A liminar concedida pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) que garantiu a prisão domiciliar de Adriana Ancelmo, esposa do ex-governador do Rio Sérgio Cabral, levantou a polêmica sobre a extensão do benefício a outras detentas que há tempos estão no sistema prisional. Desde março do ano passado, quando o Estatuto da Primeira Infância entrou em vigor, 32 mães em todo o País passaram a cumprir a prisão preventiva em regime domiciliar. Outras 40 decisões liminares (em caráter provisório) também foram concedidas pelo STJ. A lei prevê que detentas gestantes ou com filhos menores de 12 anos tenham acesso ao benefício para que as crianças não sejam ainda mais prejudicadas. Adriana Ancelmo tem filhos de 10 e 14 anos. Ela e o marido, que permanece preso, são acusados pelos crimes de corrupção ativa e passiva, lavagem de dinheiro e organização criminosa.

As decisões contabilizadas pelo STJ no primeiro ano do estatuto incluem um caso da cidade de São José dos Pinhais, na Região Metropolitana de Curitiba. Uma mulher de 25 anos, presa por tráfico de drogas e porte de arma, foi detida em casa com o companheiro. A prisão ocorreu em março do ano passado e, em menos de 30 dias, foi concedida a prisão domiciliar. Com dois filhos, um deles ainda na fase de amamentação, ela conseguiu permanecer junto das crianças. "O recurso foi apresentado com base no artigo 318 do Código Penal (alterado pelo Estatuto da Primeira Infância). Entendo que essa mudança foi necessária porque a criança tem que vir em primeiro lugar. Na maioria dos crimes, as mulheres não têm participação direta. Elas estão atreladas a situações com os companheiros e as crianças acabam sendo punidas. Até pelo princípio da presunção de inocência, enquanto não houver sentença condenatória, o ideal é que as presas respondam em liberdade", ressaltou a advogada criminalista Heiridan Nobile, responsável pelo caso.

Além das presas provisórias, as detentas já condenadas também podem ter acesso ao benefício. A assessoria do Tribunal de Justiça do Paraná (TJ-PR) não soube informar o total de decisões semelhantes adotadas em segunda instância. No entanto, ressaltou que o último mutirão carcerário realizado no final de março resultou na concessão de prisão domiciliar a oito mulheres condenadas que cumpriam pena na Penitenciária Feminina de Piraquara. Gestantes também foram beneficiadas. O mutirão faz parte do projeto "Cidadania nos Presídios", realizado em parceria com o Ministério Público, a Defensoria Pública do Estado e o Departamento Penitenciário do Paraná (Depen).

O promotor da Vara de Execuções Penais de Londrina, Eduardo Diniz Neto, destacou que cada caso deve ser analisado considerando o bem-estar da criança. "A alteração na lei ocorreu após uma série de decisões dos tribunais superiores que já permitiam essa alternativa. […] Ainda assim, toda e qualquer análise tem que ser criteriosa. É preciso verificar se a mãe está em condições de exercer a maternidade. Mesmo sendo presa prevalece o interesse de não romper o vínculo entre mãe e filho. A erros todos nós estamos sujeitos", concluiu. Segundo ele, a concessão do benefício depende da análise psicológica da mãe e do resultado de uma sindicância sobre as condições do local de moradia para o convívio entre os dois.

Já o defensor público do Estado, Alexandre Kassama, que atua na área da execução penal, ressaltou que há muitas dificuldades no atendimento às presas provisórias, já que os processos tramitam em varas criminais diferentes. "O correto seria designar um juiz específico para as situações relacionadas ao início do processo para que as presas comuns também tenham acesso ao benefício de forma mais rápida", apontou.

Segundo ele, o novo estatuto apenas consolida a atenção à criança e ao adolescente já prevista no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). "Um menino de 6 ou 8 anos uma vez perguntou para a mãe quando ela iria ganhar o alvará. Ele aprendeu a linguagem. A pena da mãe acaba sendo também uma pena para a criança. […] Com essa polêmica [relacionada à liminar concedida à esposa do ex-governador do Rio de Janeiro], a minha esperança é que a prisão domiciliar se universalize para esses casos, que passe a ser natural. Estamos falando dos direitos das crianças, independentemente do crime cometido pela mãe", afirmou.(Com Agência Brasil)