Imagem ilustrativa da imagem Senso crítico protege as crianças do consumismo
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O Dia do Consumidor foi celebrado no Brasil em 15 de março. Enquanto os setores da indústria e comércio celebram a data com entusiasmo, pais, educadores e entidades de proteção à infância continuam buscando alternativas para livrar as crianças da rota do consumismo desenfreado. Propagandas inseridas de forma camuflada em conteúdos de entretenimento de jogos disponíveis na internet, desenhos no cinema que incentivam padrões capitalistas de comportamento e o uso indiscriminado de brinquedos industrializados estão entre os vilões a serem vencidos cotidianamente.

Na avaliação de especialistas, a criança é considerada um consumidor necessário para a sociedade capitalista. "Há a percepção visível da criança sendo bombardeada pelas propagandas publicitárias abusivas. Vivemos um tempo em que a criança nunca teve tanto brinquedo, entretanto, vive um mundo em que prevalece o brinquedo, mas sem a brincadeira", salienta Marta Regina Furlan de Oliveira, doutora em Educação, docente da Universidade Estadual de Londrina e coordenadora do curso de Especialização em Trabalho Pedagógico na Educação Infantil da UEL.

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| Foto: Gustavo Carneiro
Marta Regina Furlan de Oliveira, doutora em Educação, afirma: "Vivemos um tempo em que a criança nunca teve tanto brinquedo, entretanto, vive um mundo em que prevalece o brinquedo, mas sem a brincadeira"



Marta alerta para o fato de que o consumismo desenfreado é responsável por algumas questões visíveis nesse novo tempo social. "Os reflexos são diversos, tais como: crianças insatisfeitas, crise de identidade infantil (no caso, sempre falta algo); crianças precoces, ausência do pensamento crítico e elaborado (já que o brinquedo, no caso, faz toda a ação, somente com um click); criança sozinha (não há mais espaços para o outro sujeito, já que o brinquedo industrial assumiu o lugar do outro)", detalha.

O padrão consumista invadiu até mesmo o ambiente escolar, na percepção de Marta. "Até mesmo na escola, vemos que essa ausência de criticidade provoca para o mundo do consumo, como é o caso: dia do brinquedo, festas comemorativas com lembrancinhas terceirizadas para pais; apresentações infantis que são reduzidas apenas ao valor alto de fantasias e enfeites, etc", argumenta.

Crianças sozinhas são reflexo de um mundo em que o brinquedo industrial assumiu o lugar do "outro", segundo os especialistas
Crianças sozinhas são reflexo de um mundo em que o brinquedo industrial assumiu o lugar do "outro", segundo os especialistas



A docente acredita que é necessário um trabalho conjunto entre pais e educadores para evitar que o consumismo desenfreado se estabeleça desde a infância. "É interessante ter clara a ideia de que não há problema em consumir, mas sim em ser consumista sem medida, sem clareza dos efeitos na vida humana. Para isso, situações simples podem ser tomadas como tecer limites à criança mediando situações em que ela precise consumir o que é necessário e não o supérfluo. Por exemplo, a criança precisa de uma sandália (necessidade) e não necessariamente a sandália da boneca Peppa (supérfluo). Na escola, é preciso entender que antes da beleza, da estética, da imagem perfeita, o compromisso é com o conhecimento crítico de crianças, possibilitando a elas novos horizontes do saber. A escola deve permitir que suas crianças sejam envolvidas por sentimentos e pensamentos emancipados, a fim de que sejam protagonistas desse tempo social, em que realmente desenvolvam ações críticas e não alienadas diante do consumo", orienta.

Renato Bastos Jr., publicitário:"A solução ética para se criar uma campanha dirigida ao público infantil está na citação: ‘Pense nos seus filhos. O que for bom para eles será bom para os outros"
Renato Bastos Jr., publicitário:"A solução ética para se criar uma campanha dirigida ao público infantil está na citação: ‘Pense nos seus filhos. O que for bom para eles será bom para os outros" | Foto: Divulgação



A propaganda deve ter limites éticos
Com o objetivo de debater ideias sobre as questões relacionadas à publicidade dirigida às crianças, assim como apontar caminhos para minimizar e prevenir os prejuízos decorrentes dessa comunicação mercadológica, o Instituto Alana criou há 12 anos o projeto Criança e Consumo. "O projeto é multidisciplinar e atua em diferentes esferas para promover o tema e fomentar o diálogo, estabelecendo parcerias com escolas e várias esferas da sociedade. Também recebemos em nosso site denúncias de publicidade abusiva dirigida às crianças e atuamos por meio de ações jurídicas, pesquisa, educação e formulação de políticas públicas", explica Ekaterine Karageorgiadis, coordenadora do projeto.
Ela cita que uma das propostas é incentivar a Feira de Trocas de Brinquedo. "Essa é uma atividade que incentiva o desapego e evita compras muitas vezes desnecessárias. No ano passado conseguimos promover mais de 60 feiras em diversas regiões do País.", enfatiza. Entre os temas amplamente debatidos por meio do projeto estão as publicidades camufladas. "Muitas vezes esse tipo de propaganda aparece em forma de conteúdo de entretenimento, durante jogos e programas de youtubers disponibilizados na internet. Cabe aos pais orientarem seus filhos em relação a isso e monitorarem os sites que são visitados pela crianças", alerta.
Publicitário há mais de 30 anos, Renato Bastos Jr., de Londrina, salienta que as crianças são protegidas dos abusos das propagandas por limites estabelecidos pelo Código de Ética Publicitária e pelo Estatuto da Criança e do Adolescente que praticamente inviabilizou a propaganda dirigida ao público infantil. "Abusos continuam a existir, principalmente nos canais fechados dirigidos às crianças. Acredito que uma solução ética para se criar uma campanha dirigida ao público infantil, está nesta citação que ouvi anos atrás: "Pense nos seus filhos. O que for bom para eles será bom para os outros", conclui. (M.R.)