Após a leitura do estoico artigo publicado no dia 24 de janeiro próximo passado, de autoria de um brilhante, sério, estimado, competente e referenciado sacerdote, que abordou a questão do celibato ainda exigido pela Igreja Católica ocidental, deparei-me na edição do dia 1/2/2024 com outro artigo de autoria múltipla onde os missivistas não só discordam da opinião expendida no dia 24, mas o fazem de forma, a meu ver, no mínimo deselegante ao atribuir ao sacerdote interesses pessoais, ou de constituir uma família, tudo se repita, porque opinou sobre a necessidade de a Igreja Católica latina reestudar a questão dos membros inuptos que a integram.

Todos sabem que respeito as opiniões de todos, convergentes ou divergentes, porém, confesso que fiquei estupefato com os argumentos inseridos no artigo, especialmente quando procuram desmentir ou desfazer o que narra a Bíblia, além de apontar que o celibato existe “há milênios”, o que não é verdade.

A interpretação que deram à Bíblia é fruto de desconhecimento, até porque afirmam que quando Jesus pediu a Pedro para deixar sua mulher, ele, segundo os autores, não quis dizer que seria a esposa de Pedro.

Peço licença para mostrar aos autores que Jesus se referiu, sim, à esposa de Pedro, tanto que Mateus 8:14-15 e Lucas 4:38 reproduzem o que Marcos 1:29-31 narra do momento em que Jesus curou a sogra de Pedro, e mais, Pedro, além de casado, tinha filhos. Em uma das histórias, contam que Petronila seria uma de suas filhas. Afirmar o contrário é mascarar o que a Bíblia afirma expressamente.

Os autores desconhecem que a Igreja Católica ocidental teve uma lista de papas casados, antes ou após se tornarem papas, e a situação fica mais intrigante porque se repita, afirmaram que o celibato é exigido “há milênios”, quando, em verdade, passou a ser adotado em 1139, no Segundo Concílio de Latrão, ou seja, há 900 anos!

Muitos sabem que escrevi um livro, lançado e com toda a edição esgotada, onde a protagonista é judia e faz severas, corretas e honestas críticas à Igreja Católica, uma delas é o de ainda exigir o celibato, afirmando que o pastor (evangélico), o rabino (judeu), o Imã (islâmico) e outros precisam ser casados para exercer o múnus.

E ela questiona: o que mudaria se o sacerdote católico fosse casado e tivesse filhos? Deixaria, por ser casado, de ser o representante e transmissor da palavra de Deus? A Igreja Ortodoxa, que é cristã, segue a mesma Bíblia e os ensinamentos de Jesus, permite e incentiva a ordenação de um clero casado, deixando o celibato para decisão pessoal do postulante.

A Igreja Católica nunca foi um primor! Lembram-se da Inquisição que durou séculos, que lançava os “hereges” na fogueira porque não seguiam a religião católica? E a venda de indulgências em praça pública, precificando a pecúnia a ser paga conforme o pecado? Recordam das Cruzadas que os reis católicos, papas e bispos organizaram para matar muçulmanos no Oriente Médio? Deus jamais faria isso, mas a Igreja Católica, composta por homens, fez. Portanto, esses e centenas de outros erros foram perpetrados pela Igreja Católica ocidental e corrigidos, daí porque o celibato, a meu ver, é outro erro que precisa ser corrigido.

Para auxiliar os leitores a entender essa questão, e para que os autores do artigo compreendam, é importante mencionar que o papa Adriano II era casado com uma mulher chamada Estefânia, e tinha uma filha. Sua esposa e filha ainda estavam vivas quando foi selecionado para ser papa e residia com ele no Palácio de Latrão, antes do Vaticano. O papa João XVII foi casado antes de sua eleição ao papado e tinha três filhos que se tornaram sacerdotes, assim como o papa Clemente IV, que era casado antes de tornar papa e tinha duas filhas, e o papa Honório IV, casado antes de assumir as ordens santas, que também teve ao menos dois filhos.

Portanto, o sacerdote tem todo o direito de opinar, sendo isso não só um direito constitucional, mas previsto nos cânones da Igreja Católica, pois não representa um desafio a qualquer norma, inclusive, o papa Francisco já acenou sobre a necessidade de se reestudar esse tema.

Almir Rodrigues Sudan, graduado em direito, economia e jornalismo.

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