Operação Carne Fraca: comunicação adequada?

Fica uma lição para que a condução do agronegócio seja cada vez mais técnica, sem interferências políticas



A maneira como foi divulgada a Operação Carne Fraca, que ocupou as manchetes dos principais veículos de comunicação e mídias sociais, do Brasil e de outros países, desde 17 de março, sexta-feira, foi apropriada? Quais serão as consequências para os consumidores, produtores, o agro e para a economia do Brasil?

As investigações, durante dois anos, de irregularidades na produção, processamento e comercialização de carnes no Brasil devem ser enaltecidas e apoiadas. Assim como não se pode admitir que fiscais e agentes sanitários do Ministério da Agricultura tenham recebido propina para liberar licenças sem realizar fiscalização adequada nos frigoríficos. É inaceitável que tenham colocado à disposição dos consumidores, brasileiros ou de países importadores, carnes e embutidos fora do padrão de segurança e qualidade (adulterada, estragada, "maquiada", contaminada, vencida), independente da quantidade e frequência.

O problema deve ser muito bem esclarecido, deixando claro para todos sua dimensão e o risco de causar doenças nos consumidores. O caso deve ser apurado com todo rigor e rapidez e os culpados devem ser severamente punidos. Estas ações devem ter total transparência. As informações preliminares são que, de 4.837 unidades frigoríficas fiscalizadas, 21 (menos que 0,5%) apresentaram irregularidades e três foram interditadas. Que de 11 mil fiscais e agentes sanitários do Ministério da Agricultura, 33 (menos que 0,3%) foram afastados. E que não existe risco sanitário de consumir carnes brasileiras.

Entretanto, os procedimentos para divulgação da operação, sem esclarecimentos técnicos que poderiam ter sido fornecidos pelo Ministério da Agricultura, podem ter causado sérios problemas para a economia brasileira. A imagem e a reputação dos alimentos produzidos no Brasil podem ser seriamente prejudicadas. E isto pode afetar todo o agro Brasil e a nossa economia, que vem tentando superar a maior recessão de nossa história. O agro foi o principal responsável pela crise não ter sido ainda maior e é o setor que mais poderá contribuir para a retomada do crescimento, aumentando a renda, exportações, geração de empregos.

O Brasil depende do agro para proporcionar melhor qualidade de vida a sua população. O agro está presente na vida das pessoas! O mundo vê o Brasil como um grande produtor agrícola, o país que mais vai contribuir para atender à demanda de alimentos nos próximos 20, 30 anos. Mas o mundo exige, além de quantidade, qualidade!

A divulgação dos problemas nas carnes brasileiras, sem uma clara demonstração de que se tratava de casos pontuais, está sendo generalizada. Consumidores brasileiros começam a questionar se o consumo de carnes disponibilizadas em nosso mercado pode causar doença. Representantes dos países importadores exigem reuniões urgentes com o governo brasileiro para obterem informações mais claras e avaliarem as ações que pretendem tomar.

Fica uma lição para que a condução do agro seja cada vez mais técnica, sem interferências políticas. E que a corrupção que assola o Brasil não ganhe espaço no setor que vem dando tanto orgulho ao povo brasileiro: o agro! Nossa vocação, a atividade na qual temos recursos naturais, tecnologia apropriada e claras vantagens competitivas.

JOSÉ OTAVIO MENTEN é diretor financeiro do Conselho Científico Agro Sustentável (CCAS), vice-presidente da Associação Brasileira de Educação Agrícola Superior (Abeas) e professor associado da ESALQ/USP


A lista de Janot e a esperança do povo

O tema dominante da política nacional, esta semana, não é desenvolvimento, reformas ou as futuras eleições. Brasília está apreensiva com a lista de 80 denúncias que o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, deve apresentar ao Supremo Tribunal Federal como decorrência das delações dos executivos da Odebrecht na Operação Lava Jato.

Estima-se que 200 políticos, entre os quais quadros importantes dos partidos no Congresso Nacional e pelo menos dois ministros, estejam entre os denunciados. A corte política está inquieta e deverá assim continuar até que o relator, ministro Edson Fachin, decida se mantém ou retira o sigilo dos feitos e, principalmente, se aceita os argumentos do Ministério Público para processar os envolvidos. O presidente Michel Temer disse que ministro que se tornar réu tem de deixar o governo.

Tanto Temer quanto os seus aliados e articuladores parecem não saber que mensagem utilizar para conter a possível debandada dos denunciados, cujos votos são necessários para aprovar os projetos de interesse do governo. Acossados pela justiça, os parlamentares poderão pensar mais na própria proteção do que nos interesses do Palácio do Planalto. O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (PMDB-RJ) já desistiu de colocar em pauta o polêmico projeto da terceirização no trabalho, que seria votado esta semana. Também pode ocorrer atraso na tramitação da reforma da previdência. É preciso compreender que quem tem contas a ajustar com a justiça deve fazê-lo e que isso não pode nem deve interferir no governo e nas suas relações com o parlamento.

