DÉJÀ VU
‘‘Desfilar para o Brasil é uma maneira de divulgar a moda lá fora, já que a imprensa internacional se volta para a SPFW’’, disse uma modesta Gisele Bündchen, na rápida entrevista que concedeu a um grupo de cerca de 400 jornalistas antes de desfilar para a Colcci, no penúltimo dia do evento, anteontem. A top, que há quatro anos não desfilava no evento, disse que sempre sente um ‘‘friozinho’’ na barriga ao subir na passarela. Ela atribuiu à ‘‘qualidade da marca’’ o faturamento dez vezes maior que a Colcci apresentou desde que escolheu a modelo para representar a marca. Em contrapartida, a Colcci fez um dos piores desfiles da semana de moda, apresentando tecidos camuflados e manchados tipo tie-dye, num efeito déjà vu. Em tempo: os fotógrafos fizeram o registro da entrevista de Gisele a uma ‘‘segura’’ distância de 15 metros. Já os jornalistas ficaram um pouco mais próximos, mas separados da top por um tablado

OLHA O BABADO
Para quem (ainda) pensa que moda é firula, é bom conferir as referências que os estilistas usam para criar as suas coleções. Alexandre Herchovitch, um dos mais conceituados estilistas brasileiros, foi buscar inspiração na guerra e na paz para o Verão 2009. A primeira foi levada à passarela com a coleção masculina, inspiradas nos países em conflito. Para falar da paz, o estilista desenvolveu uma coleção feminina com referências militares, sem perder a leveza e feminilidade. Babados como o deste vestido da foto aparecem em quase todas as peças desenvolvidas por Herchovitch para as mulheres. Aliás, preste atenção nestes detalhes. Eles vêm com tudo na próxima estação

Termômetro
É claro que a temperatura na platéia subiu quando o modelo Paulo Zulu entrou na passarela para a Rosa Chá. Mas o clima ficou quente mesmo já no início do desfile, quando o modelo Rodrigo Rothen entrou calmamente (e solitário) na sala montada para o evento, tirou a sunga e tomou um banho no chuveiro cenográfico. Não foi a única vez nessa edição da SPFW que a falta de roupa empolga mais do que as novas coleções. A Neon também colocou modelos com os seios de fora para desfilar na passarela.

Previsão
O maquiador e radialista Max Fivelinha, presença constante na platéia da SPFW conta uma história interessante sobre a top Gisele Bündchen. Ele lembra que em 2000, enquanto maquiava a top e ela reclamava que tinha que, novamente, pedir dinheiro ao pai para continuar na lida de modelo, ele falou: ‘‘Te dou um ano e meio para você estourar’’. Menos de dois anos depois, ela já era destaque internacional. ‘‘Mas não precisava ser vidente para ver isso. Ela mudou o jeito de desfilar. É um ícone. Só acho que ela precisa ler um livro inteiro de vez em quando para melhorar’’, cutuca o ex-VJ da MTV. Experiente no ramo, ele agora tem uma outra aposta para a nova temporada: a paranaense Viviane Orth, que se destaca na SPFW e está, aos poucos, consolidando a carreira internacional. Viviane esteve na passarela para quase todas as marcas dessa edição da semana de moda.

Performance
Os desfiles que mais se destacaram na SPFW são aqueles cujas grifes apostam numa concepção cênica mais apurada para mostrar suas novas coleções. O que salienta que a moda se aproxima cada vez mais do espetáculo com múltiplas linguagens artísticas. Para a consultora de moda Constanza Pascolato, que falou com exclusividade à coluna sobre essa característica, essa integração está sendo bem aproveitada nessa edição do evento. ‘‘E isso não só valoriza as peças como estabelece uma linguagem para a marca’’, salienta a empresária, considerada uma das mulheres mais elegantes do Brasil.

