O público está tendo a oportunidade de assistir a uma produção fora do comum na tela do Villa Rica. Tradicionalmente um espaço para filmes e palco para o teatro, também se abriu nas últimas semanas para a exibição de uma série, que, por coincidência, abrange a fluidez das artes.

Os últimos episódios de “Dramaturgias”, de Rodrigo Grota, serão apresentados neste sábado (30), às 15h, encerrando a mostra que destaca peças escritas entre 1930 e 1980 por grandes nomes da dramaturgia nacional.

LEIA TAMBÉM

Londrinense é premiada no Concurso Maria Callas

Série "Dramaturgias", produzida em Londrina, estreia no Espaço Villa Rica

Em ordem de exibição, os textos clássicos “Dois Perdidos numa Noite Suja”, “Arena Conta Tiradentes”, “O Rei da Vela” e “De Braços Abertos” ganham atuações especiais e comentários de diretores, atores, dramaturgos, críticos e historiadores na produção londrinense.

"Dois Perdidos Numa Noite Suja": peça de Plínio Marcos, que reinventa a linguagem do teatro realista nacional,´é enfocada num dos episódios
"Dois Perdidos Numa Noite Suja": peça de Plínio Marcos, que reinventa a linguagem do teatro realista nacional,´é enfocada num dos episódios | Foto: Gustavo Squarcini/Divulgação

O episódio sobre “O Rei da Vela”, peça crítica escrita por Oswald de Andrade em 1933, traz uma entrevista exclusiva com Zé Celso, que dirigiu a primeira encenação da obra em 1967. O diretor, ator, dramaturgo e encenador paulista, que liderou o revolucionário Teatro Oficina, morreu em 2023. Grota considera esta uma das participações mais marcantes da série.

Os ingressos para a sessão custam R$ 10, em valor único, e podem ser adquiridos pelo site do Villa Rica ou na bilheteria física. Em seguida, haverá um bate-papo com a equipe de produção e o elenco.

OBRA LONDRINENSE

A série “Dramaturgias”, produzida em Londrina pela Filmes com Saquê, apresenta a trajetória da literatura dramática brasileira através de 13 textos originais para o palco. Peças de autores renomados como Nelson Rodrigues, Plínio Marcos, Gianfrancesco Guarnieri, Dias Gomes, Maria Clara Machado, Oswald de Andrade,

Jorge Andrade, Oduvaldo Vianna e Maria Adelaide Amaral são encenadas por um elenco majoritariamente londrinense.

Cada episódio tem 26 minutos e traz uma obra consagrada diferente, com trechos especialmente adaptados para o projeto e entrevistas exclusivas com especialistas que analisam os principais aspectos do autor em questão e seu trabalho.

O objetivo é resgatar a importância da dramaturgia nacional. O elenco conta com Erom Cordeiro, Esther Góes, Eucir de Souza, Guilherme Kirchheim, Jackeline Seglin, Leonardo Medeiros, Luli Rodrigues, Natália Lage, Ondina Clais, Otto Jr., Raquel Palma, Rogério Costa, Simone Iliescu, Sofia Cornwell, Thainara Pereira e Tiago Daniel, entre outros.

Segundo Grota, a ideia surgiu em 2018 ao perceber, nos cursos de artes cênicas, a carência de disciplinas que explorassem a nossa dramaturgia, dando a devida relevância, além da falta de abordagens sobre a relação do teatro com o cinema e a televisão. “Eu achava que aí tinha uma lacuna interessante a ser investigada, então pensei em 13 peças que seriam representativas do período áureo da dramaturgia brasileira. Pensei em textos que tivessem variedades de estilos e temáticas e que permitissem também abordagens diferentes daquelas que já foram utilizadas em adaptações brasileiras em TV”, diz o diretor.

A fidelidade ao texto original é um grande destaque da obra idealizada por Grota, considerando os diferentes elementos de cada episódio. “Eu queria que fosse valorizada cada palavra do texto dramático, que é uma coisa que eu sinto que as gerações mais novas não dão tanta importância. Acho que a peça de teatro também é literatura e o autor teve uma preocupação muito grande, tanto da estrutura, quanto da sonoridade do texto. Então, querer improvisar sobre um texto só faz sentido se for realmente parte da estética do dramaturgo”, afirma.

Ao todo, foram 44 atores e 21 entrevistados, entre Rio de Janeiro, São Paulo, Londrina e Maringá, sendo a maioria da região. As entrevistas começaram a ser gravadas ainda em 2022 e as encenações foram feitas de março a outubro do ano passado. Além disso, o processo de desenvolvimento da série contribuiu para a formação de novos profissionais no campo audiovisual em Londrina, que era outro objetivo do cineasta.

