São Paulo e Brasília - Ao menos duas questões do primeiro dia do Enem (Exame Nacional do Ensino Médio), aplicado neste domingo (5), incomodaram lideranças ruralistas. Segundo os parlamentares, itens sobre a Amazônia e o Cerrado seriam ideológicos e criariam uma imagem negativa e distorcida do agronegócio.

A Frente Parlamentar da Agropecuária publicou nota nesta segunda-feira (6) em que pede anulação das questões. O texto diz que as perguntas não teriam critério científico.

"A vinculação de crimes a atividades legais no Brasil é um critério de retórica política para encobrir a ausência do Estado no desenvolvimento de políticas públicas eficientes e de combate a ilegalidades", diz a nota. A bancada ruralista reúne 324 deputados e 50 senadores.

Questionados, o Ministério da Educação e o Inep (Instituto de Estudos e Pesquisas Educacionais), que organiza o exame, responderam.

Os itens são o 89 e 70, da prova de cor branca. A Frente de Agropecuária pede a anulação das perguntas, esclarecimentos do governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e indica que vai encaminhar requerimentos de convocação do ministro da Educação, Camilo Santana.

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O Sindicato Rural de Ribeirão Preto também se posicionou, por meio de carta endereçada aos organizadores do exame. No texto, afirma que há uma tentativa de "demonizar o agronegócio brasileiro". O texto foi divulgado por Fabio Wajngarten, ex-assessor do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).

As duas questões trazem trechos adaptados de artigos científicos. Pedem que o participante interprete o que os autores quiseram transmitir.

Na questão sobre o cerrado, o texto do enunciado diz que a lógica do agronegócio tem se sobreposto aos conhecimentos dos camponeses. Cita termos como "chuvas de veneno".

Já no item que trata da Amazônia, o excerto indica que o desmatamento da região tem a ver com a expansão da soja, mas também com a ação de "grileiros, madeireiros e pecuaristas".

Os artigos utilizados na confecção das questões são facilmente encontrados na internet. Foram escritos por professores e pesquisadores ligados à USP (Universidade de São Paulo), UEG (Universidade estadual de Goiás) e UFG (Universidade Federal de Goiás), e veiculados em publicações científicas.

Não é a primeira vez que o Enem é alvo de ataques de grupos políticos por causa de questões da prova. O ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e aliados de direita já acusaram a prova de fazer doutrinação de esquerda.

Em seu governo, por sua vez, nenhuma pergunta sobre ditadura militar caiu nas quatro provas realizadas no período.

As questões do Enem são produzidas por professores universitários, a partir de editais elaborados pelo governo. Ainda passam por um longo processo de elaboração.

Os itens são pré-testados (várias pessoas respondem à questão) para que haja a calibração de vários atributos, como grau de dificuldade e chance de acertar no chute. Isso faz parte do modelo matemático adotado no Enem, a TRI (Teoria de Resposta ao Item).

IMAGENS

O ministro da Educação, Camilo Santana, descartou nesta segunda-feira (6) a hipótese de cancelar o Enem após a divulgação de imagens da prova.

"De forma alguma", respondeu o ministro, ao ser questionado sobre o assunto. Camilo participou de uma reunião com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), no Palácio do Planalto. Também participaram os presidentes do FNDE (Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação), Fernanda Pacobahyba, e o novo presidente da Caixa Econômica Federal, Carlos Vieira.

O objetivo do encontro foi tratar do programa de renegociação das dívidas do Fies. No entanto, Camilo também acrescentou que informou que fez para o mandatário um balanço do Enem.

O ministro disse que as 15 prisões realizadas no domingo (5), com relação com o Enem, foram "ocorrências pontuais". Ele acrescentou que duas diligências foram realizadas pela Polícia Federal, sobre a divulgação das imagens do exame, uma em Pernambuco e outra no Distrito Federal.