Fartura e carestia se alternam no campo
No último dia 28 de julho comemorou-se o Dia do Agricultor. A maioria dos agricultores, talvez, nem se dá conta de que existe uma data para homenageá-los, pois não lhes sobra tempo para protestos e comemorações.

Agricultor, via de regra, não tira férias e nem faz greve, porque a natureza não deixa. Precisa estar sempre vigilante, alerta e pronto para intervir na lavoura quando uma contrariedade climática ou fitossanitária aparecer. Vive estressado, pois uma safra perdida pode ser fatal para a concretização do sonho de sobreviver confortavelmente com sua família, no campo.

Além dos riscos permanentes que a natureza lhe impõe no manejo da produção - os quais ele não tem poderes para controlar - o agricultor também é vítima de vontades alheias. Paga o preço que os outros determinam na compra das máquinas e insumos que ele utiliza e recebe o preço que os controladores do mercado estabelecem na venda da safra que colhe.

Mas pode não ser assim se o agricultor ficar vigilante. É sabido que o mercado obedece à lei da oferta e da procura, a qual estabelece que em tempos de colheita farta os preços caem porque os estoques sobem. O contrário acontece em tempos de colheita fraca. Não adianta pedir para que esta regra seja mudada, pois o mercado não atende às vontades do cidadão e nem do governo. Nossos gestores sabem muito bem disso, pois falharam inúmeras vezes na tentativa de controlar os preços de mercado e não conseguiram.

Safra boa, com preços de mercado idem, é raro, mas pode acontecer quando nossa produção bomba e a dos competidores falha. Mas, também, pode haver safras ruins, com preços igualmente ruins, porque a safra dos competidores foi excepcional, elevando os estoques nas alturas. É nessas circunstâncias que o produtor despreparado pode afundar-se em dívidas, podendo falir. Produtor antenado dificilmente deixa que isso aconteça, porque nos tempos de fartura ele guarda sobras para suportar os tempos de carestia, os quais, com frequências variadas, se alternam no tempo.

Com o dinheiro salvo nos bons tempos de fartura, o produtor precavido consegue comprar as máquinas e os insumos à vista e, nessas circunstâncias, é ele quem estabelece quanto pagar pela mercadoria que quer comprar. Igualmente, na venda da produção, o agricultor capitalizado não se vê obrigado a entregar a safra ao fornecedor dos insumos logo após colhido o produto. Pode guardá-lo e esperar para vendê-lo em momento de mercado mais favorável.

Comprar mais um pedaço de terra, aproveitando o dinheiro que sobrou com a fartura de uma safra cheia?! Pode não ser uma boa ideia, pois é nessa época quando todos querem comprar e ninguém está disposto a vender, elevando o preço da terra a níveis estratosféricos. Mesmo assim, alguns produtores podem sucumbir à tentação de fazer um bom negócio com a terra do vizinho, mesmo tendo dívidas para saldar. Certamente, um mau negócio.

O mais racional em circunstâncias como essa, é o produtor aproveitar a folga financeira obtida com a boa safra, para pagar dívidas e guardar as sobras para que uma futura má colheita não o apanhe desprevenido, forçando-o a vender a preço baixo, a terra que comprou a um alto preço. Guardar dinheiro que sobra em tempos de fartura, é garantia de sobrevivência em tempos de carestia.

Amélio Dall’Agnol, pesquisador da Embrapa Soja