Dispomos de várias lentes que nos permitem observar o mundo que nos embala no seu caldo cultural e civilizatório, embora reconheçamos que nenhuma é integral ou definitiva. Mesmo que fosse, seria impossível olvidar que o vasto mundo oriental com o seu histórico pujante, longe dos olhos da centralidade europeia da idade média e moderna, continua ali, grande e imponente player econômico planetário!

A China avança para se configurar na maior economia mundial. Diga-se a propósito, que embora tenha aumentado o seu orçamento bélico em relação ao PIB, ela tudo faz para evitar conflitos abertos, desgastantes e prejudiciais. Seria uma vertente da “sabedoria oriental”?

O mundo que conhecíamos, que nos sustentou tal líquido amniótico, não existe mais! A mudança de época, numa amálgama de morte da modernidade, queda da razão hegemônica, avanço da modernidade líquida como nos fala Zigmund Bauman e a introdução do fator digital, condensado agora numa evidente nova cultura, fomentada e alimentada por redes sociais, novos aplicativos etc., dá forma, cor e textura a uma nova performance civilizatória.

São mares nunca dantes navegados, que exigem de nós coragem, ousadia e a certeza de que não voltaremos atrás. Para os cristãos, a perplexidade, encontra paralelo na queda de Constantinopla em 1453, considerado o fim da medievalidade, quando os muçulmanos gritando Alá adentraram os muros e passaram a fio de espada os adeptos de Jesus de Nazaré! Causa estupor, que lá como cá, muitos ainda estejam “discutindo o sexo dos anjos” enquanto as muralhas caem!

A guerra fria foi ruim. O mundo vivia sob a opressão de armas nucleares atômicas estocadas e numa tensão constante entre leste e oeste. Quem não recorda a terrível “crise dos mísseis”? Americanos, cubanos e soviéticos se prepararam para um confronto, que por vários dias se acreditou inevitável. Com a queda do muro de Berlim, o mesmo mundo respirou aliviado.

Hoje, porém, não sou exagerado ao manifestar certo saudosismo dos tempos em que a guerra “era fria”! A virada do século e do milênio trouxe de volta o fantasma da extrema direita e dos políticos populistas, que nos assustam bem mais do que Nikita Khrushchov, Leonid Bresjnev, Andropov e Konstantin Chemenko!

As tensões na Península da Coreia, no Mar da China, a invasão da Ucrânia, o atual caldeirão de fogo no Oriente Médio com o seu potencial real de alargamento e os vários conflitos regionais na África tornam o mundo um lugar perigoso para se nascer! Crimes cibernéticos e extremismos terroristas são outros temperos deste caldo!

Mas, se o estrondo dos mísseis caindo e o zumbido dos drones mortais ainda não for suficiente, enterramos cada vez mais vítimas das mudanças climáticas, negadas pelos que decidiram de modo autofágico impedir os seus netos de respirar! O planeta pede socorro e o sapiens alimenta o fogo com combustível fóssil!

O papa Francisco, o único líder despretensioso, clarividente e profético, não tem economizado palavras para denunciar as loucuras, que podem encerrar a odisseia do homem na terra. Já o chamaram de “apocalítico”! Contudo, os profetas do AT e o próprio Jesus legitimam as suas interpelações.

O planeta geme as dores da destruição, inviabilizando a vida de milhões de pessoas que só lhes resta morrer ou tomar a trilha de refugiados. Hoje já se aproximam dos 18 milhões! O clima bagunçado é sinal de pobreza, miséria e morte. E a corda sempre quebra pelo lado mais fraco. As mudanças climáticas expõem mais uma vez a perversa desigualdade social!

Os sinais de esperança exigem mudança de mentalidade dos que normalmente fomentam o desespero! Os homens que podem destruir são os mesmos que podem salvar! Este princípio básico do livre arbítrio é o mais belo da criação, inerente ao ser humano. A ONU chama a atenção para a proximidade do ponto inflexível. Abramos os olhos!

Padre Manuel Joaquim R. dos Santos, Arquidiocese Londrina

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