Imagem ilustrativa da imagem AOS DOMINGOS PELLEGRINI
| Foto: Schutterstock



Estrelas
Porque tem tanta estrela, pai? – o menino pergunta e o pai fica coçando o queixo.
- Você não sabe, né, pai?
- Sei. Tem tanta estrela porque Deus criou.
- E porque Deus criou tanta estrela, pai?
O pai coça o queixo.
- Tem de perguntar pra Deus.
- E Deus responde?
O pai só coça o queixo, o menino fala olhando as estrelas:
- A mãe diz que eu tenho de cuidar das minhas coisas. Tudo que é meu, eu tenho de cuidar.
O pai balança a cabeça admirado, ora, quem diria:
- Tem uma coisa crescendo na tua cabeça, sabia? É, uma coisa chamada juízo!
Mas o menino mal ouve, apontando o céu:
- E tem estrela cadente porque Deus não cuida?
O pai abre a boca para falar, fecha, enfim suspirando fundo. O menino então suspira fundo também, e é um homenzinho quem fala:
- Também é muita estrela pra cuidar, né. Quantas estrelas o céu tem, pai?
O pai solta um assobiozinho, ih:
- Tem mais de mil trilhões de quinquilhões de estrelas, é um número infinito, um número que nunca acaba, porque o mundo das estrelas também não tem fim.
O menino fica coçando o queixo até se perguntar:
- Mas quem foi até lá pra saber que não tem fim?
O pai volta a suspirar e só. O homenzinho cruza os braços encarando o céu onde vai subindo a lua.
- Pra que existe lua, pai?
- Deixa a lua pra outro dia.
- Então hoje eu vou contar as estrelas.
O pai até engasga antes de falar:
- Como vai contar as estrelas, guri, se só sabe contar até cem?
O menino faz voz segredante:
- Aprendi ontem, pai: cada cem, eu abro um dedo... – abre os cinco dedos - Então cada mão vai ter quinhentas estrelas!
O pai faz cara de espanto com a boca em ó.
- E tem a outra mão, pai, mais quinhentas!
O pai fala pertinho e piscando:
- Quinhentas mais quinhentas, mil! Aí você faz um risquinho de caneta num dedo... Depois conta mais mil, outro risquinho noutro dedo, e vai contando até...
O pai abre os braços:
- Até ter dez mil estrelas nas mãos!
O menino olha as mãos, depois volta a olhar o céu e começa a contar em voz alta: uma, duas, três, quatro... Em cinquenta, a voz baixa, mas volta a subir em noventa, chega a cem quase gritando, o pai aplaude, o menino estica um dedo. Primeiras cem, fala alto, e continua a contar: um, dois, três...
Quando a mãe chega, fala oi, amor, como ele está?
- Está dormindo com mais de mil estrelas!

Imagem ilustrativa da imagem AOS DOMINGOS PELLEGRINI
| Foto: Dalva Vidotte/ Divulgação



Notícia da Chácara

MIRRA PARA QUÊ?
Que florada do pé de mirra! Mas você perguntará qual a importância da mirra, se até já foi, junto com ouro e incenso, um dos presentes dos reis magos ao menino na manjedoura.
Naquele tempo, com a mirra se curava ou prevenia infecções, talvez até no corte do cordão umbilical. Os egípcios usavam em rituais religiosos e na mumificação, e até na Idade Média ainda seria usada para odorizar funerais e cremações. Sua fumacinha cheirosa conviveu ecumênica com o incenso em missas e na umbanda.
Mas aqui entre nós, na chácara a mirra serve só para florir. Colhemos ramas floridas, colocamos em cálices e levamos para as mesas, as escrivaninhas, os criados-mudos – que, por serem mudos, não agradecem. Mas nós agradecemos: pela delicadeza das flores e sutileza do perfume, e por nos lembrar de esquecer mágoas e amarguras, ressentimentos e birras, florindo como a mirra, a agradecer a graça de viver.