A possibilidade de realização de 'cessão de herança' pelo herdeiro
A "Cessão de Herança" ou, utilizando a nomenclatura tecnicamente correta, a Cessão de Direitos Hereditários é o contrato por meio do qual um dos herdeiros transmite, por ato oneroso (doação) ou gratuito (venda), total ou parcialmente o quinhão da herança sobre o qual tem direito, por expressa autorização contida no art. 1.793 do Código Civil.

Em outras palavras, a lei civil autoriza que, aberta a sucessão (com a morte, natural ou presumida, do autor da herança), o coerdeiro realize transferência de todo o seu quinhão hereditário ou parte dele por ato inter vivos (entre vivos), independentemente de estar concluído o inventário (e até mesmo antes do seu início). No entanto, este ato, que costuma ser feito para que um herdeiro possa fazer proveito do valor patrimonial da herança antes da partilha, principalmente quando esta é objeto de litígio, deve respeitar alguns requisitos que serão tratados a partir daqui.

Em primeiro lugar, a Cessão de Direitos Hereditários deve ser feita por meio de escritura pública, isto é, mediante a formalização de instrumento público junto ao Cartório ou Tabelionato. O desrespeito a este requisito (formal) leva à invalidade do ato.

Além disso, determina o art. 1.794 do Código Civil que deve ser respeitado o direito de preferência dos demais coerdeiros no caso de um deles manifestar a intenção de ceder sua quota parte a pessoa estranha à sucessão, podendo o(s) coerdeiro(s) interessado(s) que não tomaram conhecimento da cessão retomar a quota cedida a estranho no prazo de 180 (cento e oitenta) dias da transmissão, contados do conhecimento desta (art. 1.795).

Por fim, o Código reputa ineficaz (atenção para a importância desta expressão): a cessão sobre qualquer bem da herança considerado singularmente, isto é, de um bem individualizado que compõe o acervo; ou sem que haja prévia autorização do Juiz (o que se dá por meio de Alvará Judicial) quando pendente a indivisibilidade, ou seja, durante o trâmite do Inventário Judicial.

Com base neste dispositivo, é comum que tabeliães se neguem a confeccionar o instrumento público nos casos acima descritos, o que não se justifica, porque não há qualquer vedação legal para a prática do ato de cessão – ineficácia não é proibição.

Ressalva-se apenas que, quando a cessão recai sobre bens imóveis, o registro da propriedade do cessionário (futuro adquirente) na matrícula somente é realizado após a partilha, pois o que se adquire é o direito hereditário sobre o bem e não o imóvel propriamente dito.

Conclui-se, portanto, que pode o quinhão hereditário ser objeto de Cessão de Direitos, seja em sua totalidade ou em parte, e até mesmo que possa haver a cessão de um único bem da herança, desde que, nesse caso, haja autorização judicial ou, quando não estiver pendente Inventário Judicial, anuência dos demais herdeiros.

Gabriel Carmona Baptista, advogado e secretário da Comissão de Direito Imobiliário e Urbanístico da OAB Londrina