Ninguém sabe o que ocorrerá nas próximas horas na Ucrânia. Essa incerteza dilacerante para o mundo já dura há semanas. Foram sobejamente esmiuçados pela imprensa, os interesses envolvidos nesse potencial conflito armado. Como em todas as guerras, paradigmaticamente a Primeira Guerra Mundial, a confluência de pequenos e grandes interesses incendiados por alguns acidentes, geram uma proporção e um rastro de morte, incalculáveis.

Quero falar da guerra em si. Das centenas no mundo, cinicamente chamados de “pequenos conflitos regionais”, mas especialmente do espírito belicoso que hoje, passados setenta e sete anos da Segunda Guerra Mundial, ainda caracteriza a humanidade. Os homens continuam tão insanos quanto na época das cavernas! Com uma agravante: São mais letais! Não aprendem nada com a história! Sobreviventes dos campos de concentração são obrigados a conviver com uma boa parcela que nega essa terrível carnificina! Os cemitérios dos milhares de soldados mortos se espalham pela Europa e são até visitados como um ato cívico de respeito pela sua memória. Um gesto vazio e mentiroso!

A guerra é a personificação do absurdo. Existem “guerras preventivas”, “guerras civis” e até “guerras santas”! Todas têm em comum o insuportável odor da carnificina, da destruição e do sofrimento, em suas mais variadas formas. Desde que o sapiens surgiu no planeta, os conflitos foram-se aprimorando e as justificativas para a guerra, com a passagem dos séculos, assumindo formas legais e, pasmem os leitores, inteligíveis!

Os homens do Antigo Testamento tinham até “época de ir à guerra”! Diziam que a primavera era o tempo propício! Geralmente ordenada por Deus, que decidia quando, como e com quem guerrear! De fato, a guerra e a religião caminharam juntas e os sacrifícios antes do ato de guerrear buscavam o auxílio das entidades superiores! Espanhóis e portugueses se enfrentaram em inúmeras batalhas cada um pedindo o auxílio do “seu santo”! São Jorge do lado lusitano e São Tiago de Castilla!

Os cavaleiros na Idade Média ansiavam pela chegada do combate! Quando não tinham embates reais, se aprimoravam em torneios! Por incrível que nos pareça, havia uma “mística da guerra” que envolvia todas as dimensões do ser humano, refletidas na educação, na religião ou na arte, como se o ato belicoso fosse inato ao homem.

Mas não é. Uma das frases mais emblemáticas da Bíblia está no primeiro fratricídio “da história” em Gn. 4,9: “Onde está o teu irmão”, pergunta Deus a Caim. Homens não usufruem da verdadeira paz quando enxergam no outro um adversário ou inimigo a abater! A civilização humana, verdadeiramente humana, só avança no trilho do respeito e da fraternidade. O desenvolvimento é sinónimo da paz. A guerra é a cara da destruição de pontes, escolas, cidades inteiras e devastação.

Podemos usar a conceptualização bíblica do pecado ou outras similares, mas o conflito será sempre uma desumanização no expoente mais elevado do termo. Invadir outro país ou desperdiçar mais recursos do PIB em armamento do que são investidos em educação e saúde é de uma insanidade ou “imbecilidade” sem limites!

E um exército nacional? Não passa de um figurino, gerador da ilusão ótica de que o país está seguro! Porquanto, ou o país é de fato forte o suficiente para enfrentar grandes potências e desestimulá-las a uma agressão, ou, como na maioria absoluta das nações, é um desperdício de recursos.

Imagem ilustrativa da imagem ESPAÇO ABERTO - Guerra e Paz
| Foto: Handout / Russian Defence Ministry / AFP

Por infelicidade, os 130 mil soldados russos às portas da Ucrânia nos revelam que a frágil paz no planeta Terra ainda depende do equilibro de forças bélicas entre países ou regiões. O papa Francisco assim dizia: “A guerra é uma loucura. Enquanto Deus cuida da sua criação e nós, homens, somos chamados a colaborar na sua obra, a guerra destrói; destrói até mesmo o que Deus criou de mais belo: o ser humano. A guerra tudo transtorna, incluindo a ligação entre irmãos. A guerra é louca, propõe a destruição como plano de desenvolvimento: querer desenvolver-se através da destruição”!

Padre Manuel Joaquim R. dos Santos, Arquidiocese Londrina