A promotora do MPT-PR (Ministério Público do Trabalho do Paraná), Cristiane Maria Sbalqueiro Lopes, classificou a portaria 1.129/2017 - que faz alterações na norma que criou o cadastro de empregadores que submetem indivíduos ao trabalho análogo à escravidão, a chamada "lista suja" - como uma "Lei Áurea às avessas". A escravidão contemporânea pode ser definida atualmente quando há trabalho forçado, servidão por dívida, condições degradantes (trabalho que nega a dignidade humana, colocando em risco a saúde e a vida do trabalhador) ou jornada exaustiva (levar ao trabalhador ao completo esgotamento dado à intensidade da exploração, também colocando em risco sua saúde e vida).

No entanto, a portaria editada segunda-feira (16) aponta que para ser caracterizada a jornada excessiva ou a condição degradante, deve haver a restrição de liberdade do trabalhador. "É um mito achar que a privação da liberdade é inerente ao trabalho escravo. Eu te convido a desprender-se desses filmes da escravidão dos Estados Unidos em que o negro que fugia era vítima de açoite e o convido a se colocar na realidade atual. Até quando a escravidão era permitida, nem por isso ficavam sob a mira constante. Não é assim que funciona", afirmou.

Segundo ela, o que obriga o cidadão a trabalhar e restringe a liberdade de uma pessoa não é apenas o temor de levar uma chibatada, de levar uma bala. "A nova portaria é totalmente dissonante das discussões sobre o trabalho escravo desde que o Brasil é Brasil. Dizer que agora para se caracterizar como trabalho escravo tem que ter alguém vigiando, impedindo alguém de sair, é como jogar fora todo o trabalho que vem sendo realizado", criticou.

"É óbvio que ninguém vai pagar pistoleiro para vigiar o trabalho escravo, porque isso sai caro. O trabalho escravo tem que ser barato para ser interessante. As pessoas interessadas em escravizar utilizam outros ardis para impedir que as pessoas fujam sem ter que pagar feitor", argumentou.

A promotora criticou a exigência para a divulgação da chamada "lista suja", que reúne as empresas e pessoas que usam trabalho escravo, que passará a depender de uma "determinação expressa do ministro do Trabalho". "Essa questão da divulgação da lista suja, o governo vem fazendo corpo mole para publicá-la. Por que a lista suja é tão combatida? Porque quando se coloca o nome de uma pessoa ou de uma empresa na lista suja, indica para as demais corporações podem se afastar deles por não apresentarem uma postura correta. Além disso, quem está na lista suja não recebe financiamento público ou privado por essa citação por trabalho escravo", apontou. Segundo ela, essa é a parte cruel da história, pois empregar em condição indigna custa barato e quem é financiado pelo governo deveria ter a obrigação de tratar bem os empregados. "O MPT conseguiu há um ou dois meses um provimento judicial para atualizar essa lista. Ao dificultar a atualização dessa lista a portaria está exponenciando a precarização do trabalho", alertou.