Pouco depois de completar um ano no patamar mais baixo da história, a taxa básica de juros, a Selic, conta com espaço para novos cortes e precisa cair para contribuir para a ainda duvidosa retomada da economia brasileira. A visão ganha adeptos entre analistas de mercado que enxergam baixo risco inflacionário no País, diante de um quadro grave de desemprego, ociosidade no setor produtivo e endividamento de famílias e empresas.

Por outro lado, boa parte dos economistas ainda veem risco em reduções na taxa diante da pressão de preços administrados, como os de combustíveis, de tarifas de água e energia ou de transporte público. A imprevisibilidade de um cenário internacional, marcado por disputas comerciais dos Estados Unidos com a China e pela crise na Argentina, também explicam a cautela adotada pelo Copom (Comitê de Política Econômica) do BC (Banco Central), na ata da última reunião do grupo. “O Comitê julga importante observar o comportamento da economia brasileira ao longo do tempo, com menor grau de incerteza e livre dos efeitos dos diversos choques a que foi submetida no ano passado”, cita o órgão, no texto.

O problema é que, mesmo com inflação em níveis baixos, o desempenho do País não é animador. As notícias da última semana indicaram o fechamento de 43 mil postos de trabalho formais no Brasil e o mercado financeiro reduziu pela oitava vez a expectativa do crescimento do PIB (Produto Interno Bruto), de 2,0% para 1,7%.

Sinais que, para o fundador e diretor de investimentos da Persevera Asset Management, Guilherme Abbud, indicam que a crise nacional é de balanço, mais demorada e semelhante às que ocorreram desde 2009 nas principais economias do mundo. E não cíclica, que é mais comum e curta. “A recessão de balanço demora mais porque as pessoas e as empresas estão desempregadas, endividadas e vai demorar para que consigam limpar a própria condição”, diz o analista, que na última quinta-feira (25) esteve em Londrina para uma rodada de reuniões com clientes da Fort Investimentos, escritório credenciado da XP Investimentos.

Ele considera que o Brasil está atrasado em relação ao restante do mundo, que enfrenta essa crise há dez anos, porque adiou os efeitos por meio de incentivos ao consumo e a investimentos. Porém, diz que falta, mesmo no BC, a compreensão de que essa crise é de balanço, e não cíclica. “O mercado vai se surpreender com a demora para o País se recuperar da crise e no quanto os juros ficarão baixos”, afirma Abbud.

O diretor de investimentos acredita que, independentemente do andamento da reforma da Previdência, é preciso cortar juros e indica a clientes que a taxa fechará o ano em 5,50%. As estimativas dentro do Boletim Focus, do próprio BC, porém, apontam para a manutenção dos atuais 6,50% até dezembro. “É a primeira vez que a inflação cai no Brasil sem o real sobrevalorizado. Isso diminui também o peso do risco externo sobre a inflação”, cita. “Acreditamos que a inflação não fique muito acima de 3,50% e, com os juros em 6,50%, é uma taxa real ainda alta.”

Inflação pontual

A inflação em 12 meses até março está em 4,58%, segundo o IBGE (Índice Brasileiro de Geografia e Estatística). Para abril, o reajuste de combustíveis e o preço de alimentos impactados por questões climáticas devem fazer com que o indicador fique ainda mais alto. Porém, o consultor econômico da Acil (Associação Comercial e Industrial de Londrina) e colunista da FOLHA, Marcos Rambalducci, afirma que essa alta é pontual. “Acompanhamos a evolução do preço da cesta básica na cidade e a elevação é circunstancial, por problemas climáticos que elevaram o valor dos alimentos. As famílias seguem endividadas e não há risco de inflação por alta da demanda”, diz ele, que é professor da UTFPR (Universidade Tecnológica Federal do Paraná).

O economista complementa que o grau de ociosidade médio na indústria nacional é de 34%, segundo a CNI (Confederação Nacional da Indústria), e de 28% em Londrina, conforme levantamento no Sindimetal-Norte (Sindicato das Indústrias Metalúrgicas, Mecânicas e de Materiais Elétricos do Norte do Paraná). “Mesmo que se elevasse a demanda, não há risco de inflação porque as fábricas estão com capacidade ociosa.”

Rambalducci também aposta em cortes de juros promovidos pelo BC, mas em patamar mais conservador. “Talvez comece a ensaiar uma redução de 0,25 ponto percentual na próxima reunião [7 de maio], reduza na próxima. Mas creio que chegará no máximo a 0,75 p.p. em 12 meses.”

Do outro lado desse debate, o economista Lucas Dezordi, da curitibana Valuup Consultoria, acredita que a preocupação com a inflação ainda persiste. “Ainda não se sabe se vai sair a reforma, que é o que o mercado espera, e há um temor com o câmbio de curto prazo por conta do combustível e de fatores externos”, diz.

Dezordi não acredita em queda neste ano e no próximo para a Selic. “A inflação está em 4,50% e os juros, em 6,50%. Historicamente, é um quadro de juros reais baixos e essa não é a única questão que segura o crescimento do País.”

Imagem ilustrativa da imagem Analistas veem espaço para novos cortes de juros neste ano