Chega o fim do ano e a grande maioria das pessoas ficam cheias de planos para o ano novo que está prestes a se iniciar. Teoricamente fazem planos muito promissores e cheios de coisas boas, mas é aí que podemos encontrar a divisão que existe entre o que as pessoas dizem e o que as pessoas de fato vivem. Falar é fácil. O verbo, o nosso discurso, pode sair como bem entendemos, mas como vivemos, como nos colocamos frente à vida é que faz toda diferença.

Num outro texto recente falei sobre como ‘olhamos’ a vida e que a qualidade desse olhar está intrinsicamente ligada ao nosso funcionamento mental. Não adianta falar algo diferente do que realmente ‘somos’. Por isso é tão comum que os planos de ano novo fiquem somente como planos de ano novo, sem maiores desdobramentos. As palavras que são proferidas são de uma natureza, mas a pessoa que vai para o ano novo é a mesma de antes.

Geralmente, as pessoas esperam que a passagem de um ano para o outro seja tal qual uma mágica que façam alguma coisa por elas. Como se do dia 31 de dezembro para o dia primeiro de janeiro algo de fora ocorresse e transformassem suas vidas, sumissem com todos os seus problemas e agruras e desaparecessem com seus sofrimentos e dores. Quando esperamos isso funcionamos como crianças que aguardam um poder maior mudar as suas vidas. É o mesmo que uma pequena criança esperando o Papai Noel entregar o presente. Contudo, uma criança acreditar nisso está tudo bem, faz parte do processo de crescimento, mas um adulto esperar por essa mágica é algo sério.

Não há passagem de ano que seja mágica e que suspenda todas as nossas angústias e percalços até porque não são as coisas ao nosso redor que, necessariamente, precisam mudar, mas nós mesmos, a maneira que nós funcionamos. A mudança ou transformação precisa ocorrer dentro de nós e não fora. Se não for assim a pessoa que entra no ano novo é a mesma, com os mesmos funcionamentos e vícios que vão levar aos mesmos cenários e situações. Se a pessoa não passa por mudanças reais vai viver os mesmos contextos de antes.

Isso é muito comum ocorrer quando os pacientes procuram por uma análise ou psicoterapia. Muitos esperam que o profissional mude o contexto de suas vidas sem que elas mesmas tenham que fazer nada. Querem uma mágica que venha de fora, sem entender que o que geralmente causa sua dor e sofrimento foram ‘criados’ por elas mesmas e que se não houver uma real mudança na forma como vivem e em como se colocam diante da vida, vão acabar repetindo as situações de sempre.

Entretanto, não é fácil mudar e muito menos rápido. Mudar implica em abandonar muitos hábitos arraigados e aprender a pensar diferente e isso precisa de tempo. Não basta apenas “pensar fora da caixa” como pregam muitos por aí como se fosse simples assim, mas demanda paciência e muito respeito para com esse processo. Por isso que a análise leva tempo e não existe algo como fast-análise. Para crescermos devidamente não é algo que se dá de um dia para outro como na passagem do ano, mas um compromisso que se assume para no decorrer da vida irmos aprendendo a lidar cada vez mais conosco mesmo. Esse compromisso consigo, é sim, um plano que vale a pena

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