Imagem ilustrativa da imagem Quem tem medo de Donald Trump?
| Foto: Mandel Ngan/ AFP



Filipe G. Martins é um dos mais argutos comentaristas da política americana em nosso país. Na eleição de Donald Trump, o jovem especialista em relações internacionais deu um baile de informação em todos os "correspondentes" brasileiros. Após a posse do 45º presidente dos EUA, ele conversou com o cronista:

Avenida Paraná: Como você avalia o comportamento da mídia (especialmente a brasileira) na posse de Trump? Penso na moça que entrevistou o cara do Pânico pensando que era um eleitor de Trump.

Filipe G. Martins:
Desde o anúncio de sua candidatura, Trump foi tratado pela mídia americana com escárnio, desdém e repulsa; como um candidato indigno de uma cobertura séria e justa. Ao longo de toda a campanha, os jornalistas mostraram que não estavam interessados em reportar os fatos, mas tão somente em moldá-los de acordo com suas preferências e desejos — investindo nessa empreitada todas as suas forças, todos os seus recursos, e até mesmo a pouca credibilidade que lhes restava. É por isso que, embora a eleição americana tenha feito muitos derrotados, nenhuma derrota foi mais massacrante do que a sofrida pela grande mídia, que viu seus esforços ignorados pelo eleitorado e suas previsões transformadas em motivo de piada. Em vez do mea culpa que era esperado, os grandes veículos de mídia optaram por reafirmar sua posição e declarar que eram os americanos, e não eles, que haviam errado. Essa decisão arrogante se revelou em uma série de notícias falsas publicadas desde o dia da eleição e viu o seu ápice na cobertura da cerimônia de posse. Além de promover uma campanha de deslegitimação e incitar protestos violentos, a grande mídia fez de tudo para pintar a cerimônia com as piores cores possíveis, ciscando errinhos em todos os aspectos do evento e dando um sinal claro de que continuará promovendo a demonização irrestrita do novo presidente. Quanto à mídia brasileira, é mesmo preciso falar dela? Tudo o que nossos jornalistas fazem é ecoar os piores jornalistas americanos. Sua única contribuição original é a ignorância e o desconhecimento: além do episódio envolvendo o humorista do Pânico, houve muitos outros em que nossos jornalistas demonstram que sequer são capazes de reconhecer políticos americanos de destaque como o senador McCain e o ex-presidente Carter. Mais patético impossível!

Faça uma breve análise sobre o discurso de posse.

O discurso político convencional é feito de sinais de reconhecimento grupal, referências ideológicas, sinalização de virtudes e acenos para a cultura dominante (que é toda de esquerda). Nada disso aparece no discurso de Trump, que optou por preencher seu discurso com referências à experiência real do americano médio e aos fatos da realidade concreta. Com isso, Donald Trump mostra que permanecerá fiel às suas propostas originais e que não se deixará prender pela camisa-de-força verbal do establishment. Os principais elementos de seu programa estavam presentes: assegurar a soberania nacional americana; colocar os interesses americanos como principal guia da política externa e das políticas públicas em geral; proteger as fronteiras americanas e a herança cultural do país; enfraquecer e derrotar o globalismo; destruir o terrorismo islâmico; guiar-se pelo "americanismo" e não por interesses estrangeiros; trazer de volta a segurança, a lei e a ordem ao país; criar uma economia próspera por meio do empreendedorismo e da economia real; valorizar o estilo de vida americano; resgatar o "sonho americano"; e trabalhar para que a América seja grande de novo para todos os americanos.

A mídia costuma dar uma "lua de mel" de 100 dias para o presidente recém-empossado. Parece que isso não vai funcionar desta vez. Mas e Trump? Quais serão as suas prioridades neste início de governo?

Não é exagero dizer que ele tentará realizar uma pequena revolução nos cem primeiros dias de seu governo. Já no dia 20, a Casa Branca anunciou um "congelamento regulatório", uma medida que na prática impede o governo de criar novas regulações econômicas. Além dessa medida, ele irá anular todas as medidas inconstitucionais do Governo Obama, substituir o Obamacare, e enviar ao Congresso um pacote de propostas que, dentre outras coisas, visam limitar o número de mandatos dos parlamentares; proibir que oficiais do governo se tornem lobistas; congelar a contratação de funcionários públicos; reduzir o número de cargos públicos; anunciar um corte de 10 trilhões em gastos públicos (ao longo de oito anos). Ele também pretende começar uma auditoria dos gastos públicos; anunciar o início da construção do muro na fronteira com o México; dar início à reavaliação de acordos de comércio; enviar sua proposta de redução tributária; remover as regulações e as restrições do setor energético; nomear o substituto do Juiz Scalia na Suprema Corte (possivelmente o Juiz Pryor do Alabama); iniciar a deportação de imigrantes ilegais envolvidos em crimes; criar uma força tarefa para combater crimes violentos; anunciar a mudança da Embaixada dos EUA em Israel para Jerusalém; e uma série de outras medidas. Ambicioso, não? E isso não é nem metade do que ele pretende fazer. Se fizer um terço disso, ele terá feito mais em cem dias do que o Obama em oito. É normal e até saudável olhar para isso tudo com ceticismo, mas eu acredito que Trump mostrará que ele continua fiel ao lema que o consagrou no mundo da construção civil — "under budget and ahead of time" — e não demorará para mostrar que a América realmente será grande de novo.

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