Martírio atropelado
Ficou evidente nos últimos acontecimentos que o senador Renan Calheiros encarnava, de forma inquestionável, a classe política pela qual se mostrava disposto ao martírio, tal o seu engajamento na causa. E, é claro, que qualquer ato, partido do Judiciário ou do Ministério Público que o atingisse, como de fato acabou acontecendo, acentuaria a medida de heroísmo e de resistente, um Guevara disposto a tudo em defesa dos políticos, fauna hoje alvo dos ódios da população e também do ceticismo reinante em torno da corporação.
A liminar que o afastou da presidência do Senado, sem atingir o seu mandato, criou um cipoal nada desprezível de dificuldades para emplacar as medidas de austeridade impostas pelo teto dos gastos e incursões nas áreas trabalhista e previdenciária, cujo detalhamento veio à luz na manhã de ontem . Evidente que a queda, ainda que provisória, de Renan, se soma ao capital de sua trajetória de guerrilheiro da causa no choque entre Legislativo e Judiciário. O PT, visado e autodeclarado como vítima maior da Lava Jato, está em posição militante ao lado do presidente na cruzada de conter o Judiciário e sua substituição pelo petista Jorge Viana, vice da Câmara Alta, agravaria as dificuldades do governo na tramitação do pretendido, mormente no teto dos gastos, fator de mobilizações do que resta de esquerda em todo o país.
Quanto maior a exposição de Renan Calheiros e o peso dos ônus acumulados assume a imagem de um santo guerreiro, um São Sebastião de corpo flechado e sangrando, que depura a de cangaceiro, como é visto pelos adversários mais radicais. Para os políticos, ele é a pessoa que assumiu na luta desigual com a força popular hoje do Judiciário (não se sabe até quando ela persistirá) o lado mais impopular e de coragem, de sofrimento e expiação antes do momento pior que virá com a lista da Odebrecht na qual quase todos se sairão mal.
Há nesse episódio uma divisão, ainda restrita, no colegiado do STF (obteve três votos no primeiro questionamento quando se tornou réu contra a maioria de oito e contou com o pedido de vista do ministro Dias Toffoli para que ficasse impedido de figurar na linha sucessória presidencial, decisão que contava com maioria de seis) e o empenho agora será para tentar reverter a liminar concedida, no que Michel Temer tem interesse para garantir a tramitação normal do pacote de austeridade que correria riscos com o comando do Senado por um petista ostensivamente em posição adversa.
A Mesa do Senado reagiu e Renan permanece (mais provisório do que nunca) na presidência enquanto o colegiado do STF não ratifica a liminar de Marco Aurélio. Quase, outra vez, uma crise institucional. Claro que se consolida na figura do senador o maior resistente à Lava Jato e a maior expressão da classe política encurralada. Ao menos põe a cara pra bater.

Bombas
No Rio, as bombas de efeito moral da PM atacaram manifestantes que protestavam contra as medidas do ajuste fiscal, aqui em Curitiba tivemos uma bomba fajuta, tecnicamente chamada de "simulacro", colocada ao lado do edifício do Tribunal de Justiça e que mobilizou, durante boa parte da manhã, o esquadrão especializado da PM e determinou o bloqueio de quadras no Juvevê durante várias horas até a falseta ficar clareada.

Demissão
Tribunal Regional do Trabalho tomou posição contra a hipótese de demissão em massa nessa transição entre HSBC-Bradesco que revela problemas de adaptação por falta de treinamento adequado dos bancários. A medida acalmou em parte a categoria que já se valeu da greve para exibir a anomalia que gerava ansiedade nos trabalhadores, temendo a dispensa por essa inadaptação pela qual acreditam não ter culpa.

Combustíveis
Quando a Petrobras baixou, por duas vezes, os preços dos combustíveis que acabaram não chegando na bomba, houve entusiasmo seguido de decepção e, agora, com o aumento de 8,1% na gasolina e de 9,5% no diesel a bronca do consumidor se espalhou. Se o repasse às bombas for integral, calcula-se uma alta de R$ 0,17 no diesel e de R$ 0,12 na gasolina por litro. O sindicato da área, como sempre, não sabe calcular o impacto.

Cesta
De outubro para novembro, queda de 2% na cesta básica, mas o acumulado do ano atinge 7,55% de alta perto do índice inflacionário. A queda de R$ 11 é oscilação mínima. Está difícil a ocorrência de indicadores favoráveis, fator prejudicial ao governo e seu suposto intento de fazer a travessia para o desenvolvimento.

Folclore
Em Curitiba, há o hábito de "quebrar´´ as pessoas na rua chamando-as pelas últimas sílabas ou gritando o nome. Já teve paranaense quebrado em Nova York e Paris e que ignora quem o tenha chamado. Certa vez, veio a Curitiba o ex-primeiro ministro de Portugal Marcelo Caetano derrubado com a revolução dos cravos. Parou na porta do Braz Hotel e, de um lado da Boca Maldita, chamaram Marcelo e de outro Caetano e o homem ficou meio tonto ao tentar saber quem o chamara e de onde partira a invocação, uma cena chapliniana.