Uma piada conta sobre um bêbado que achando uma lâmpada mágica faz aparecer um gênio que diz que pode conceder três desejos. O bêbado se esforça para pensar sobre o que poderia pedir e acaba dizendo que quer uma garrafa de pinga que nunca seque, que sempre lhe proporcione bebida. O gênio magicamente cria tal garrafa e entrega ao bêbado que fica maravilhado e corre logo a testar para ver se é verdade. Vendo que sim, que a garrafa não ficava vazia, dá gritos de euforia e o gênio diz que ainda há mais dois desejos a ser concedido. O bêbado nem pensa mais nada e diz que quer mais duas daquela garrafa mágica.

Um dos problemas do compulsivo é que ele não consegue ‘pensar’, só quer apenas satisfazer a sua compulsão. Repete-se, sem cessar, procurando uma gratificação que na verdade nunca ocorre. Isso pode se dar com álcool, com drogas, com compras, com sexo e de muitas outras formas. Não se sai de uma repetição que aos poucos vai criando cada vez mais desespero.

Sair de um estado de compulsão não é fácil e demanda muito trabalho interno. Não é à toa que é tão difícil a recuperação de drogados, por exemplo. Para uma verdadeira recuperação requer que a pessoa em questão se envolva e se comprometa com a própria recuperação e que tenha tolerância para altas doses de frustração durante todo esse processo. Mesmo uma pessoa recuperada não significa que ela está imune, que não vá ter recaídas, mas a obriga a manter constante atenção para consigo mesma para o resto da vida.

A compulsão gera, inicialmente, muito prazer e por isso mesmo é altamente viciante. Achar que se pode viver a vida, que nos dá tantos dissabores e decepções, de maneira que apenas prepondere o prazer é algo muito sedutor. Freud criou os conceitos de princípio do prazer e princípio da realidade que são de extrema importância para a psicanálise e nos permite entender muito sobre como nossa mente funciona e nos afeta.

Queremos buscar e sentir prazer acima de tudo e repelir qualquer coisa que nos traga desprazer. Isso é o que basicamente consiste no princípio do prazer e que predomina numa mente mais primitiva e menos trabalhada. No entanto, viver assim, só em prol do prazer, impediria que nos desenvolvêssemos. A própria civilização correria riscos e nada poderia ser construído e mantido. Construir, estudar e manter exige tolerar frustrações e adiar o prazer que é tudo o que o princípio do prazer não suporta.

Já o princípio da realidade implica em renunciar a alguns prazeres para que possamos nos adaptar à realidade e a construir algo nela. Isso exige esforço e se esforçar é sempre desprazeroso. Depois, a consequência desse esforço¨pode até se revelar prazerosa, mas leva tempo e não é imediato. Por isso que vencer uma compulsão não é fácil e demanda trabalho. No entanto, há pessoas que aprendem a lidar com suas compulsões de maneira favorável e vivem uma vida muito realizada.

O bêbado da piada não conseguia pensar além de uma satisfação imediata e por isso mesmo a oportunidade de outros desejos foi desperdiçada. É assim que muitos compulsivos acabam vivendo: desperdiçam qualquer oportunidade e chances que têm porque não conseguem enxergar além.

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