Imagem ilustrativa da imagem Reflexões sobre a ideologia
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Quando um escritor fala com o coração nas mãos, isto é, desde o centro íntimo de sua consciência individual, por vezes consegue romper os limites da temporalidade e atingir aquele grau de compreensão da realidade que podemos chamar de profético.

Tome-se as palavras de Nelson Rodrigues (1912-1980) no auge da "revolução cultural" dos anos 60:

"Deve-se a Marx o formidável despertar dos idiotas. Estes descobriram que são em maior número e sentiram a embriaguez da onipotência numérica. E, então, aquele sujeito que, há 500 mil anos, limitava-se a babar na gravata, passou a existir socialmente, economicamente, politicamente, culturalmente, etc. Houve, em toda parte, a explosão triunfal dos idiotas."

De modo semelhante, as palavras do sociólogo e escritor Gilberto Freyre (1900-1986), em entrevista publicada nos anos 80, evidenciam o ostracismo que os conservadores enfrentam no meio universitário — a espiral do silêncio (que agora foi substituída, na esquerda brasileira, pela espiral da infâmia):

"A patrulha é uma coisa muito séria e organizada de forma admirável, porque, na verdade, ela não ataca, silencia. No caso da minha obra, a grande especialidade do patrulheirismo é o silêncio. (...) Um reduto muito forte dessa técnica de omissão pelo silêncio é a Faculdade de Ciências Sociais da Universidade de São Paulo. Ali há um grupo muito prestigioso, liderado pelo professor Florestan Fernandes. Nesse círculo figura o professor e atual senador Fernando Henrique Cardoso, que tem apreço por mim — e eu por ele —, mas é sufocado pelos outros. A partir de determinado momento, Florestan Fernandes se tornou um profundo fanático do que ele considera marxismo. Mas convém lembrar que o marxismo não é uma coisa monolítica. Nunca alguém escreveu com tanto desassombro a meu favor como Darcy Ribeiro, que é marxista. O mesmo fizera anteriormente Astrojildo Pereira, que ajudou a fundar o Partido Comunista mas era verdadeiramente um intelectual."

Nos anos 30, Astrojildo, um dos maiores conhecedores da obra de Machado de Assis, chegou a ser expulso do Partido por "intelectualismo" e "desvio pequeno-burguês". Com a mesma rede de infâmias tentaram cobrir o romancista Jorge Amado:

"No fim do ano de 1955 eu soube que a polícia socialista torturava os presos políticos tão miseravelmente quanto a polícia de Hitler. O mundo caiu sobre a minha cabeça. Deixei o Partido Comunista. Fui atacado de forma muito violenta. O dirigente comunista Arruda Câmara disse que em seis meses eu não existiria mais como escritor e como intelectual. Felizmente ele se enganou. Você quer saber o que é ideologia? É uma m(...)".

Quem também conheceu os efeitos perniciosos da ideologia foi o escritor russo Alexander Soljenítsin. Em célebre discurso, ele disse uma frase que serve como um escudo contra a mentalidade revolucionária do nosso tempo:

"A linha divisória entre o bem e o mal não passa por Estados, classes ou partidos políticos. Ela passa bem no meio do coração do homem — de todos os homens."