiu como equivocado. "Ele extrapolou seu discurso retórico e levou para dentro da Câmara uma reação organizada dos sindicatos, o que denota falta de maturidade política." Por este episódio, sofreu representações na Comissão de Ética.
Boca Aberta, por sua vez, com o bordão de que está defendendo o povo, não hesita em xingar, ofender e constranger quem quer que seja. Age como se não fosse político, embora tenha investido muito tempo para se tornar justamente um político. Aliás, antes de alçar o cargo eletivo, transitou, por muitos anos, nos bastidores da política, ocupando cargos comissionados em gestões anteriores. A pretexto de fiscalizar o cumprimento de médicos em unidade de pronto atendimento o que seria salutar acabou criando o caos na unidade e atraindo a ira dos profissionais, que fizeram representação contra ele. Recentemente, protagonizou episódio no Plenário da Câmara, quase agredindo fisicamente Janene.
"O Boca Aberta leva a crise para o Legislativo. Quando doa parte do salário (para o Hospital do Câncer), ele constrange os demais vereadores; ele tentou agredir o Janene; fez um escândalo ao fiscalizar a UPA", enumera Cenci. Mas não é só isso. "Ele vai criando fatos políticos; apresenta projetos com vício de iniciativa, desgastando a imagem do Legislativo, já que muitos projetos não podem prosperar; assim, ele se sai bem perante o eleitorado, mas alguém fica mal."
Para o professor do departamento de Ciências Sociais da UEL, Ronaldo Baltar, doutor em sociologia, os dois são vereadores focados em si mesmos, cuja meta é atrair popularidade para suas bandeiras. "Alguns novos vereadores têm uma visão bastante pessoal da política; investem nessa nova forma midiática de fazer política, são os políticos youtubers, que procuram causar polêmica para atrair visibilidade para as propostas deles. E conseguem porque têm bastante seguidores", descreve. "Alguns vereadores vêm pecando pela falta de decoro. Como agente público, o vereador tem que exercer o papel de ser um mediador, um balizador da cidade, e não ser a pessoa que vai cometer esses atos de discriminação, de críticas que são generalizantes, e isso apenas com a finalidade de criar polêmica e aumentar a visibilidade nas redes sociais", critica.
ÉTICA?
Há, ainda, um quarto vereador que contribui para alavancar a crise: o decano da Casa, Gerson Araújo (PSDB). Ele responde a processo por improbidade administrativa e a processo penal por estelionato e falsidade ideológica por fato ocorrido no curto tempo em que ocupou o cargo de prefeito de Londrina, o último trimestre de 2012. Ele teria pressionado proprietário a vender terreno para a Iguaçu do Brasil, construtora acusada de um dos maiores golpes contra consumidores ao não entregar imóveis a centenas deles. Recentemente, a Polícia Federal instaurou inquérito para apurar crime eleitoral na campanha de 2016, quando o tucano teria omitido valores na prestação de contas.
O problema é que, com esta ficha corrida, Gerson é o presidente da Comissão de Ética da Câmara. Neste momento de instabilidade, com demandas contra vários vereadores, poderá ser o tucano com sua vida pregressa a selar o destino dos colegas. "Se o presidente da Comissão de Ética responde a processos por situações ligadas à função pública, isso desestabiliza a comissão de ética, justamente quando esta comissão tem sido extremamente demandada", avalia Cenci. "Independentemente de comprovação, o vereador deveria se afastar do cargo de presidente", recomenda.
Partidos políticos devem enquadrar vereadores
O professor Ronaldo Baltar sugere uma ação efetiva dos partidos políticos a que pertencem os vereadores que estão extrapolando os limites da função legislativa. Para ele, a crise na Câmara pode ser contida com a conscientização individual de cada um, com a punição pelas esferas legais da Câmara, mas, principalmente, com a ação dos partidos. Também seria fundamental que Gerson Araújo (PSDB) deixasse a titularidade da Comissão de Ética, já que se trata de um fator de extrema instabilidade para eventuais punições, diz Baltar.
"Ainda dá tempo de a Câmara voltar os olhos para essas questões da cidade e deixar de lado sua agenda pontual. Os partidos precisam se articular junto com a sociedade e com o município neste momento de crise." O professor também acredita que o prefeito Marcelo Belinati (PP), "com sua liderança na Câmara, tem que provocar um debate mais vinculado à agenda de desenvolvimento sustentável da cidade". "O prefeito tem que ser mais protagonista em pautar a agenda da Câmara, o que forçaria os vereadores a deixarem de lado seus projetos menores e particulares."
Ao lado dos vereadores que desencadeiam focos de crise estão parlamentares com pouca experiência política, avalia o professor Elve Cenci, lamentando que nomes expressivos da legislatura passada como Elza Correia, Lenir de Assis e Fábio Testa, o professor Fabinho não tenham disputado o pleito ou não tenham sido reeleitos. "A maioria (dos eleitos) não está à altura das demandas da cidade, não tem este nível de preparo para discutir em profundidade os problemas", considera. (L.C.)