O quadro de instabilidade é apenas o efeito dos maus hábitos da classe política nacional. As delações referem-se basicamente à destinação de recursos obtidos através do superfaturamento de obras governamentais, cujos adicionais são destinados ao custeio das campanhas eleitorais. Demonstram que praticamente toda a classe tem sua legitimidade sob suspeição pela forma fraudulenta com que eram pagas as despesas de campanha. Eleitos com doações de grandes corporações que trabalham para o governo, todos ficam sem a necessária independência para legislar e, principalmente, para contrariar os interesses desses capitalistas que, obviamente, não são os mesmos do povo brasileiro.

Nesse quadro, o melhor a fazer é começar as reformas pela política, para extirpar o mal que compromete a representatividade da classe. Paralelamente, a conveniência maior é que o governo adote medidas para aquecer o mercado e trazer de volta pelo menos parte dos milhares de empregos perdidos nos últimos anos de política econômica desastrosa. Se conseguir avançar nessas duas frentes, o Brasil estará salvo e as demais reformas virão como imperativo do momento e da sociedade. A "lista de Janot", desde que bem compreendida, poderá ser apenas o limão que, isoladamente é azedo, mas pode se transformar numa saborosa e benfazeja limonada dentro de um Brasil novo, sem corrupção, acreditado pelos investidores, com pleno emprego e servido por políticos acima de qualquer suspeita...

TENENTE DIRCEU CARDOSO GONÇALVES É dirigente da ASPOMIL


Bloco k: como ajustar os processos fabris e os estoques



Transportar para o papel a posição dos estoques das empresas ou apontar nos registros dos arquivos magnéticos as quantidades de mercadorias estocadas nos estabelecimentos não é uma tarefa fácil.

As variáveis que compõem os processos representados pelas anotações e pelos registros das movimentações de entradas e saídas do estoque nas suas várias fases são proporcionais à complexidade de cada conjunto de processos dentro de um estabelecimento, em especial os industriais.

Para todas as empresas de manufatura, foco do "Bloco K" (Livro de Registro de Controle da Produção e do Estoque), os principais processos críticos que devem ser revistos são os da produção dos produtos acabados e do consumo das matérias primas, insumos e materiais de embalagem.

Indústrias do setor químico, por exemplo, possuem variáveis que afetam o resultado de sua produção real e diferenciam a aplicação do seu padrão de consumo estabelecido pelo planejamento. A obsolescência dos equipamentos fabris é uma causa de distorção entre o que realmente foi produzido ou consumido em relação aos registros da produção e do consumo.
Portanto, a revisão da forma de registro dos processos industriais é necessária e, se for o caso, alterações e adaptações deverão ser feitas na documentação que leva o quanto produziu e o quanto foi consumido para a informação refletir o que, de fato, foi produzido e qual o real estoque.

Antecipando este ajuste o empresário terá maior confiança no resultado a ser demonstrado ao Fisco, pois até o momento atual as informações de movimentações internas provocadas pela produção e respectivos consumo dos componentes ficavam restritas ao ambiente empresarial e somente eram expostos no momento da fiscalização.

Os ajustes nos controles nas quantidades produzidas ou consumidas são, na maioria das vezes, consideradas normais na visão dos controladores dada as características dos produtos produzidos. Para a fiscalização, entretanto, não são normais porque todo o processo é analisado na frieza dos números informados nos arquivos magnéticos que estão sob análise.

Portanto, adiantar o tratamento a ser dado nas divergências que serão certamente encontradas nos saldos dos estoques é mais que uma necessidade, ou melhor, é obrigatório. E o empresário deve aproveitar o tempo maior dado pela legislação com a prorrogação gradativa da entrega do Bloco k.

As empresas podem antecipar as entregas do Bloco K nos arquivos magnéticos da EFD-ICMS/IPI desde já. Porém, ficarão submetidas à fiscalização normal e as evidências e inconsistências apresentadas poderão ser levadas como falta de documentos fiscais e acarretar autuações. O desafio é revisar os processos de controles e registros para se chegar às quantidades em estoque exatamente de acordo com o inventariado (ou com a fotografia das mercadorias estocadas).

Vários testes deverão ser realizados e em vários cenários para reduzir ao máximo os questionamentos que virão a partir do momento em que a fiscalização receber as informações. Utilizar esse tempo para ajustar o processo utilizando o suporte de especialistas reduzirá, e muito, a correria na entrega deste complexo que vem pela frente.

EDMIR TELES é gerente de consultoria

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