Embora o Código de Trânsito Brasileiro e a lei federal que instituiu a Política Nacional de Mobilidade Urbana coloquem o pedestre no mais alto grau de prioridade no trânsito, quem caminha a pé pelas cidades, especialmente nos grandes centros urbanos, ainda é obrigado a disputar espaço com os veículos e em condições muito desfavoráveis. As calçadas são estreitas e não raramente estão em mau estado de conservação ou obstruídas; o tempo de travessia dos semáforos para pedestres é curto demais; dificilmente os motoristas respeitam as faixas de pedestres quando elas estão longe de cruzamentos sinalizados e os motoristas, na sua maioria, não observam os limites de velocidade.

O resultado da enorme desvantagem para o pedestre no trânsito são índices elevados de acidentes. Segundo informações do Corpo de Bombeiros do Paraná, entre 1º de janeiro e 8 de agosto deste ano, foram registrados 2.562 atropelamentos no Estado, sendo 318 deles pelo 3º Grupamento, em Londrina. No Detran (Departamento de Trânsito) no Paraná, os dados mais recentes são de 2015 e apontam que dos 1.454 acidentes com vítimas computados naquele ano em Londrina, 149 foram atropelamentos.

Imagem ilustrativa da imagem Leis priorizam pedestres, mas na prática é diferente



"O pedestre é o ponto mais fraco no trânsito, mas embora muitos deles acreditem que só têm direitos, quem anda a pé também tem deveres. Eles devem tomar cuidado ao caminhar pelas ruas, evitar usar o celular enquanto andam pelas calçadas ou atravessam as ruas para não perder a concentração e serem atropelados por veículos motorizados ou até mesmo por bicicletas", alerta a coordenadora do setor de Educação para o Trânsito do Detran/PR, Caroline Andreatta.

A coordenadora lembra que o Detran trabalha durante todo o ano a questão da conscientização no trânsito, tanto as ações voltadas aos pedestres como aos condutores. Para aqueles que circulam a pé, a orientação é sempre atravessar na faixa, nunca fazer a travessia entre os carros quando o trânsito estiver parado e evitar caminhar distraído, falando ao celular, enviando mensagens ou jogando.

Dos motoristas é sempre cobrado mais atenção e gentileza, além de rigor no cumprimento das normas de trânsito. "Não temos dados disponíveis, mas posso afirmar que há um aumento do número de acidentes envolvendo pedestres em razão do uso do Whatsapp e jogos pelo celular, principalmente entre os adolescentes. Com os idosos a gente também faz um trabalho de conscientização porque são mais lentos, muitos não escutam direito e por isso têm que prestar mais atenção", ressaltou Andreatta.

Dados levantados pela ONG Criança Segura apontam que os acidentes de trânsito são o principal motivo de mortes acidentais de crianças e adolescentes de zero a 14 anos no Brasil. Entre os tipos de acidentes de trânsito, os atropelamentos são a segunda principal causa, sendo responsável por 30% dos óbitos de crianças nessa faixa etária, atrás apenas dos ocupantes de veículos, que representam 34% das mortes. Em 2015, foram contabilizados 414 óbitos por atropelamento.

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DESENHO VIÁRIO
Arquiteto e urbanista e coordenador de Projetos e Pesquisas da organização Cidade Ativa, Ramiro Levy afirma que além da educação e conscientização de motoristas e pedestres, é preciso repensar o desenho viário das cidades. "Quando a gente faz uma via, pensa em largura de via para carro, mas não pensa em largura de calçada. A gente acha que o espaço para carro é o mais importante", analisa.

O arquiteto lembra que no Brasil um terço da população circula a pé, um terço utiliza o transporte público e menos do que um terço circula em automóveis, mas o espaço para os veículos chega a 70%. "Há claramente um desequilíbrio aí. A gente acha que pouca gente vai a pé, mas não. Muita gente caminha no Brasil e a única forma de resolver esse desequilíbrio é retirando vagas de estacionamento, restringir o uso dos carros e priorizar os espaços para pedestres", defende Levy.

Desde as décadas de 1940 e 1950, destaca o arquiteto, as cidades são construídas priorizando os carros, mas uma cidade que preserva e incentiva a cultura do caminhar, afirma ele, tem uma população que se exercita mais, reduz a poluição e movimenta os bairros, tornando-os mais seguros. "A cidade precisa priorizar o pedestre não só porque é lei, mas porque eles são mais frágeis e demandam mais atenção. É preciso pensar em soluções que atendam os cadeirantes, os idosos, as crianças e os pais e mães com carrinhos de bebê. Todos eles têm necessidades especiais e há características que devem ser observadas para que a cidade seja acessível a todo mundo mesmo", ressalta. "E o redesenho viário não exige apenas intervenções caras. Há soluções bem simples e bem baratas que podem fazer de fato a diferença. A educação e conscientização de motoristas e pedestres ajudam e são necessárias, mas elas sozinhas não resolvem o problema."