Maria, João, Pedro, Júlia…cada nome carrega uma identidade, uma história. Ser chamado pelo nome que você se identifica é um dos direitos mais básicos da dignidade humana. Na tarde desta quinta-feira (11), a DPE-PR (Defensoria Pública do Estado do Paraná) organizou um mutirão em oito cidades para fazer a retificação do nome e gênero de mulheres travestis e de pessoas transexuais e não binárias. Em Londrina, a ação foi realizada na sede da DPE-PR, na Avenida Bandeirantes, e a expectativa era de atender pelo menos 30 pessoas.

A defensora pública Aline Valério Bastos explica que a ação visa atender pessoas que desejam fazer a retificação do nome e gênero em documentos pessoais. Segundo ela, a retificação pode ser feita por pessoas que nasceram com determinado gênero, mas que não se identificam com ele. “A gente vem para garantir esse direito porque é um direito de identidade da pessoa, é o direito ao nome”, aponta.

O diferencial do mutirão, segundo ela, é que o processo, que não tem custos, é feito de forma extrajudicial, ou seja, a pessoa já sai da Defensoria Pública com os documentos e orientações para que a retificação de nome e gênero seja feita diretamente no cartório. Para menores de idade e pessoas não binárias, o processo ainda precisa ser judicializado, mas a DPE-PR fornece todo o suporte e realiza os encaminhamentos necessários.

A advogada garante que o processo de retificação do nome e gênero, na maioria dos casos, costuma ser simples, mas que a pessoa precisa ter em mãos uma série de documentos para que o cartório possa fazer essa mudança. A DPE-PR entra fornecendo todo o suporte para que as pessoas consigam todos os documentos necessários. “Em essência, são documentos relacionados a certidões negativas, justamente para provar que não existe nenhum tipo de pendência e essa retificação tem o único objetivo de que a pessoa tenha o nome e o gênero que ela se identifica”, detalha. Com os documentos em mãos, é só ir até o cartório onde ela foi registrada para fazer a retificação.

A partir da mudança no registro, o nome e o gênero que a pessoa se identifica serão os únicos a constarem nos documentos pessoais. A maioria dos documentos é entregue durante o atendimento da Defensoria Pública. Em alguns casos, Bastos explica que as certidões precisam ser retiradas pela própria pessoa, mas que todo o encaminhamento é feito pelos defensores, inclusive com o envio de ofício. “A burocracia está na parte da documentação, mas a Defensoria Pública está aqui justamente para auxiliar e orientar sobre os documentos para que não tenha perigo de faltar nada”, afirma. Na última edição do mutirão, em novembro do ano passado, foram atendidas 75 pessoas. Para este ano, a expectativa era de auxiliar ao menos 30.

Para os casos em que é necessário entrar com um processo judicial, como no caso de menores de idade e pessoas não binárias, Aline Valério Bastos explica que o primeiro passo é uma triagem socioeconômica para ver se o solicitante se enquadra no perfil que pode ser atendido pela defensoria. “Uma vez que ela se encaixa nesse perfil, nós vamos entrar com uma ação para ter essa retificação efetivamente”, esclarece, complementando que, em regra, os documentos são os mesmos, mas que a Justiça entende como importante a judicialização.

Apesar do mutirão ter como foco a retificação do nome e gênero, o trabalho é realizado todos os dias pelos defensores. Os atendimentos são feitos de segunda a quinta-feira, das 13h às 16h. Segundo ela, ações como a do mutirão são uma forma de trazer visibilidade para a população transexual, já que está sendo realizado em diversas cidades do Paraná. “É uma data para poder chamar atenção para a causa e para que todos possam ter acesso às informações”, detalha. Além de questões relacionadas a retificação de nome e gênero, a equipe de 10 profissionais de Londrina também atua na área da família, infância, criminal e execução penal.

“Na visão da defensoria, enquanto garantidora de direitos, [a retificação do nome] é, sobretudo, uma garantia da dignidade da pessoa humana. A nossa dignidade está no nome em que usamos, o gênero com o qual nos identificamos, com a liberdade de ir e vir. A pessoa, quando faz essa retificação, se sente muito mais empoderada e apropriada dos seus direitos para poder explicar que aquele nome que está ali é o dela”, finaliza.

LIBERDADE

O estudante Rafael da Silva, 21, conta que fazer a retificação do nome é algo muito significativo para quem é transexual, ainda mais por ser totalmente gratuito. “É algo muito importante para a gente se sentir a gente mesmo”, afirma. O jovem admite que é libertador ter o nome e o gênero com que se identifica em todos os documentos.

O processo de escolha do nome não foi fácil, segundo ele, já que queria escolher algo que unisse o desejo da mãe ao dele. “Foi um período de autoconhecimento e de considerar as pessoas que estavam no meu entorno. Um nome que me representaria, mas que também não fosse algo difícil de as pessoas se acostumarem”, explica, complementando que tomou como base o seu segundo nome de nascimento para escolher ser chamado de Rafael. “É um nome que eu gostei bastante e as pessoas me chamando [de Rafael] eu já conseguia me identificar bem, então foi uma adaptação bem rápida”, garante.

Com um sorriso de orelha a orelha, ele garante que vai ser libertador poder olhar agora o nome "Rafael" nos documentos. “É uma felicidade enorme poder ter o documento com o meu nome mesmo e poder falar que eu, realmente, me chamo Rafael”, afirma.

FELICIDADE

Aos 18 anos, o estudante Brian Henrique da Silva explica que está no processo de transição de gênero desde os 13 anos, mas que por conta de toda a burocracia envolvida na retificação do nome de menores de idade, ele e a mãe resolveram esperar até que ele chegasse à maioridade. Com a mudança no nome, ele acredita que as coisas vão ser mais fáceis, já que ele vai precisar fazer documentos e contas bancárias que exigem a identificação. Sobre ser chamado, agora, de Brian, ele garante que é motivo de felicidade.