"É minha primeira e última filha; dá muito trabalho", confessa jovem moradora da zona norte de Londrina
"É minha primeira e última filha; dá muito trabalho", confessa jovem moradora da zona norte de Londrina | Foto: Gustavo Carneiro



Fraldas e mamadeiras no lugar de livros e cadernos. Madrugadas em claro deixaram de ser opção de divertimento e se tornaram momentos de grande responsabilidade. Aos 16 anos, Lara (nome fictício) deu à luz o primeiro filho. "Vai ser o único", adiantou com o menino nos braços. A gravidez planejada foi conturbada, com enjoos até o parto. Desde os 13, Lara mora com o companheiro com consentimento da mãe. A adolescente interrompeu os estudos no 1º ano do ensino médio e agora sonha com o retorno à sala de aula. Apesar da pouca idade, a gravidez aos 15 já era muito aguardada. "Eu fiquei feliz quando descobri. Queria ter filho. Sabia dos riscos, mas achava que ia ser bem mais fácil. É muita responsabilidade, não é uma brincadeira. Ele fica doente. É remédio, é roupa, é leite, é fralda, é muita coisa. Não quero ter outro agora e nem mais para frente. Sou muito feliz com meu filho, mas não quero ter mais um", confessa a moradora do Jardim Monte Cristo (zona leste de Londrina).
Em 2014, fatos relacionadas à gravidez na adolescência representaram 60% do total de internações hospitalares de meninos e meninas na faixa etária dos 15 aos 19 anos em todo o País. Os dados foram obtidos por meio de pesquisa realizada pela professora da Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo (USP), Maria Helena de Mello Jorge. Os números do Sistema de Informações Hospitalares do SUS apontaram causas ligadas ao pré-natal, ao parto e ao período após a gestação como as principais razões para a procura por assistência médica entre os adolescentes. O total de internações nessa faixa etária em 2014 foi de 894 mil.
Até mesmo entre os mais novos (dos 10 aos 14 anos), as causas relacionadas à gestação motivaram 10% das internações. Entre esses adolescentes, as principais razões para a procura hospitalar foram externas (como acidentes e violências), doenças respiratórias, digestivas e infecciosas e a gestação. "É um problema grave que extrapola a área da saúde. As meninas, não poucas vezes, demoram em assumir a gravidez. Isso prejudica o controle do pré-natal e o número de consultas acaba sendo menor. Elas têm mais de 40% de partos cesáreos e existe uma tendência de que os filhos apresentem baixo peso", aponta Maria Helena.
Segundo a pesquisadora, cerca de 20% dos bebês nascidos no País são filhos de mães com menos de 20 anos de idade. O levantamento aponta ainda que a morte de 255 adolescentes em 2014 foi ocasionada por situações ligadas à gravidez, ao parto e ao período puerperal (após o parto). O aborto representou 7,1% desses óbitos. "O número de crianças e adolescentes representa cerca de 30% da população do País. Portanto, conhecer quem são, como vivem, quais são seus hábitos e comportamentos, de que adoecem e de que morrem, é fundamental para o estabelecimento de políticas públicas no setor. Tendo em vista que outras pesquisas, inclusive feitas pelo IBGE, estão mostrando que a atividade sexual dos adolescentes tem início bastante precoce, é preciso pensar em métodos de prevenção dessas gestações e orientar adequadamente nosso público-alvo", defende a professora da USP.

NÚMEROS IMPRESSIONAM
A pesquisa, apresentada em evento recente promovido pela Sociedade de Pediatria de São Paulo (SPSP), chamou a atenção de profissionais do setor. Para a coordenadora do Núcleo de Estudos da Violência Doméstica contra a Criança e o Adolescente da SPSP, Renata Waksman, é necessária uma ação integrada da sociedade e, principalmente, mais envolvimento e atenção das famílias no cuidado com as crianças e adolescentes. "Os números impressionam. São corpos que não estão totalmente formados, não estão maduros para enfrentar uma gestação. O problema é que a puberdade está chegando cada vez mais cedo. Meninas com 9 ou 10 anos já menstruam. Muitas vezes, para serem aceitos em grupos, esses adolescentes ingerem drogas, álcool e assumem comportamentos de risco. São meninos e meninas que, muitas vezes, têm cuidados terceirizados, independentemente da classe social", destaca.
Entre 2010 e 2015, a quantidade de bebês nascidos vivos em partos de adolescentes caiu de 551.900 para 533.893, segundo dados do Ministério da Saúde. No ano 2000, mais de 750 mil adolescentes deram à luz. No entanto, a quantidade de gestações na faixa etária dos 10 aos 19 anos é ainda maior, já que há casos de aborto subnotificados. De acordo com a pasta, além da capacitação específica para o atendimento às adolescentes, há programas em desenvolvimento nas escolas e acesso gratuito a oito métodos contraceptivos. Os medicamentos são adquiridos conforme a demanda apresentada pelos Estados.