A poucos dias do Carnaval de rua, os surdos pararam, a fantasia foi cancelada, burocratizaram o samba até torná-lo inviável em Londrina.

Desde de o começo desta história houve má vontade explícita de algumas alas. Entrevistam a população conservadora, mas não dão o mesmo espaço à juventude. E a juventude de Londrina havia ressuscitado o Carnaval de rua, nos blocos, depois que acabaram com as escolas de samba.

Londrina é uma cidade universitária que não merece um Carnaval nos cercadinhos. Nas grandes e pequenas cidades do Brasil, o Carnaval está no seu lugar de destaque, na avenida, mas aqui começaram a concentrar o povo em espaços que passaram a sofrer uma série de restrições, até o Carnaval de 2024 definhar na UTI da burocracia, das exigências que nunca foram feitas antes. Falam que o samba agora precisa de alvará, uma exigência da esfera pública, das autoridades que controlam a segurança, mas será que o diálogo e um pouco mais de alegria não poderiam ocupar o lugar do estandarte do cancelamento?

Será que eram mesmo necessários 300 banheiros químicos no CSU da Vila Portuguesa e 1000 agentes de segurança privados, fora a segurança pública de praxe? Até ontem o local recebia o espetáculo da Paixão de Cristo para mais de 20 mil pessoas, a Parada LGBT que chegou a reunir 30 mil. Agora, quem não toca tamborim se faz de surdo, eu não!

"Faltou planejamento", dizem. Na verdade sempre falta, no Rio falta, em São Paulo falta, tudo pode melhorar. Mas ninguém vai cancelar o Carnaval de rua em Salvador, Olinda, Recife, por uma razão muito simples: ninguém é besta! Falar para um baiano que não haverá Carnaval seria motivo de revolução. Então espero que Londrina tenha um pouco de samba nas veias e não saia dessa conformada, silenciada, com o rabinho entre pernas.

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Quando cheguei a Londrina, no final dos anos 1970, o Carnaval era de rua. Sambei na rua Sergipe, na avenida Maringá e na Higienópolis. O batuque passava e não havia banheiro químico. As alas passavam sem impedimentos, o trânsito era interrompido e a rua ficava livre para 4, 5, até 10 mil pessoas e ninguém "morreu de Carnaval", mas o Carnaval morreu, quando as escolas de samba deixaram de ser prioridade e foram dispensadas.

Seus últimos ecos ficaram no Autódromo de Londrina, na gestão do prefeito Nedson Micheleti, quando os secretários Bernardo Pellegrini e Luciano Bitencourt, em gestões diferentes, entenderam que ali seria o nosso Sambódromo. E agora tem quem evoque esse Carnaval do Autódromo sem saber que o secretário da Cultura de ontem é o mesmo de hoje. O Carnaval no Autódromo foi planejado, criado, não desceu de um disco-voador. E acho que o local deve ser preparado, antes do samba ser cancelado de novo, com suas arquibancadas, banheiros em ordem, suas linhas de ônibus, seu estacionamento, sua concepção de avenida.

De uns anos para cá , os blocos ressuscitaram o Carnaval de Londrina, a juventude universitária foi a grande passista que abriu alas para a festa de novo. Mas o Carnaval passou para os parques públicos, não deu muito certo, mas há também exageros quando querem transformar o CSU numa reserva ambiental de araque, com um córrego poluído que merece atenção há décadas, não só no Carnaval. Há quem enxergue também ali, só agora, a fauna de "alguns pássaros" como empecilho para a festa popular. Onde moro tem bem-te-vis, já vi até urutau, mas a avenida Paraná não é uma "reserva ambiental." E políticos rancorosos se aproveitam para por as manguinhas de fora, sambando com tantos impedimentos. Há quem tenha o desplante de criar um projeto de lei para pedir o cancelamento das verbas públicas para o Carnaval de rua e as festas populares, como se fosse a dona do dinheiro, ela, não o povo. Estamos vendo só a ponta do iceberg repressivo.

Este ano Londrina deixou o samba morrer, enquanto cidades da região desfilam sem tantas formalidades, sem tanta fantasia de preservação e segurança, que são necessárias dentro de um ponto de vista lógico, mas não podem ser superdimensionadas a ponto de motivar o cancelamento da festa.

Se me pedissem um diagnóstico sobre o cancelamento do Carnaval de rua neste fevereiro, eu diria: o Carnaval de Londrina morreu de burocracia! E também de policatigem.

Diante disso, que o Carnaval de blocos se faça espontaneamente nas ruas, sem tantos ofícios, como acontece em várias cidades do Paraná. Ainda tenho esperança, o Carnaval é anárquico e politiza o corpo para a liberdade.

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streamers and confetti as decoration for party | Foto: iStock