Imagem ilustrativa da imagem Reflexões sobre a tragédia


1. Durante todo o dia tentamos esconder do Pedro as notícias sobre a tragédia do avião da Chapecoense. Cedo ou tarde ele virá a saber de alguma coisa, mas por enquanto é melhor preservá-lo de informações tão cruéis. Daqui a um tempo, passada a perplexidade inicial, poderemos, quem sabe, abordar o assunto com ele de maneira calma e serena.

2. É impossível viver numa redoma. Os jardins de Epicuro das comunidades hippies, quase todos fracassados, comprovam a índole social extensiva do ser humano. Se as tragédias veiculadas pela mídia têm algum aspecto positivo, é o poder de nos unificar, de deixar em suspenso as diferenças que tanto nos afligem e separam. Nenhum homem é uma ilha; somos arquipélago. E para o arquipélago dobram os sinos.

3. Penso naqueles idosos que são preservados de notícias aterradoras sobre a morte de parentes e amigos. Em quase todos os casos semelhantes, o velhinho supostamente protegido acaba por fazer um pacto de silêncio sobre os temas "proibidos". Simplesmente deixa de perguntar sobre aquele parente sumido, como se acreditasse que ele partiu numa longa viagem. (E, na verdade, partiu.)

4. Sim, a morte nos unifica. Desperta o amor ao próximo. Faz florescer o espírito de perdão e misericórdia. Prenuncia a ressurreição. Há um Gênesis e um Apocalipse em cada tragédia humana. Vestimos a camisa do nosso adversário de ontem e vamos à luta, com o coração nas mãos.

5. A decisão do Sport Club Corinthians Paulista, que esqueceu a rivalidade com o Palmeiras e pôs o verde em sua página após a tragédia da Chapecoense, fez-me pensar no meu querido Vô Briguet. Ele, que nasceu em agosto de 1910, um mês antes e no mesmo bairro que o seu amado Corinthians, deu-me aquela que foi uma das maiores provas de amor que já tive: quando Palmeiras e Corinthians jogavam, ele torcia para dar empate, pois não queria que o netinho palmeirense ficasse triste.


6. Volto a Garcia Lorca:

Verde que te quero verde.
Verde vento. Verdes ramas.
O barco vai sobre o mar
e o cavalo na montanha.


7. Filho, precisamos falar sobre a morte.