Imagem ilustrativa da imagem Mãe Mulata
| Foto: Paulo Briguet



Um dos caminhos seguros para encontrar o sentido da vida é a vida dos antigos. Neste fim de ano tive uma longa e proveitosa conversa com meu tio-avô e padrinho de batismo, Álvaro Costa, sobre uma personagem fascinante de nossa família: sua mãe, Ambrosina Nunes Costa, por todos conhecida como Mãe Mulata. Tio Álvaro é o ancião de nossa família, dono de uma memória e lucidez impressionantes no alto de seus 88 anos.

Aquela que viria a ser minha bisavó materna nasceu no final do século XIX na pequeníssima Bom Jesus do Córrego, Sul de Minas Gerais — ou simplesmente "Córgo", como dizem os habitantes da cidadezinha até hoje. Perdeu a mãe muito cedo, e foi criada por uma fazendeira da região, Maria Ribeiro. A palavra "fazendeira" tem aqui uma conotação muito particular: a bondosa Dona Maria morava numa casinha de madeira e bebia água da bica que existia no fundo de seu quintal.

Mãe Mulata, como a própria alcunha faz supor, tinha sangue negro e indígena. Meus outros antepassados todos têm origem imigrante, formando um verdadeiro cadinho de miscigenação, com espanhóis, portugueses, italianos, franceses, belgas e judeus. Quase todos nós brasileiros somos assim.

Mãe Mulata casou-se por volta de 1910 com o maquinista de trem Antônio Costa. Moraram em diversas cidades ao longo da Estrada de Ferro Noroeste do Brasil, nos estados de São Paulo e Mato Grosso (hoje Mato Grosso do Sul). Tiveram onze filhos, dos quais seis chegaram à idade adulta. Minha querida Vó Maria, a quem dediquei meu último livro, era a mais velha entre os que sobreviveram.

Ambrosina era dona de uma personalidade fortíssima, sendo conhecida por todos como ferrenha defensora dos filhos e netos. Não fosse ela, que resolutamente saiu às ruas de Araçatuba em busca de um médico salvador, minha avó teria morrido no parto de minha mãe, em 1940, e eu não estaria aqui escrevendo estas linhas.

Mulher de intensa espiritualidade, Mãe Mulata não sabia ler nem escrever. Mesmo assim, era uma conselheira e orientadora espiritual procurada por muita gente. Ainda que a família Costa jamais tivesse grandes posses, minha bisavó era conhecida por realizar obras de caridade e nunca negar ajuda aos mais necessitados. Havia acabado de entregar doações a crianças pobres quando recebeu a notícia da morte trágica do seu filho Armindo, em um acidente de trabalho.
Todos nós, meus amados sete leitores, temos uma Mãe Mulata em nossas raízes. Mesmo tendo minha bisavó falecido nove anos antes do meu nascimento, sinto que o seu exemplo me orienta e fortalece nas horas difíceis, principalmente naquelas ocasiões em que é preciso guerrear para conquistar a paz.

Neste final de ano, tempo de balanços e projetos, não custa lembrar mais uma vez que o sentido da vida humana não se encerra em nós mesmos, mas, ao contrário, realiza-se fora de nós, no coração do outro. Portanto, é tempo de olhar para as nossas Mães Mulatas, nascidas no "córgo" de Bom Jesus, e aprender que a felicidade é um subproduto de algo mais profundo e fundamental: o amor ao próximo.