Passei uns dias com mais três amigos na belíssima região do Parque Estadual do Guartelá, nos Campos Gerais do Paraná. Decidimos acampar longe de lugares muito habitados, para que pudéssemos curtir plenamente a natureza. Montamos o acampamento num sítio rodeado de alguns capões de mata nativa, que o proprietário faz questão de preservar, duas léguas adiante do lugar onde o rio Iapó deságua no Tibagi.

Foi no entardecer que o bicho apareceu. Naquela hora em que o dia se rende à noite, surge o arrebol e logo começa a escurecer. De repente vimos um animal selvagem próximo da barraca, provavelmente atraído pelo cheiro de frutas ou da comida que estávamos preparando. Sentados no chão, ninguém ousava abrir a boca; creio que alguns nem respiravam para não atrapalhar o inusitado encontro.

Ficamos bem quietos para não espantá-lo e tentar identificar a espécie, pois naquele lusco-fusco era difícil se fazer corretamente a observação. Ao tentar virar o corpo e rastejar para pegar a máquina fotográfica derrubei o garrafão térmico que estava em cima de uma banqueta. Foi barulho suficiente para que o animal virasse a cabeça em nossa direção e, precavido, pegasse rapidamente o caminho do mato, dando uma última expiada antes de desaparecer.

Imagem ilustrativa da imagem Que bicho é esse?



Após muitos xingamentos à minha família, vieram as perguntas: seria um lobo-guará? Um guaxinim? Ou quati? Deixei por conta dos amigos tal definição já que dois deles eram biólogos, mas como não havíamos conseguido ver com nitidez o bicho ficamos calados, matutando. Aquele silêncio me deixou constrangido. Não resisti e disse que era um graxaim! Falei que devido ao porte, cor da pelagem, tamanho da cauda e das orelhas, pra mim parecia ser um graxaim, também conhecido como raposa dos pampas. Ninguém contestou. Vibrei em silêncio.

Mesmo com pouco conhecimento sobre animais silvestres, eu havia conseguido colocar dúvidas entre eles, pois ficaram até a hora da janta discutindo sobre a questão. De vez em quando se indagavam: mas seria mesmo um graxaim? Percebendo que estava me dando bem, aproveitei para perguntar quais eram os animais típicos da fauna paranaense. Disso eles sabiam muito; à luz das estrelas, fizeram uma lista num pedaço de papel: papagaio-de-cara-roxa, guará, quati, jaguatirica, gralha-azul, queixada, guaxinim, mico-leão-de-cara-preta, lobo-guará, graxaim, bugio, boto-cinza.

Ficamos até perto de meia noite conversando sobre essas e outras espécies, mas quando eles começaram a falar dos animais em risco de extinção, dando detalhes das ameaças ao habitat, comportamento, reprodução e alimentação, eu já tinha me enfiado no saco de dormir e sonhava com os bichos do Paraná. Na manhã seguinte meus amigos nem quiseram tomar café e, bem cedo, entraram na mata atrás de pistas do graxaim.

Gerson Antonio Melatti, leitor da FOLHA