De Sherlock Holmes às séries policiais, a ciência sempre esteve ao lado dos investigadores na resolução dos crimes. Afinal, quando não se conhece o autor é preciso saber juntar todas as peças e para isso é preciso um pouco de biologia, química, engenharia, medicina, veterinária e outras ciências.

No Brasil, são os peritos do Instituto de Criminalística os responsáveis por esse apoio aos policiais, além dos médicos do Instituto Médico Legal. Para os fãs de séries como CSI: Crime Scene Investigation - a mais famosa quando o assunto é perícia -, a maior dúvida é saber se de fato todos aqueles aparelhos e testes estão disponíveis.

Luciano Bucharles, chefe do Instituto de Criminalística de Londrina e perito há 22 anos, conta que vários daqueles aparelhos são reais e usados não só no Brasil como em Londrina. Um deles, o microcomparador balístico que faz a comparação entre projéteis é o mesmo que o usado pelos peritos americanos. "Claro que nosso modelo deve estar um pouco defasado, mas é o mesmo. Assim como nas séries, podemos fazer a comparação por meio visual no próprio aparelho ou conectá-lo ao computador e fazer a comparação na tela. Já aquela comparação automática, com imagens de banco de dados ainda não fazemos, porque não temos esse banco disponível", explica.

"As perícias vão começar a se concentrar nos celulares, a pessoa carrega a vida dela ali", diz Luciano Bucharles, perito há 22 anos
"As perícias vão começar a se concentrar nos celulares, a pessoa carrega a vida dela ali", diz Luciano Bucharles, perito há 22 anos | Foto: Fotos: Fábio Alcover



Segundo o perito, outra tecnologia já disponível em Londrina são os aparelhos que fazem a perícia em celulares, mesmo aqueles danificados. "As perícias vão começar a se concentrar nos celulares, a pessoa carrega a vida dela ali. Esses equipamentos que nós hoje utilizamos são os mais modernos, é o mesmo que CIA, FBI e Mossad (Serviço Secreto de Israel) utilizam. Ele faz a extração (de dados) do celular, do cartão, do chip de memória. Tem informação que você acha que apagou e quando fazemos o procedimento, aparece. Já conseguimos quebrar senhas aqui também", conta Bucharles.

Outro equipamento tradicional nas séries de televisão é a famosa maleta, com pós para coleta de impressão digital e vários kits para testes de sangue e drogas. O Instituto de Criminalística também conta com essa maleta, embora a coleta de impressões digitais hoje seja feita pelos papiloscopistas do Instituto de Identificação e não mais pelos peritos. Bucharles explica que esse material também é americano e que as maletas são montadas de maneira personalizada, com materiais e equipamentos que atendam às necessidades de quem irá usá-las.



ANÁLISE QUÍMICA
E por falar em kits e testes de substâncias, já existem também os aparelhos capazes de fazer a análise química de determinado material, identificando todos os seus componentes. O que não existe ainda é a identificação automática entre os compostos e em que material eles são usados, já que para isso é necessário um banco de dados, não disponível no País. A busca por esse correspondente é feita pelo perito. "Mas é possível alimentar esse banco, você pode colocar ali uma aspirina e depois que o aparelho identificar a composição informamos que aquilo é ‘aspirina’, podemos inclusive colocar a marca, caso haja uma pequena variação entre elas", explica ele.

Já na parte da fantasia criada pelos roteiristas estão alguns tipos de exame de DNA. Segundo Bucharles, seguindo os protocolos científicos existentes, não seria possível chegar tão rápido ao resultado de um teste de DNA. "Nem todos os aparelhos existem, uns 70% sim, mas muitos exames, por metodologia pericial americana, inclusive, você não consegue fazer daquele jeito, demora dias para o resultado. Nos seriados é como se a investigação fosse imediata, mas tem os protocolos, fora a demanda de serviço. Você não para um funcionário para fazer um caso, você dá a demanda e ele vai fazendo. Inclusive nos Estados Unidos", conta ele, que já fez treinamento com a equipe do FBI. Mas sim: é possível coletar material genético de uma tampa de caneta mordida, de uma fruta ou de um pequeno fio de cabelo.

Imagem ilustrativa da imagem Por trás das cenas de crimes



Como funciona a perícia?
O chefe do Instituto de Criminalística de Londrina, Luciano Bucharles, explica como é o procedimento. Em um caso de homicídio, seguindo os procedimentos oficiais, o primeiro órgão a comparecer é o Siate, que irá confirmar o óbito e acionar a Polícia Militar. Esta por sua vez irá acionar a Polícia Civil. "Pelo código de processo penal o delegado iria para o local, avaliaria a necessidade de perícia, providenciaria o isolamento da área, ligaria para o IML e o Instituto de Criminalística", diz.

"Quando chegamos, se o IML está lá, começamos examinando a vítima, que no nosso caso é só fotografar, ver um ou outro tipo de lesão, nós não examinamos o corpo. Retirado o corpo, vamos atrás de estojo, projétil, pegada, objetos pessoais que às vezes na hora da fuga acaba caindo, como um boné ou óculos. Em lugares fechados procuramos fios de cabelo, já em lugares abertos isso é mais complicado. Se a bala não ficar alojada no corpo, vamos procurar por ela também. Novamente, se o crime foi em um lugar fechado precisamos localizá-la. Já na rua é mais difícil, determinamos um raio para fazer essa busca."

Imagem ilustrativa da imagem Por trás das cenas de crimes
Tradicional nas séries de televisão, a famosa maleta com pós para coleta de impressão digital e vários kits para testes de sangue e drogas, também existe no Instituto de Criminalística de Londrina, embora a coleta de impressões digitais hoje seja feita pelos papiloscopistas



Outra forma de atuação dos peritos é através das solicitações feitas diretamente no Instituto. Nesse caso, o perito responsável pela área irá examinar o objeto entregue pela autoridade policial, como armas, projéteis, celulares, carros ou documentos. (E.G)

‘Fazemos mais de 200 tipos de exames diferentes’
Luciano Bucharles explica que a criminalística nasceu há cerca de 150 anos. Na época, quem auxiliava as autoridades policiais eram os médicos legistas, que não tinham formação suficiente para esclarecer outras dúvidas. Começaram então a surgir profissionais para sanarem esses questionamentos. Em Londrina, entre os 16 peritos do Instituto de Criminalística há formados em engenharia, direito, biologia, engenharia ambiental, física e bioquímica.

"Hoje fazemos mais de 200 tipos de exames diferentes. Apesar de ser uma seção do interior, Londrina é diferente das demais por ser mais completa. Geralmente no interior se faz prestabilidade de arma de fogo - para ver se a arma está funcionando -, exame de chassi de carro roubado e dos locais de morte e furto. Em Londrina fazemos também confronto balístico, documentoscopia (investigação de falsificações e adulterações em documentos), exame de informática, algumas complementações que normalmente só se faz em capitais. Entre os exames que não fazemos e precisamos enviar para Curitiba estão os de DNA e exames de química. Temos especialistas aqui, mas às vezes não compensa ter esses laboratórios no interior por causa dos custos", explica.

Na formação do perito, além daquela de sua graduação, há diversas outras matérias, algumas para ensinar a manipular equipamentos e materiais de uso exclusivo da polícia. Depois dessa formação, há o período de estágio supervisionado com outro perito, que dura aproximadamente um ano. O novo profissional só sairá sozinho cerca de um ano e meio após o início de sua formação. (E.G)