Performance 2
Algumas das marcas que transformaram os desfiles num espetáculo de multilinguagem: a Ellus colocou um aquário gigante na passarela, com modelos nadando de calças jeans e vestidos. A Cavalera hipnotizou o público com moças levitando ao fundo da passarela ao som de uma música que dizia ‘‘Express your soul’’ (expresse sua alma), além de máscaras de bichos nas modelos, e Oestúdio, que utilizou uma banda de Wii (com instrumentos musicais virtuais) e mudou o espaço convencional da platéia para mostrar a coleção intitulada ‘‘Try and Error’’.
Balanço
A coluna acompanhou a maioria dos desfiles da São Paulo Fashion Week. Um resumo do que se viu nas passarelas e que logo vai estar nas ruas: as cores dourado, preto, branco, verde e azul-turquesa imperam. Rendas e babados (daqueles tipo ‘‘calcinha repolho’’, lembra?) em peças inteiras, jogos de estampas diferenciadas, botas cowboy coloridas e nos cabelos, tranças e os antigos e indispensáveis grampinhos.
Na platéia
  O estilista Jum Nakao está nos bastidores da SPFW, mas não apresenta nenhuma nova coleção na semana de moda. Ele escolheu alguns desfiles para acompanhar, como o do Oestúdio, que assistiu da Fila A e aplaudiu o resultado. Depois que acabar o evento, ele vai se voltar para um editorial que está preparando para uma revista internacional cujo nome ele ainda mantém segredo, mas adianta a inspiração: um vestido de papel feito com a própria revista. O estilista também deve receber, ainda este mês, a planta do espaço que terá na Bienal da Itália. ‘‘Só depois de definir o espaço vou decidir o material que vou usar’’, disse à coluna.

Moda
Com tantos looks desfilando na passarela, para todos os gostos e assinaturas, é hora de dar uma olhada no guarda-roupa para ver o que está na hora de jogar fora ou substituir. A atriz Débora Bloch, que conferiu o desfile de Moda Praia Blue Man é categórica nas suas opções, independente do que os estilistas apresentam em cada temporada: ‘‘Mas se tem uma coisa que eu não usaria nunca é a miniblusa. Jamais teria essa peça’’, brinca. Débora acaba de filmar ‘‘À Deriva’’, de Heitor Dhalia, com o francês Vincent Cassel no elenco. Também se prepara para o retorno da temporada do espetáculo ‘‘Brincando em cima daquilo’’, dirigido por Otávio Mueller.

EVOLUÇÃO
Quando o assunto é Jefferson Kulig, a palavra para defini-lo é quase unânime na SPFW: ‘‘evolução’’. A crítica especializada não se cansa em dizer que o estilista curitibano está evoluindo e crescendo na moda. Nesta edição do evento, ele apresentou roupas confeccionadas com tecidos próprios, desenvolvidos com tecnologia orgânica. Mas o que mais chamou atenção foram os chapéus gigantescos, com proteção UV, que as modelos desfilaram. Kulig promete colocar uma versão menor da peça nas lojas, mas já avisa que nem tudo o que leva à passarela pode ser comercializado. ‘‘Tem muito coisa que uso só como efeito. Se fosse comercial só pelo comercial, não precisava ter desfile’’, diz, categórico. O estilista, que atendeu a coluna no backstage, disse estar atualmente mais voltado para o desafio. ‘‘Para um criador, a transformação é inevitável. Ser criador é estar constantemente insatisfeito’’

DENTRO DO MAR TEM RIO
Vestidos e estampas inspiradas no Rio São Francisco foram a temática do desfile do estilista Ronaldo Fraga, um dos mais aplaudidos e belos da 24ªEdição da SPFW. Ele conversou com a coluna e disse que a idéia para o trabalho surgiu a partir da leitura do livro ‘‘Paixões Alegres’’, de José Antônio de Souza. A coleção foi desenvolvida em quatro meses, concomitante a muita pesquisa e trabalho. Para desenvolver os bordados, por exemplo, Fraga buscou a parceria da família Dumont, uma família de bordadeiras que fazem um trabalho incrível de criação e utilizam o bordado como artes plásticas. As modelos desfilaram as peças em uma passarela repleta de bacias de alumínio cheias de sal grosso, simbolizando a invasão do mar no Velho São Francisco.