Eu estava terminando de ler o romance "Cangaceiros", de José Lins do Rêgo, quando tocou o telefone. Era a querida Dona Beth. Ligou só para elogiar a crônica "Lula é um homem honesto", publicada na quarta-feira, um dia antes do depoimento do ex-presidente ao juiz Sergio Moro.

Fico muito feliz quando leitores elogiam meu trabalho. E achei curioso que D. Beth tenha me ligado justamente quando eu chegava às últimas páginas de "Cangaceiros". O livro de Zé Lins conta a história de um jovem casal que tenta sobreviver em meio à guerra entre cangaceiros, coronéis e forças do governo no sertão nordestino. O enredo faz lembrar a história real vivida pela família de D. Beth nos anos 30. Seus pais, pequenos agricultores em Propriá, Sergipe, deixaram a região para fugir da violência de Lampião e do cangaço. Foi assim que Beth chegou a Londrina, em 7 de setembro de 1937, aos 8 anos de idade.

Nos anos 30, o povo nordestino era refém dos cangaceiros e coronéis. No entanto, para aquela família sergipana e tantas outras, havia um lugar para onde fugir e recomeçar a vida. No caso dos pais de Beth, esse lugar se chamava Londrina.

Imagem ilustrativa da imagem Reféns de Al Capone
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Hoje é diferente. Diante da crise política atual, nós não temos para onde fugir. Somos reféns da classe política e das elites mafiosas que tomaram conta do país nos últimos anos — especialmente aquela máfia que todos sabem qual é, sendo desnecessário dizer-lhe o nome. São esses cangaceiros políticos que tentam voltar ao poder de qualquer forma, mesmo que isso custe a liberdade e a vida de muitos brasileiros. E o pior é que, diferentemente do casal do livro de Zé Lins, nós não temos sequer um cantador para nos orientar dentro do caos. Toda nossa esperança está no funcionamento da Justiça e no paciente trabalho de resgate da cultura brasileira (ler livros como "Cangaceiros" é um bom começo).

Há um descompasso inevitável entre o ritmo da Justiça e as urgências da realidade política. A propósito, vale a pena rever o filme "Os Intocáveis", de Brian De Palma, que conta a história da luta entre o chefão Al Capone e o agente federal Eliot Ness, na Chicago dos anos 20 e 30. O filme mostra que a cidade inteira era refém de Capone, um psicopata criminoso da pior espécie. Quando chega a hora de enviar o gângster ao tribunal, a acusação que pesa sobre ele é quase singela: sonegação de impostos. "Vamos mandar um facínora para a cadeia por sonegação?", pergunta Eliot Ness, a certa altura. Mas foi exatamente isso que aconteceu. Capone condenado a 18 anos em regime fechado. Morreria na prisão, em 1947.

É inútil esperar por grandes espetáculos na Operação Lava Jato. A Justiça deve seguir o seu tempo e os seus rituais. Não existe outro caminho. Aliás, existe: basta olhar para a situação da Venezuela, onde Al Capone está no poder. É isso que os militantes do caos sonham em ver no Brasil.