"Arena Conta Tiradentes":  segundo episódio a ser exibido neste sábado (30) recria trechos da peça de Augusto Boal e Gianfrancesco Guarnieri
"Arena Conta Tiradentes": segundo episódio a ser exibido neste sábado (30) recria trechos da peça de Augusto Boal e Gianfrancesco Guarnieri | Foto: Chiemi Nakahara/Divulgação

O ator londrinense Johnny Garcia atuou em “O Pagador de Promessas”, peça escrita por Dias Gomes e exibida na sessão do último fim de semana (23). Neste sábado (30), ele estrela o episódio “Arena conta Tiradentes”, de Augusto Boal e Gianfrancesco Guarnieri, integrando o fim da mostra.

“Fiquei muito feliz em receber o convite para participar desse projeto que é tão importante para todo mundo e para a gente estar em contato com a história do teatro brasileiro. Essas peças são clássicas por um motivo. Elas marcaram a história e devem ser revisitadas sempre. E é um motivo de muito orgulho, por ser uma uma produção feita inteiramente aqui em Londrina por um diretor londrinense”, declara.

DO PALCO PARA A TELA

O projeto “Dramaturgias” foi desenvolvido para o circuito de TVs públicas, com financiamento do Governo Federal por meio da Ancine/FSA/BRDE. No início de março, estreou na TV Brasil, canal em que ficará em exibição até o fim de maio.

Para além da televisão, a parceria entre a produtora londrinense Kinopus e o Espaço Villa Rica tornou possível disponibilizar a série ao público em um formato alternativo, apresentando-a no cinema com uma sequência de quatro episódios por sessão aos sábados.

"O Rei da Vela": episódio sobre a peça de Oswald de Andrade traz entrevista exclusiva com Zé Celso Martinez Corrêa
"O Rei da Vela": episódio sobre a peça de Oswald de Andrade traz entrevista exclusiva com Zé Celso Martinez Corrêa | Foto: Chiemi Nakahara/Divulgação

Em entrevista à FOLHA, Grota explica que a literatura, o cinema e o teatro têm diferenças fundamentais em sua linguagem: o cinema se baseia na ausência dos atores, enquanto o teatro se concentra em sua presença, e a literatura é centrada na palavra. Apesar disso, segundo ele, há uma mistura de linguagens que pode e deve ser explorada, buscando um tipo de cinema que equilibre a linguagem cinematográfica com a valorização da encenação dos atores e do texto original.

Isso explica a decisão de filmar a série em formato de cinema, construindo uma imagem que dê importância tanto à palavra quanto ao corpo do ator.

Com todos esses elementos, o diretor define a obra como um registro histórico, capaz de inspirar novas perspectivas artísticas. “Ela mostra caminhos criativos, que se você não olhar para coisas interessantes do passado, você talvez não consiga encontrar no presente. Por isso, é uma série que, de certa forma, acaba sendo uma espécie de documento histórico sobre a dramaturgia brasileira”, diz.

"De Braços Abertos": último episódio da série, traz trechos da peça de Maria Adelaide Amaral e entrevista com a atriz Irene Ravache
"De Braços Abertos": último episódio da série, traz trechos da peça de Maria Adelaide Amaral e entrevista com a atriz Irene Ravache | Foto: Denise Pimenta/ Divulgação

PROGRAMAÇÃO

Confira os últimos episódios deste sábado (30)

“Dois Perdidos Numa Noite Suja”

O primeiro episódio da última sessão recria trechos da peça de Plínio Marcos, de 1966, que reinventa a linguagem do teatro realista brasileiro, explorando a marginalidade, a violência, a desigualdade social e a solidão urbana, além de entrevistas exclusivas. Conta com os atores Luiz Eduardo Pires e Rogério Costa.

*

“Arena Conta Tiradentes”

O segundo episódio recria trechos da peça de Augusto Boal e Gianfrancesco Guarnieri, de 1967, que amplia as perspectivas do teatro político brasileiro, unindo teatro de rua, música e dança, e apresenta entrevistas exclusivas. Conta com os atores Adalberto Severiano, Christina Mattos, Diego Zadra, Johnny Garcia, Murilo de Andrade e Thainara Pereira.

*

“O Rei da Vela”

O terceiro episódio recria trechos da peça de Oswald de Andrade, de 1933, que revoluciona a escrita do teatro satírico e alegórico no Brasil, incluindo uma das últimas entrevistas concedidas pelo irreverente Zé Celso. Conta com os atores Adalberto Severiano, Guilherme Kirchheim e Lígia Niehues.

*

“De Braços Abertos”

Encerrando a série, o último episódio em exibição no Villa Rica recria trechos da peça de Maria Adelaide Amaral, de 1984, que traz uma nova visão para o teatro intimista no Brasil na época. A produção apresenta entrevistas com a dramaturga e a atriz Irene Ravache, que encenou a peça original e permaneceu em cartaz por 4 anos. Conta com os atores Leonardo Medeiros e Natália Lage.

SERVIÇO

Série “Dramaturgias”, de Rodrigo Grota (doc, 4K, 338 min, 2024)

Quando: neste sábado (30), às 15h

Onde: Cine Villa Rica (Rua Piauí, 211 - Centro)

Quanto: R$ 10, à venda no site do Espaço Villa Rica e na bilheteria do local