Depois de 26 horas de intensos debates, os vereadores de Londrina cassaram ontem de manhã o mandato do prefeito afastado Antonio Cassemiro Belinati (PFL) numa sessão especial de julgamento que foi iniciada na quinta-feira, às 7 horas e só terminou ontem, às 9 horas. Belinati, que cumpria o terceiro mandato, é o primeiro prefeito cassado em Londrina, em 66 anos de emancipação do município.
Antonio Belinati entra para a história como o primeiro prefeito cassado em 66 anos da emancipação política de Londrina. A sessão de julgamento terminou ontem cedo, durou 26 horas, e exigiu persistência para a leitura das quase 2 mil páginas do processo. No final os vereadores optaram pelo voto aberto e nominal. O prefeito foi cassado com o voto de 14 vereadores
Belinati foi acusado de gastos excessivos em publicidade e promoção pessoal na inauguração do Pronto Atendimento Infantil (PAI), ocorrida em 27 março de 99. Numa sessão cansativa, mas tranquila, Belinati foi considerado culpado de infrações político-administrativas pelos vereadores. A defesa do prefeito na Câmara foi feita pelos advogados João Graça e Mauro Viotto, auxiliados por outros seis profissionais. Os dois prometem recorrer da decisão.
Os 20 vereadores tiveram que participar de sete votações – para cada uma das infrações relacionadas no relatório da Comissão Processante (CP) que analisou o assunto. Minutos depois de o presidente da Casa, Flávio Vedoato (PL), anunciar a cassação do prefeito por 14 votos contra 6 (placar registrado em todas as votações), os integrantes do Movimento pela Moralização na Administração Pública de Londrina, iniciaram a comemoração.
Eles cantaram o Hino Nacional ainda dentro do Legislativo, soltaram rojões na praça ao lado da Câmara e fizeram uma carreata pelas ruas do centro da cidade. ‘‘Foi a vitória da ética, da moralidade’’, disse o presidente da subseção da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) de Londrina, Lauro Zanetti.
O pessoal do grupo pró-Belinati, auto-intitulado Movimento pela Legalidade, por outro lado, deixou as galerias em silêncio. Todo o aparato montado em frente ao prédio do Legislativo (dois caminhões de som, shows com grupos de pagode e farta alimentação) foi em vão. Durante a votação, eles ainda mantinham a esperança de que Belinati não seria cassado e aplaudiram os vereadores que votaram contra. A exemplo do grupo, os vereadores Antenor Ribeiro e Renato Araújo (ambos do PPB) também saíram silenciosamente do plenário.
‘‘Põe aí no jornal que o Belinati foi cassado por um açougueiro que ele subestimou’’, disse o vereador Orlando Bonilha Proença (PDT), com os olhos cheios de lágrimas. Foi um desabafo. Bonilha deu o voto de minerva que possibilitou a cassação.
A denúncia de gastos excessivos e promoção pessoal na inauguração do PAI foi apresentada em março pelos advogados Luiz Fernando Oliveira Batista, Maria Terezinha Navarro e Paulo Alípio de Campos Silveira, o contador Luiz Antonio Pereira Marques e o estudante Leonardo Navarro Thomaz de Aquino.
A CP havia sido instalada no dia 23 de março e Bonilha escolhido como presidente. Dias depois, ele e o vereador Jaci Aguiar (PPB) foram acusados de tentar extorquir dinheiro, em nome de um grupo de vereadores, para não irem adiante com a comissão. O vereador renunciou à presidência no dia 17 de abril. No lugar dele assumiu Osvaldo Bergamim (PMDB), que comemorou muito a decisão de ontem.
Depois dos encaminhamentos iniciais, às 10 horas de anteontem, os vereadores começaram a se revezar na leitura do processo de 1.924 laudas. Segundo o processo, Belinati é acusado de ter cometido sete infrações: convite, com a assinatura do prefeito, para a inauguração do PAI – confecção e expedição; telefonemas (telemarketing) com mensagem gravada pelo próprio Belinati; transporte de pessoas para a inauguração; colocação de outdoors; ampla publicidade nos principais jornais do Estado; divulgação da inauguração em emissoras de rádio e televisão; publicação da revista do Meio Ambiente/AMA onde há uma foto do prefeito e um texto assinado por ele.
Segundo apurou a CP, foram gastos aproximadamente R$ 400 mil em publicidade para a inauguração do PAI. Em depoimento à CP, Belinati afirmou que havia gasto apenas R$ 40 mil. O caldo engrossou com o depoimento do publicitário Waurides Brevilheri Junior, proprietário da Metrópole Propaganda, responsável pela campanha publicitária de inauguração do Pronto Atendimento. Brevilheri Junior apresentou notas fiscais e peças de campanha que comprovaram gastos bem acima dos admitidos pelo prefeito.
Os advogados Mauro Viotto e João Graça, que atuaram na defesa do prefeito cassado, não conseguiram convencer os vereadores do contrário. Às 5 horas da madrugada de ontem, quando iniciou a defesa, Viotto disse que Belinati não havia autorizado gastos superiores a R$ 40 mil para a inauguração do PAI. Os advogados do prefeito afastado também tentaram fazer com que a votação fosse secreta, mas não obtiveram êxito.
Os vereadores optaram pelo nominal aberto. Dois vereadores, Elza Correia (PMDB) e Carlos Santa Rosa (PFL) foram impedidos de votar. O advogado do prefeito cassado havia conseguido uma liminar na Justiça alegando a suspeição de Elza e Santa Rosa que teriam feito comentários na imprensa sobre o caso dando a entender que iriam votar pela cassação de Belinati.
No lugar de Santa Rosa e Elza Correia assumiram Jamil Hatti (PFL) e Francisco Roberto (PT), respectivamente. Se Belinati esperava se beneficiar com a troca, ficou decepcionado, já que ambos se mostraram favoráveis ao voto aberto e votaram pela cassação.
Embora cassado e com direito a recurso na Justiça, Belinati ainda responde a uma Comissão Processante que investiga a venda de ações da Sercomtel e irregularidades na contratação do show da Xuxa e na compra de marmitex. Sua administração é alvo ainda de duas Comissões Especiais de Inquérito (CEI) que tramitam na Câmara.
Belinati é apontado pelo Ministério Público (MP) como um dos principais responsáveis em irregularidades na administração, sendo denunciado em cinco medidas judiciais. Por solicitação do MP, ele está afastado judicialmente desde o dia 15 de maio. A Promotoria apurou que foram desviados pelo menos R$ 16 milhões dos cofres públicos. Grande parte dos recursos teria sido utilizado para pagamento de campanhas eleitorais. (Colaborou Lucília Okamura)