Na semana que passou as redes sociais vieram abaixo com a contratação de Kim Kataguiri como colunista da Folha de S. Paulo. Os governistas odeiam o rapaz de 19 anos por sua liderança nos movimentos pró-impeachment e o protagonismo considerado conservador. Para mim a ascensão de Kim Kataguiri sempre foi a prova de que os brasileiros não se prepararam para o debate, de modo geral nossa população embarca em qualquer engodo com discurso minimamente articulado e isso não é privilégio de Kim, nem de seus seguidores. Minha mãe dizia que "falta tutano" à opinião pública e sou obrigada a concordar tendo em vista o festival de bobagens veiculadas diariamente, sobretudo depois do advento do jornalismo eletrônico que transforma qualquer um em "repórter", ainda que isso signifique segurar uma câmera para produzir um vídeo amador. A precariedade agrada aos "sem tutano".
Para competir com a Folha, o Estadão acaba de anunciar a contratação de outro japonês adolescente: o apresentador, cantor e dançarino Yudi Tamashiro, que acumula prêmios por sua atuação na mídia como uma espécie de herói de videogames, capaz de dominar todos os territórios ou disparar todas as armas. Ernesto Frias, editor-chefe do Estadão, explicou a decisão: "No ramo dos jornais, a competição é constante e nós não podíamos ficar para trás. Queremos mostrar ao pessoal da Folha que também podemos ter nosso próprio japonês adolescente falando bobagens".
A imprensa brasileira, que já foi pensada por intelectuais como Alberto Dines e Fernando Gasparian, que apostavam no "jornalismo cidadão", hoje é pensada por aqueles que conseguem agregar valor midiático instantâneo contratando Kataguiri, Tamashiro ou qualquer um que consiga alavancar "likes" ou mesmo discordância. As críticas pela contratação de Kataguiri pela Folha colocaram o guri mais em evidência do que sua coluna conseguiria por seus próprios méritos. Os detratores padecem de uma limitação insolúvel para compreender que a contestação excessiva transforma em manchete o que seria uma nota.
Vivemos os tempos do "jornalismo facebookeano", uma derrota para aqueles que se prepararam para emitir e formar opinião. Se os meios digitais facilitam o intercâmbio de informações, por outro lado permitem que pessoas transformem o apanhado de sua timeline em notícias, incluindo as distorções, os pensamentos bizarros, as ideias preconceituosas, o protagonismo de quem diz as bobagens que a mídia fácil converte em argumentos. A impressão é que a função crítica se dissolve de forma mágica com o toque na tela, o clique no "like", vivemos o tempo do modismo e da opinião instantânea.
Todos os dias circulam notícias que dariam motivo para milhares de críticas consistentes, da falência da educação ao sistema doente da saúde pública. Sobram manchetes sobre atos ilícitos, impostos a galope, índices de desemprego, mas basta uma personagem midiática fazer a cena da vez em cima do palco - chamando o "papai" às falas – para que o assunto tome a dimensão de um fato muito importante, tornando-se tema de conversas e postagens. É infinita nossa capacidade de aderir à fofoca ou ao papo de salão. Até por isso, personalidades da política aderem também a piadas, frases de defeito, argumentos sem respaldo ou conteúdo. Eles sabem que assim caem nas graças da opinião pública, chamam de humor o que seria apenas falta de repertório ou dissimulação de coisas graves.
Esta semana, Lula também converteu-se em manchete ao proferir uma bobagem que é mais uma demonstração do discurso esvaziado de gente "sem tutano". Ao declarar "não existe viva alma mais honesta do que eu", mostrou toda sua deficiência de argumentos contra a avalanche de denúncias que pesam sobre ele. Num país em que um líder político diz uma bobagem dessas, os Kataguiris podem escrever qualquer coisa. Não será por falta de equivalência em matéria de sandices que as duas bandas ficarão sem seu Bobo da Corte, com o agravante de que se no passado o "bobo" era uma espécie de "portador da verdade", hoje certas figuras públicas o consagram apenas como a representação do que não merece o menor crédito. Que Deus nos livre das bobagens de Lula e de Kataguiri.