Eu vivia com meus companheiros mendigos nas escadas de uma igreja em Roma. O tempo dos mendigos é estranhamente parecido com o tempo das crianças pequenas e dos cachorros solitários: todo dia é sempre o mesmo dia. Estávamos mergulhados na névoa da bebida, da fome, da sujeira. Desde que eu havia perdido a fé, substituíra a batina por uns trapos inconsúteis que mal me protegiam do frio e escondiam minha nudez.

Certa noite, eu estava pedindo esmolas antes da missa, quando um dos fiéis me reconheceu. Era um padre, antigo colega de seminário. Ele se aproximou, assustado, e pronunciou meu nome. Com a cabeça baixa, envergonhado do meu cheiro e do meu hálito, confirmei ser eu mesmo. Ainda chocado com a minha transformação, ele disse que estava em Roma para uma audiência com o papa. Deu-me algum dinheiro e disse que iria rezar por mim.

Imagem ilustrativa da imagem O mendigo e o papa
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Dois dias depois, meu ex-colega voltou. Trazia uma notícia inacreditável:

— O papa me convidou para jantar amanhã e quer que você venha também.

Não contive o riso.

— Como é que eu vou encontrar o papa assim, sujo e maltrapilho?

— Não há problema. Você toma um banho no hotel em que estou hospedado e pode usar um dos meus ternos.

Assim fizemos. Meus amigos da rua só puderam rir quando lhes disse:

Companheiros, vou jantar com o papa.

O encontro foi muito agradável. O papa nos divertiu com histórias da Polônia no tempo do comunismo; ele tinha o dom de narrar os fatos mais trágicos com uma serenidade que quase os transformava em acontecimentos alegres. Em nenhum momento ele fez perguntas sobre a minha vida de mendicância.

Ao final, o papa disse:

— Padre, gostaria de me confessar com você.

— Mas, Santidade, eu já não sou padre. A Igreja não permitiria...

— Uma vez sacerdote, sempre sacerdote! Quanto à Igreja, não se preocupe. Eu sou o bispo de Roma e posso cuidar disso.

Então, fomos para uma sala reservada e o papa fez sua confissão. Depois, eu também me confessei com ele.

Na hora da despedida, ele sorriu e disse que tinha mais um pedido a fazer.

— Padre, eu preciso de alguém que trabalhe com os mendigos de Roma. Alguém precisa levar os sacramentos da Igreja até eles. Você poderia ser essa pessoa.

Caminhando silenciosamente ao lado de meu amigo na Praça de São Pedro, notei que ele estava com os olhos marejados. Então eu repeti para ele as últimas palavras do papa, depois da minha confissão:

— Não se preocupe, irmão. Somos todos mendigos diante de Deus.

(Crônica inspirada em um fato real ocorrido no pontificado de João Paulo II)