Fornecimento do remédio pelo governo é fundamental para garantir a vida da garota Stefany; família não tem como pagar tratamento que custa mais de R$ 30 mil por mês
Fornecimento do remédio pelo governo é fundamental para garantir a vida da garota Stefany; família não tem como pagar tratamento que custa mais de R$ 30 mil por mês | Foto: Anderson Coelho
Imagem ilustrativa da imagem STF discute custeio de tratamentos; PR gastou R$ 440 mi desde 2010



Nos últimos seis anos, a Secretaria da Saúde do Paraná (Sesa) gastou quase R$ 440 milhões para atender as demandas judiciais que obrigaram o Estado a fornecer 9,2 milhões de medicamentos de alto custo para portadores de doenças raras. O Paraná tem hoje 8.910 pacientes que fazem uso desses medicamentos, mas uma decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) pode tirar de Estados e municípios a obrigação do custeio desses tratamentos.
A Corte deve retomar na sessão desta quarta-feira (28) o julgamento que irá decidir se o Estado deve ou não pagar por medicamentos não disponíveis na lista do Sistema Único de Saúde (SUS) para pacientes portadores de doenças raras sem condições financeiras de pagar pelo tratamento. O julgamento foi interrompido no dia 15 de setembro depois de pedido de vista do ministro Luís Roberto Barroso.
A discussão é acompanhada com apreensão por pacientes, amigos, familiares e entidades de defesa dos direitos de pessoas que sofrem de doenças raras. No último fim de semana ocorreram manifestações em várias capitais do País para alertar a população sobre os riscos de que uma decisão favorável ao Estado tenha reflexos em outros casos semelhantes no País e desde às 22 horas desta terça-feira (27) pacientes e apoiadores de todo o País fazem vigília em frente ao STF, em Brasília (DF), na tentativa de sensibilizar os ministros para a importância da obrigatoriedade do fornecimento de medicamentos pelo governo. De outro lado, Palácio do Planalto, Estados e municípios também monitoram atentamente o julgamento por temerem que a manutenção da obrigatoriedade tenha impacto negativo nas contas públicas.

JUDICIALIZAÇÃO
De acordo com a advogada-geral da União, Grace Mendonça, até julho deste ano, o Ministério da Saúde já cumpriu 16.301 ações que tratam do fornecimento de medicamentos e tratamentos, mais do que durante todo o ano passado inteiro (14.940). Segundo Grace, de 2010 a 2015, houve um aumento de 727% nos gastos referentes à judicialização da saúde.
"O julgamento do STF é uma pressão dos governos e das secretarias estaduais de saúde. O que está em discussão é quanto vale uma vida", analisou a delegada da Associação dos Familiares, Amigos e Portadores de Doenças Graves (Afag) no Paraná, Daiane Kock.
A dificuldade de acesso a medicamentos de alto custo tem levado muitos pacientes a recorrerem à Justiça para garantir o tratamento. "Ninguém fica feliz com a judicialização, que não é boa para ninguém, mas é a única forma de garantir a vida. O processo é doloroso para o paciente e mais doloroso ainda quando o pedido é negado. Buscamos um diálogo com os Estados, só que a gente é empurrado para a judicialização. Quando se procura a secretaria estadual de saúde, a primeira resposta é sempre não. Seria muito mais interessante que houvesse políticas públicas para doenças graves", disse Daiane, mãe de um menino de 6 anos de idade portador da síndrome de West, tipo de epilepsia de difícil controle. Para conseguir o medicamento, Daiane recorreu à Justiça.
A criação de políticas públicas específicas, defende a delegada da Afag no Paraná, não só facilitaria o acesso aos medicamentos de alto custo como também contribuiria para o diagnóstico precoce das doenças. "Um diagnóstico leva, em média, dez anos para ser feito. Antes disso, os pacientes sofrem muito com diagnósticos errados."

R$ 30 MIL POR MÊS
Antes de completar um ano de vida, Stefany, de 9 anos de idade, foi diagnosticada com mucopolissacaridose do tipo 1, doença metabólica hereditária na qual o portador nasce com falta ou redução de algumas enzimas presentes no organismo. O tratamento é caro. A reposição das enzimas que faltam no organismo de Stefany deve ser feita uma vez por semana e a cada aplicação, são utilizados quatro frascos de um medicamento importado dos Estados Unidos que custa US$ 600 o frasco.
Após o diagnóstico da doença, durante seis meses os pais da menina tentaram conseguir por vias judiciais o acesso aos medicamentos. A primeira solicitação, feita ao Estado, foi negada. A alternativa foi recorrer ao Ministério Público Federal (MPF), que atendeu à solicitação. O fornecimento do remédio pelo governo é fundamental para garantir a vida de Stefany. Se fosse pagar pelo tratamento, a família gastaria mais de R$ 30 mil por mês. "Minha filha demorou seis meses para conseguir o tratamento e mesmo depois de garantido pela Justiça, acontece de ficarmos sem o medicamento uma ou duas vezes por ano. Com a falta de cuidado adequado, ela acabou perdendo 100% da visão e recentemente passou por um transplante de córnea. Se voltar a ficar sem o medicamento, corre o risco de perder esse transplante. Se o Estado não fornecer o medicamento, não tenho condições de pagar", disse o pai, o agricultor Modesto Salomão Junior. "É um desespero quando há falha no fornecimento do remédio. A falta da enzima prejudica o corpo todo. Mas a multa que o MPF estabeleceu (para o caso de descumprimento da medida) é mais baixa que o valor do remédio", revela. (Com Agência Estado)