Em seu novo livro, “As Lavadeiras”, a escritora londrinense Edra Moraes une literatura e artes plásticas. Criada em parceria com a artista plástica Dani Chineider, a obra não segue o formato tradicional de livro. Trata-se de um livro-caixa que traz 60 postais com poemas e pinturas.

O lançamento acontece nesta terça-feira (9), na Biblioteca Pública de Londrina às 19 horas. O evento também inaugura a exposição “As Lavadeiras” que fica aberta até dia 26 de abril na Biblioteca.

A ideia do surgiu após uma instalação realizada em 2022 no Londrix – Festival Literário de Londrina. Uma exposição que unia poemas de Edra Moares e pinturas de Dani Chineider estampadas em grandes lençóis suspensos que se moviam com o vento.

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Lançado pela editora Atrito Arte, o livro é inspirado na arte postal (ou mail art) que teve grande projeção nas décadas de 1970 e 1980. Uma linguagem que utilizava o cartão-postal como suporte e o correio físico como meio de circulação.

A seguir, Edra Moraes fala sobre a “As Lavadeiras” e de como as poetas precisam falar da condição feminina.

Cartões-postais da artista plástica Dani Chineider juntam-se aos poemas de Edra Moraes numa composição poética e crítica
Cartões-postais da artista plástica Dani Chineider juntam-se aos poemas de Edra Moraes numa composição poética e crítica | Foto: Dani Chineider/ Divulgação

“As Lavadeiras” une literatura, artes plásticas, instalação e arte postal. O que levou você a promover a união de várias linguagens em um único trabalho?

Uni tudo o que gosto. Por algum tempo, eu costumava colecionar cartões-postais, aqueles mais artísticos, não para enviá-los. Além disso, as artes plásticas estão entre as minhas musas preferidas. Para mim, é quase natural visitar exposições em busca de apreciação e inspiração. Durante o período em que estava morando na Holanda, conheci o trabalho de Dani Chineider, que estava promovendo seu novo site focado nas operárias. Fiquei apaixonada pelo trabalho e, em seguida, fiz o convite para colaborarmos. Enviei-lhe os poemas, e ela gostou. A partir daí, ela trabalhou de forma independente, sem qualquer interferência minha.

Numa época em que grande parte da comunicação acontece de forma virtual, via internet, aplicativos e redes sociais, vocês estão lançando um livro em formado de arte postal. Qual o sentido de resgatar essa forma de arte?

Representa um resgate de que podemos, como poetas, ir além do livro. A poesia tem essa característica, não é preciso ler um livro todo para receber a mensagem. E pensando nos dias atuais, aonde a mensagem vem sempre somada a algo visual, acredito que seja um livro mais contemporâneo do que nunca. O projeto foi desenvolvido de forma que a pessoa que adquirir o livro-caixa vai poder enviar cartões e também manter a sua coleção. Este contato mais físico com mensagem precisa ser resgatado. A poesia de receber algo pelo correio é incomparável.

Edra Moraes e Dani Chineider lançam "As Lavadeiras": um livro-caixa com poemas e cartões-postais que tratam da situação da mulher
Edra Moraes e Dani Chineider lançam "As Lavadeiras": um livro-caixa com poemas e cartões-postais que tratam da situação da mulher | Foto: Divulgação

Tanto os poemas quando as imagens de “As Lavandeiras” trazem uma visão de mundo do ponto de vista de mulheres. Trata-se de uma escolha, de uma necessidade, ou de uma urgência?

De uma fatalidade? Como poeta, mulher e vivendo em pleno século 21, não há muito o que falar se não for da condição feminina. As lavadeiras não são mulheres do século passado apenas. Estamos agora neste exato momento, vivendo um mundo hostil e tentando construir nossas vidas através dos nossos ofícios. Vivemos em uma sociedade agressiva ao gênero feminino: apagam nossos feitos, destroem nossas reputações. Na época em que existimos, ainda causa “polêmica” um processo pelo crime de estupro. O processo de um crime não deveria causar controvérsia, deveria ser respeitado. A cada seis horas, uma mulher é assassinada, e a cada oito minutos, uma mulher é estuprada. Não podemos normalizar isto. A ação deve ser social, e a arte também pode ser uma ferramenta de contestação. Como artista contemporânea, não posso falar apenas de flores e amores. Quando na verdade, viver é uma luta pela sobrevivência.

O poema que dá título ao livro, possui versos desconcertantes: “Fortes, corajosas e independentes / Não é de bom tom ressaltar tais qualidades / Uma mulher sem vaidades // Tinham as mãos grossas e pesadas / As mãos dos pobres e suas unheiras / Não servem para acariciar”. Quem são as lavadeiras? O que elas representam?

Acredito que todas nós somos de certa forma. Assim como minha mãe, eu também trabalhei como lavadeira em Belfast, na Irlanda do Norte. Mas trabalhar como operária no Brasil é ainda mais difícil, ficamos expostas a abusos de clientes e patrões. Nos versos desconcertantes que você mencionou, está a realidade de quem é julgada pelo ofício. A feminilidade tão exigida para o gênero, não é natural. Ela se esvai na luta pela sobrevivência. Desde que conheci o trabalho da Dani com as operárias, reconheci que precisávamos sair do feminismo intelectual, aquele que reconhece artistas e estudiosas, e deveríamos falar deste “feminismo cotidiano”, que está na luta diária, sem grandes discursos, um feminismo que se faz na ação. Para mim, o feminismo obrigatoriamente passa pela luta de classes. As operárias são as representantes de uma classe que não agrada, seja pela falta de “feminilidade burguesa” feita de acessórios ou cuidados estéticos caros, ou pelo trabalho bruto. Estamos vivendo tempos difíceis. Estamos falando o óbvio.

SERVIÇO:

“As Lavadeiras”

Autoras – Edra Moraes e Dani Chineider

Editora – Atrito Arte

Fotografias – Yashiro Imazu

Páginas – Livro-caixa com 60 postais

Quanto – R$ 30

Patrocínio – Profice / Copel

...

Lançamento:

Quando – Terça-feira (9), às19h

Onde – Biblioteca Pública de Londrina (Av. Rio de Janeiro, 413)

Exposição:

Quando – De 09 a 26 de abril

Onde – Biblioteca Pública de Londrina

Imagem ilustrativa da imagem Livro aborda o mundo pelas mãos das lavadeiras
| Foto: Dani Chineider/ Divulgação