Levar em consideração a cultura indígena para tentar entender um evento classificado como criminoso pelo nosso sistema jurídico é o primeiro passo para realmente dar garantias de ampla defesa aos índios. No entanto, a analista pericial em antropologia do Ministério Público Federal (MPF) em Londrina, Luciana Ramos, alerta que o Brasil ainda engatinha nesta direção.
Responsável pela elaboração dos laudos antropológicos, ela aponta que a própria legislação brasileira reconhece que os índios são portadores de uma cultura diferente da nossa. ''Muitas vezes o que na nossa sociedade é crime numa sociedade indígena não é'', pondera. De acordo com ela, essa compreensão mais ampla pode evitar dupla punição porque as próprias sociedades indígenas também têm leis próprias.
O laudo antropólogico auxilia a Justiça a compreender todas estas nuances e avaliar se determinado ''evento'' pode ser enquadrado como crime dentro do nosso sistema jurídico. ''Os laudos trazem, primeiro, um contexto geral da cultura do grupo e, depois, analisa o evento específico. O que fazemos é tentar compreender os sistemas cultural e jurídico do grupo e entender o grau de agressividade ou reprovabilidade daquele ato dentro daquela cultura'', esclarece Luciana. No entanto, os procuradores e promotores não têm obrigação legal de requisitá-lo ou, se pedido, de considerá-lo como peça essencial para formar seu convencimento.
Luciana critica, ainda, que o mais comum é a realização de um laudo psicológico, que pouco auxilia na compreensão do ato praticado e pode até interferir no direito à ampla defesa. ''A Justiça Estadual, sobretudo aqui no Paraná, está tentando se instrumentalizar para compreender a questão indígena mas isso é raro. De maneira geral, acho que estes índios não são bem assistidos'', opina. (L.A.)