Imagem ilustrativa da imagem Um caipira na metrópole
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Após um mês de quase total isolamento em Atibaia, passei algumas horas na cidade de São Paulo. Apesar de nascido e criado no coração da metrópole, a dura verdade é que não me sinto mais à vontade por lá. Embora eu ainda goste de muitas coisas e tenha excelentes amigos em São Paulo, a Paulicéia me oprime e angustia. Vamos falar em português claro: virei um completo caipirão.
São Paulo hoje me enche de medo de ser assaltado, de ser enganado, de ser atropelado, de ser engolido pelo monstro que vive nas entranhas da urbe. Há uma multidão de pedintes, ambulantes e solicitantes de atenção em qualquer lugar que você vá. Sinto compaixão de tudo e de todos; meu impulso é sair gritando piedade, piedade, piedade.

Acho que foi Vinicius de Moraes quem disse que o problema de São Paulo é que você anda, anda, anda — e nunca chega em Ipanema. Não acho que o Rio esteja muito melhor (aliás, parece que está ainda mais caótico), mas acabei concordando com o poeta. Em São Paulo você anda, anda, anda — e nunca chega ao Lago Igapó.

Passei pela frente da escola em que aprendi a ler e escrever, a Casa Pia São Vicente de Paulo, e vi que agora parte do prédio abriga o Memorial Maria Angélica Queiroz de Barros, a baronesa que deu nome a duas importantes vias da região central da cidade: Avenida Angélica e Alameda Barros.
Mas andei, andei, andei — e acabei encontrando um lugar precioso: a Igreja de Santa Cecília, situada no largo de mesmo nome. Quando criança, muitas vezes fui com minha mãe à missa nesta igreja, que é uma das mais bonitas de São Paulo. O teto e as paredes interiores foram pintadas por Benedito Calixto, famoso artista paulistano da primeira metade do século XX.

Há muitos anos eu não entrava na Igreja de Santa Cecília. Em minha memória de criança, ela parecia muito maior. Mas eu não me lembrava que era tão bonita.

Ajoelhei-me para rezar e me lembrei que uma das belas peças de Haendel é a "Ode ao Dia de Santa Cecília". Martirizada no século II, Cecília é a santa padroeira dos músicos; a tradição conta que ela morreu cantando em louvor a Deus.

Na Igreja de Santa Cecília, estão expostas as relíquias de Santa Donata, uma virgem também martirizada no século II. Os cabelos da imagem são as da própria santa menina. Antes de sair de novo para a metrópole devoradora, rezei para a pequena mártir e pedi sua intercessão.

À noite, na hora de pegar o ônibus de volta para casa, consumido pelas saudades de Londrina e da família, esqueci o celular na casa de minha tia. E constatei o seguinte: não existem mais orelhões em São Paulo. Tive que pedir emprestado o celular de um companheiro de viagem, que quase não conseguiu me emprestar o aparelho, porque era coreano e não falava português.

Pela janela do ônibus, olhando as luzes da metrópole que ficavam para trás, senti a melancolia de um exilado que se sente um estrangeiro em sua pátria de origem. Dormi, sonhei e acordei em Londrina. Que grande alegria é voltar para casa!

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