O governo federal deve avançar nos próximos meses com a política nacional de transporte ferroviário de passageiros, uma das prioridades do Ministério dos Transportes desde o ano passado. Em janeiro de 2024, foi encerrada a consulta pública com representantes do setor, da academia, de governos estaduais e municipais e até com governos estrangeiros, que recebeu 246 contribuições. Um decreto deve ser publicado em breve.

A novidade é a possibilidade de implementação de seis trechos dedicados ao transporte de pessoas sobre trilhos, sendo que o único no Paraná é entre Londrina e Maringá. Também estão na lista Pelotas (RS)-Rio Grande (RS); Brasília (DF)-Luziânia (GO); Salvador (BA)-Feira de Santana (BA); Fortaleza (CE)-Sobral (CE) e São Luís (MA)-Itapecuru (MA).

O ministério ressalta que, até o momento, não há definição de quais trajetos podem, de fato, ser implementados. Mas é um avanço na discussão do transporte ferroviário, que pode receber aporte público para viabilizar projetos privados.

Para os londrinenses, a tentativa de criar uma linha até Maringá não é exatamente novidade. O projeto “Trem Pé Vermelho” começou a ser discutido em 2009, recebeu um PMI (Procedimento de Manifestação de Interesse) em 2015, mas, entre altos e baixos, não chegou a sair do papel e foi retirado do PAC (Programa de Aceleração do Crescimento) em 2017, durante o governo Michel Temer (MDB).

ESTUDOS EM ANDAMENTO

Além da iniciativa federal, desde maio de 2023 o “Trem Pé Vermelho” faz parte da carteira de projetos em andamento do programa Paraná Parcerias, vinculado à pasta estadual de Planejamento. Procurada pela reportagem, a secretaria afirmou que o projeto busca melhorar a mobilidade urbana das regiões metropolitanas de Maringá e de Londrina “por meio da criação de uma linha de transporte coletivo, no trajeto de linha férrea, usando como sistema o VLT (Veículo Leve sobre Trilhos)”.

Os trechos previstos para esse estudo abrangem os municípios de Paiçandu até Ibiporã, passando por Maringá e Londrina. Hoje, estão em fase de estudo preliminar o diagnóstico, os investimentos estimados e a modalidade de contratação/parceria mais adequada.

TRANSPORTE SEGURO

Referência na área, o professor e ex-secretário do Transporte, Mário Stamm Jr., acredita que o transporte de passageiros entre Londrina e Maringá é importante para o desenvolvimento econômico e social, além da interação entre os municípios.

“O fato de ser um projeto com participação pública e privada torna tudo isso mais fácil, porque você tem a demanda de transporte, os usuários, as tecnologias - bem mais modernas hoje - e tem também a questão do leito ferroviário, que já é disponível, que hoje é utilizado para o transporte de cargas”, explica Stamm Jr. “Dentro desse novo projeto, algo de bastante relevância deve acontecer, que é a superação do problema ocasionado com as passagens em nível da linha ferroviária nas áreas urbanas.”

Questionado sobre qual é o usuário desse tipo de transporte, o professor aponta que “se tem muita atividade comercial e muita necessidade de transporte”, além de uma demanda educacional de escolas e universidades ao longo do trecho Londrina-Maringá. “O transporte desses usuários é feito hoje via veículo próprio ou ônibus, então com o trem você ganha um modo de transporte exclusivo e seguro”, pontuando que é possível ter linhas expressas e outras com maior número de paradas.

Stamm Jr. aponta que, hoje, os processos de PPP (Parceria Público-Privada) estão mais evoluídos, “o que facilita bastante um projeto desse nível, uma vez que a própria cobrança tarifária vai ser feita em função de critérios a serem adotados no momento da licitação que vai permitir a concessão dos trechos”.

“A viabilidade econômica vai estar condicionada à participação da demanda, do investimento privado e do suporte de todo o organismo público. Todos esses elementos têm que ser combinados para que se tenha uma tarifa atrativa, um tempo de percurso que atraia o usuário e também que a disposição de oferta venha de encontro a isso tudo”, completa.

DESAFIO PARA VIABILIZAR

O presidente da Codel (Instituto de Desenvolvimento de Londrina), Alex Canziani, diz que o projeto, se sair do papel, será uma grande conquista para o Norte do Paraná, alavancando o desenvolvimento da região. Por outro lado, acredita que o principal desafio é conseguir viabilizar a iniciativa. “Eu acho fantástico, excelente se acontecer, mas eu tenho dúvidas com relação à viabilidade econômica. A não ser que o governo faça, mas eu acho que o governo não teria dinheiro para fazer”, avalia.

Para Canziani, o trem de passageiros ligando as regiões seria uma importante medida de integração entre modais - nesta semana, por exemplo, foi anunciada a construção do Terminal Metropolitano de Londrina, que deve contribuir para a melhora do serviço rodoviário.

E uma possibilidade para uso desses trens seria justamente os trabalhadores que atuam nas duas regiões, em indústrias que têm avançado para o interior do Paraná. “E uma parte do turismo, também. Mas acho que, principalmente, são os trabalhadores que utilizariam”, acrescenta.

Essa interação entre rodovia e ferrovia também é considerada fundamental por Stamm Jr. "O trem deve se interconectar com os outros modais de transporte, especialmente o rodoviário", ressaltando a importância de uma "concorrência" entre as modalidades. "Você vai poder aumentar, inclusive, a segurança e o conforto do transporte."

RAMAL FERROVIÁRIO SUSPENSO

Enquanto se discute a possibilidade do transporte de passageiros, a região de Londrina perdeu o ramal ferroviário para transporte de cargas que ia até Ourinhos (SP), que tem a Rumo como concessionária. As atividades foram encerradas no dia 16 de janeiro, sob justificativa de falta de demanda comercial.