Uma hora ou outra elas quebram tudo. Ficam insatisfeitas, raivosas, desesperadas e furiosas. Derrubam paredes, destroem portas e janelas. Estilhaçam vidraças, explodem monumentos e totens. Uma hora ou outra as mulheres enlouquecem.
Em seu novo livro, "Mulheres Sob Descontrole", a escritora londrinense Samantha Abreu, satiriza esse momento em que as mulheres enlouquecem para serem elas mesmas. Baixarias, barracos e micos iluminam uma razão que apenas o humor é capaz de apreender.
Lançado pela editora Atrito Arte, a obra traz breves histórias onde personagens femininos escancaram a insanidade que reside em ser uma perfeita mulher de pedestal no mundo contemporâneo. A mulher sem qualquer desalinho aparece como um duende de jardim, típica fantasia de criança.
As personagens de "Mulheres Sob Descontrole" são hilárias ao conseguirem extrair das pequenas tragédias pessoais a vingança do humor. Na galeria de mulheres, há aquelas que enfrentam guerras grandiosas contra a balança sempre fadadas ao fracasso. Há as ciumentas selvagens capazes de cortar a garganta de qualquer bela inimiga. Há as fissuradas em vitrines, viciadas em liquidação e dependentes de ponta de estoque. Há aquelas que se aventuram em apimentar a relação e caem do cavalo. Há as encalhadas que fazem qualquer loucura para amarrar um homem em casa. Há de tudo e outras coisas mais.
Existe algo em comum nas personagens: o descontrole faz parte da própria natureza de cada uma. Mesmo brigando, quebrando tudo, elas sabem que o desequilíbrio, o desespero e a maluquice, fazem parte naturalmente delas. E o humor, bem como a ironia, se revela como unguento restaurador. O velho remédio de rir de si mesmo.
A narrativa "Mulheres Sob Descontrole" é constituída basicamente de diálogos entre mulheres - divertidos, repletos de bobagens, tiradas humoradas ou irônicas. Invariavelmente há a amiga, a comadre, a ouvinte, a colega, a irmã, a confidente, a cúmplice de todos os desequilíbrio e loucuras momentâneas. A figura que faz o contraponto argumentativo. Um contraponto que fatalmente cai por terra em nome da suprema irmandade feminina seja pela Neide, Cleide ou Jucineide.
O livro é fruto do movimento literário na internet cada vez mais comum. Os textos apareceram originalmente em blogs, sites e revistas virtuais, em especial no blog homônimo "Mulheres Sob Descontrole", mantido por Samantha ao logo de uma década. A publicação em formato de livro contou com a lei de incentivo do Promic.
As narrativas não possuem intenção de seriedade ou profundidade, apostam na sátira das crônicas de costumes. Mas é possível encontrar alguns textos que oferecem um passo além, como em "Quanto Mais Mexe, Pior!". Trata-se de um monólogo onde a personagem, com uns quilos a mais, apresenta sua indignação diante das revistas que propagam a boa forma, barriga sarada, pernas torneadas, bunda gostosa e outras coisas mais.
Num surto descontrolado de assassinar comidas e gorduras, percebe que todo o dinheiro que ganha em seu trabalho, não é fruto de sua bunda gostosa, nem por seus peitos empinados, muito menos pela sua barriga de tanquinho. A grana vem toda de seu cérebro, de seu trabalho mental. Os doces, chocolates e sorvetes que consome, igualmente os tratamentos para ser uma mulher magra, são pagos pelo trabalho executado por seu cérebro. E não há uma viva alma (marido, namorado, amante, pretendente, pedreiro, encanador, presidiário, advogado, etc.) capaz de enxergar sua virtude mental, os frutos de seu trabalho intelectual. Seu descontrole passa pela ironia desbocada, que elege como inimigo para a guerra crucial a farsa da mídia que prega a ilusão da boa forma.
Uma hora ou outra elas quebram tudo. Uma hora ou outra elas enlouquecem. Mães queimam sutiãs, filhas colocam silicone, netas engordam, e bisnetas morrem de rir.

Serviço:
"Mulheres Sob Descontrole"
Autor – Samantha Abreu
Editora – Atrito Arte
Páginas – 128
Quanto – R$ 25

(...) - Fala logo o que é dessa vez. - Você vai gostar. Vai gostar. Vamos dividir um namorado? - O quê? Do que você tá falando agora? Meus Deus! - Alzira, me escuta. Há quanto tempo você tá sem namorado? Há quanto tempo está sem um homem? Há quanto tempo... - Faz tempo. Bastante tempo. Temo por mal saber fazer de novo. - Então, tá vendo? Antigamente as mulheres viviam em haréns, usavam seu homem uma vez por mês e ainda eram felizes com suas amigas. É como dizem: antes pouco do que nada. - Sei. E eu e você seriamos as mulheres do harém de quem? - Jura que não vai rir? - Hahahahahaa. - Do Armando. - Hahahahahahaa. Topo! - Assim tão rápido? - É que tenho certeza que ele não oferece perigo. - Por quê? - O cara é gay, Consuelo. - É mesmo? Isso é muito sério, Alzira! Você tem mania de falar essas coisas sem ter certeza. - Eu tenho certeza. Confie em mim. - Hum, vocês já... - Não, ele não conseguiu. Disse que eu tinha muito pouco pelo no corpo. - Pouco pelo? Ele gosta de mulher peluda? - Não, ele gosta de homem peludo. Disse, com lágrimas nos olhos, que tem tesão no Tony Ramos. - Hahahahahaahaha. - Mas se você ainda quiser, a gente para de sofrer com depilação e ainda ganha mais uma amiga. - Uhull, topamos! (Fragmento do conto "Por Um Eunuco Inofensivo", que integra "Mulheres Sob Descontrole" de Samantha Abreu)